Pas de Quatre.

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Curioso como o ser humano parece ser averso ao fim. Normalmente, não lidamos bem com o fim de uma série que gostamos muito, de um filme, um show, uma comida saborosa...uma amizade. Um amor. Uma vida.

Há quem diga que Anahi estava indo de encontro ao curso natural da vida, que é o encerramento de ciclos. Tudo que começa tem um fim, e há que se respeitar isso ou lidar com as consequências de tentar mudar a ordem natural das coisas. Anahi escolheu lidar com as consequências. Intempestiva, ela abraçou de peito aberto a ideia de que sua história com Alfonso ainda não havia acabado. Ela bateu o pé diante diante daquele desfecho que considerava absurdo.

Logo depois da partida de Alfonso, ela não tinha ideia de como lutar contra aquilo. Mas se tem uma coisa que já ficou clara sobre Anahi é que ela é uma força da natureza. Somente uma mulher com a sua força seria capaz de transformar a culpa, auto piedade e desesperança em que estava mergulhada no motor para dar a volta por cima.

E Anahi deu a volta por cima todas as vezes que a vida lhe exigiu isso.

Agora, o novo caminho trilhado por ela tinha início ali, no aeroporto internacional de Nova York.

Certamente, aquele lugar já havia sido testemunha de muitos encontros, despedidas, risos, lágrimas, tristeza e alegria. Já fora testemunha do sofrimento de Anahi. Mas agora, aquela mulher parada no meio do vai e vem da multidão trazia no peito um sentimento diferente, que era refletido na expressão determinada e serena em seu rosto. Anahi estava tranquila, se permitindo cultivar certa esperança. Ela iria pegar de volta o que lhe pertencia por direito.

Apesar de se sentir pronta e forte, foi inevitável que a dor das memórias da última vez que estivera lhe atingisse. No entanto, com um sorriso contido, ela percebeu que a dor veio como uma brisa leve de verão: branda. Não era mais agressiva  como uma tempestade que ameaçava varrer tudo a sua frente.

Perdida em suas novas descobertas, Anahi se assustou quando sentiu alguém tocar-lhe o ombro. Ela se virou, no susto, abrindo um sorriso quando se deparou com o rosto tranquilo de Erika, que apenas lhe ofereceu uma caneca que, pelo cheiro, devia ser chocolate quente.

Anahi aceitou a bebida e as duas foram caminhando em silêncio. Pela visão periférica, Anahi via que o rosto da mãe parecia em paz, mas ela sabia que, no fundo, ela estava sofrendo.

Desde o momento em que havia contado para a mãe que ia para o Bolshoi, Erika demonstrou total apoio à filha. No entanto, certa vez Anahi a flagrara chorando enquanto olhava uma foto recente das duas em um quadro. Erika tentou disfarçar, limpando as lágrimas discretamente quando percebeu a fillha parada à porta do quarto, mas não deu certo. As duas conversaram e Erika admitiu que era difícil ver sua unica filha voando para tão longe do ninho, mas garantiu que ia se acostumar.

Aquilo rendeu a Anahi boas horas nas sessões com Linda. Novamente, a culpa a assolou. Ela se sentia uma filha egoísta abandonando a mãe, mas Linda conseguira fazer Anahi entender que priorizar a sua felicidade não era a mesma coisa que abandono.

O fato é que desde aquele dia, Erika fez de tudo para parecer mais firme e serena, mas Anahi sabia que por dentro a mãe estava sofrendo com o iminente afastamento. Aquilo  a fez admirar ainda mais Erika, que havia feito de tudo para ser alguém melhor para ela.

Anahi também sofria com o afastamento, é claro. Tanto que, sem perceber, as duas foram se refreando durante o caminho, como se ao retardar a chegada ao portão de embarque fosse fazer a iminente partido deixar de ser um fato.

— Cadê seus amigos?

Erika resolvera que era melhor puxar algum assunto.

— Disseram que vinham, mas estão atrasados — Deu uma olhada em seu relógio de pulso e varreu o saguão com o olhar, mas nem sinal deles.

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