Renaître

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Aquilo pareceu durar horas, mas o relógio mostrava que haviam se passado segundos.

Segundos estes que trouxeram uma enxurrada de emoções que durariam a vida toda.

A surpresa fez Alfonso permanecer estático e incrédulo. A sensação de olhar para ela novamente, de tê-la ali tão próxima fazia o sangue correr tão forte nas veias dele que os dedos de seus pés se contraíram dentro do sapato.

A respiração de todos podia ser sentida e ouvida por qualquer um ali dentro, mas eles permaneciam imunes a qualquer outra coisa que não fosse o magnetismo sem precedentes que prendia os olhos deles um no outro.

Se o infinito tivesse uma cor, Alfonso apostava todas as suas fichas que seria azul, pois mergulhar nos olhos dela era como encarar a promessa do eterno, de um lugar no Paraíso.

Eram sentimentos confusos, aqueles.

Enquanto seu coração o mandava correr até ela e tomá-la nos braços, sua cabeça o lembrava o tempo todo de que aquela era a mulher que o havia machucado, o mandado embora de sua vida como se fosse nada. A cautela e o medo sussurravam em seu ouvido com suas vozes traiçoeiras para ele manter distância.

E, naquele momento, aquelas vozes eram sedutoras demais.

— Dirijam-se imediatamente ao auditório. Eu não me sinto muito bem, com licença. — A voz dele soou um tom mais grave e trêmula, mas só ela notou o sutil detalhe.

A passos rápidos, Alfonso saiu da sala sem olhar para trás. Sua atitude e sua troca de olhares nada discreta com Anahi, no entanto, chamou atenção. E agora os bailarinos recém-chegados a encaravam com uma clara interrogação no rosto.

Ela, por sua vez, deu de ombros. Estava mexida demais para fazer e dizer qualquer coisa. Seu instinto dizia para ir trás dele, mas suas pernas pareciam não obedecer o seu comando. A presença dele havia despertado algo tão bonito, tão feroz dentro dela, que um sorriso ameaçou brotar em seu rosto.

E ela não o refreou.

Ninguém ali pareceu entender ao vê-la sorrir para o nada. Mas ela sorria para ela mesma.

Sorria para as lembranças deles, para o renascer da esperança há tanto tempo adormecida dentro dela, para aquela chama que cresceu dez vezes mais com  a simples presença dele no mesmo ambiente. 

Anahi não estranhou o fato de Alfonso ter praticamente fugido dela. Ela não esperava que fosse recebida com flores e abraços, sabia muito bem que precisaria reconquistar a confiança dele. Só esperava que aquilo não fosse um sinal de negativa à qualquer tentativa de aproximação da parte dela.

Ele não iria menosprezá-la como profissional, sabia bem que Alfonso levava seu trabalho muito a sério. Mas ela queria mais que aquilo.

Mas, por enquanto, resgatar a relação aluna/professor poderia ser um bom começo.

***

Alfonso não sabia bem o rumo que estava tomando, ele só sabia que precisava dirigir e ir o mais longe possível dali.

Irônico, já que durante muito tempo ele sonhou em estar perto dela novamente.

Ela poderia julgá-lo um perfeito covarde, mas, honestamente, ele não se importava agora. Só sabia que precisava voltar a respirar e, para isso, precisava estar longe dela.

Sua cabeça doía e uma veia saltou de seu pescoço quando o sinal vermelho o impediu de seguir avançando pelo trânsito denso de Moscou. Ele se permitiu fechar os olhos um instante, respirando fundo.

Imediatamente, a figura dela — parada a poucos metros de distância — invadiu sua mente sem pedir licença. A imagem dela o torturou até uma buzina fazê-lo despertar de seu pequeno transe. Ele focou os olhos na luz verde do semáforo e afundou o pé no acelerador com um pouco de força demais, como se aquilo fosse capaz de aplacar um pouco tudo o que sentia.

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