Play: Si no te hubieras ido - Marco Antônio Solís
Moscou - Rússia
Algumas pessoas sofrem para acordar. Sofrem por querer mais cinco minutos de descanso, sofrem por ter que levantar para encarar uma rotina que não lhes agrada, ou sofrem por saber o dia difícil que lhes espera.
Às vezes estamos em um sonho tão bom que acordar para a realidade é um duro golpe. Ou simplesmente carregamos dores tão intensas que fechar os olhos e fugir da realidade é a melhor alternativa.
Era o caso dele.
O belo par de olhos verdes que se abria para enxergar apenas o teto escuro havia perdido o brilho de outrora. Ainda eram belos olhos, sem dúvida, mas agora pareciam ser opacos, parecia haver neles uma escuridão que - Só ele sabia - era reflexo do que havia se transformado o seu coração.
Um suspiro escapou da garganta de Alfonso antes mesmo dele abrir os olhos completamente.
Ainda estava ali.
Aquela sensação de ter seu coração esmagado, mergulhado em um escuridão ainda mais intensa do que a daquele quarto permanecia ali, latente. Nem mesmo o tempo havia amenizado.
Te extraño más que nunca y no sé qué hacer
Despierto y te recuerdo al amanecer
Espera otro día por vivir sin ti
El espejo no miente, me veo tan diferente
Me haces falta túDevagar, Alfonso virou a cabeça para o lado, apenas para encarar o vazio daquela cama grande demais, o que parecia acentuar a sua solidão. Já havia se passado quase um ano, mas aquele vazio ainda o sufocava. Tinha esperança de acordar um belo dia e se dar conta de que tudo não passava de um pesadelo. Ele sentiria o calor dela e o pequeno corpo aconchegado ao seu antes mesmo de despertar. O desejo era tão forte que a memória do aroma adocicado dos cabelos dela o inundou, fazendo-o se contrair como se sentisse alguma dor física.
Novamente, ele sentia seu coração esmagado.
As palavras de Anahi - no que se pareciam vidas atrás - ainda lhe perseguiam.
"Eu preciso de um tempo..."
Era como se tais palavras tivessem ganhado vida própria e agora ecoassem pelo universo, pois elas sempre lhe perseguiam e atormentavam.
Alfonso suspirou, cansado. Mesmo que não tivesse ânimo, precisava trabalhar. Aliás, o trabalho era a única coisa que tinha algum efeito na hora de distrair a sua mente.
Ele chutou as cobertas de uma lã grossa - perfeita para o clima russo - e se levantou. Imediatamente, seu corpo protestou contra o frio que fazia. Ignorando os arrepios em seus braços, ele rumou ao banheiro.
No meio do caminho, no entanto, a sua imagem refletida no espelho do guarda-roupa chamou sua atenção.
Normalmente, Alfonso não gostava de se ver no espelho. Não gostava porque odiava o que seu reflexo dizia e, sobre tudo, odiava porque se enxergar através do espelho era a mesma coisa que enxergar a ela e tudo que viveram. Mas ele parou, analisando. A imagem mostrava um homem de peito nu, visivelmente mais magro e com os cabelos e a barba aparada, da qual já despontavam alguns fios brancos. Havia envelhecido muito no último ano, mas ainda era um homem charmoso e muito bonito. Infelizmente para Alfonso, ele enxergava muito além do que o espelho mostrava.
Voltar os olhos para dentro de si não era fácil, pois o interior dele estava repleto de sentimentos os quais ele não estava disposto a encarar. E, principalmente, estava repleto de saudades dela.
A expressão em sua face endureceu. Imerso na penumbra daquele quarto impessoal, o qual ele nunca se atreveu a chamar de lar, a ausência implacável dela era ainda mais gritante. Com todo aquele seu vigor, com seu sorriso, com seu olhar de menina inocente que escondia uma mulher ardente que só ele conhecia. Assim era sua Anahi, que não passava agora de um fantasma que insistia em assombrar a vida dele.