Naquela manhã cinza, vez ou outra o jardim solitário de Westminster era assolado por uma forte jarrada de vento que vinha diretamente do leste do país. Era sábado, não haveria aula para as jovens órfãs e Fleur aproveitou para perambular o gramado com seus pensamentos abaixo de um céu nublado.
Ao passar pela porta da frente, Fleur assistiu a neblina descer rapidamente e cobrir todo o gramado que fora cortado na tarde anterior. Ela olhou para baixo e não conseguia ver os próprios pés, mas ao voltar a fitar o jardim, notou que havia uma silhueta negra atrás do enorme carvalho que ficava próximo aos portões de ferro que cercavam o orfanato.
Se fosse outra jovem, correria para dentro dos muros de Wetminster e contaria para a diretora Agnes. Mas havia algo em Fleur que sempre se atraia pela escuridão que acompanhava seu encalço ou a perseguia em sonhos atormentados. Ela ficou curiosa para saber quem se escondia atrás do carvalho e após avançar o primeiro passo em direção ao desconhecido um flash neon passou rapidamente pelas suas íris azuis.
A cada passo Fleur sentia que uma mão invisível de uma presença fria e obsessora a guiava em direção aquela silhueta que se escondia atrás do carvalho. Quando ela se aproximou perto suficiente para conhecer quem era a silhueta sombria, um sorriso se instalou no rosto inocente dela. Era Vlad.
- Meu super-herói. - ela disse pulando em cima dele.
Ao sentir-se em paz e confortável naquele abraço, Vlad também envolveu seus braços ao redor da cintura dela. Ele não recordava se havera sonhado mil vezes em voltar a sentir aquela sensação que só Mirena transparecia, mas os gritos que o assombravam estavam longe e naquele momento, o som cardíaco de Fleur ecoou e o fez despertar da realidade triste que enfrentava.
Após um longo abraço, ambos se afastaram um pouco e ele não pode evitar de sentir-se feliz ao notar um sorriso nos lábios rosados de Fleur. Vlad nunca havera se conectado com outro mortal que não fosse sua amada Mirena, mas aquela jovem órfã possuía um brilho em seus olhos que apunhalavam sua alma imortal.
- Você veio. - ela disse com um ar de felicidade.
- Eu disse que viria.
Após a morte de Natasha - Mirena - a tristeza partiu Vlad de formas diferentes, mas aquela manhã o golpeou pela visão da inocência daquela órfã que mal conhecia. E de alguma forma, Fleur acreditava que ele era o super-herói e que iria tirá-la na velocidade da luz e a levaria para um lugar seguro.
Ambos sentaram-se no gramados e ficaram conversando por horas. Eles não se incomodaram com a neblina que cobria suas cabeças e através daquela bruma densa, conseguiam fitar os olhos um do outro e se aninharam aquele momento obsoleto.
- Por que chamou de super-herói? - Vlad perguntou curioso.
Ela deu de ombros.
- Desde o dia em que nos conhecemos e você leu a obra de Mary Shelley para mim. - Fleur disse enquanto tentava encontrar seus dedos cobertos pelo nevoeiro. - Senti sua voz calar o silêncio que assombra minha mente e responder algumas perguntas. - acrescentou.
- Quais perguntas?
- Sabe, Vlad, as pessoas desse lugar tem o poder de roubar seus sonhos. - ela fez uma pausa. - Mesmo que nunca tenha contado a eles. - concluiu.
Ele é a fonte da minha recuperação. Pensou Fleur enquanto sentia aquele olhar salvando-a de tudo que todos ao seu redor lhe roubavam lentamente. Ela fitou aquelas íris escuras enviando uma força para resistir e enfrentar todos os fantasma mortais que a cercavam.
- Em mundo que não podemos ter o controle sempre buscamos um escape. - ele fez uma pausa. - Você não precisa sentir-se quebrada novamente. - acrescentou.
Fleur sentiu ele segurar sua mão delicadamente e sorriu. Ela sabia que era loucura sentir-se conectada a Vlad sem conhecê-lo, mas aquele apego se apoderava de seu coração como um remédio para uma doença sem cura.
Fleur deitou a cabeça sobre o ombro dele e fechou os olhos. Debaixo de um céu nublado, sob os galhos cobertos de folhas e envolvida pela bruma fria ela adormeceu sentindo o cheiro de hortelã impregnado nele. Vlad não ousou mover-se, apenas ficou parado sentindo uma paz inexplicável enquanto o cheiro da inocência mostrava a luz não tão distante de seu alcance.
Naquela manhã mórbida, Fleur sonhou consigo mesma correndo entres árvores sucumbidas por uma noite escura e chuvosa. Ela estava com o vestido branco parcialmente sujo de lama e com os pés descalços sobre a terra molhada que afundava a cada toque no solo.
Fleur estava com o semblante assustado e parecia fugir de algo terrível. Ela sentia seus medos caindo sobre a noite e materializando-se em fantasmas que a transformavam em escrava de seus próprios pensamentos.
Quando Fleur despertou, a primeira coisa que suas íris avistaram fora o rosto dele. Ela flagrou a si mesma com a cabeça mas perna de Vlad e sentiu ele acariciar seus cabelo preso em uma trança frouxa.
- Acordei você? - perguntou Vlad referindo-se às carícias no cabelo dela.
- Imaginei que não estaria aqui quando eu despertasse. - respondeu.
- Eu jamais perderia a oportunidade de ver esses lindos olhos se abrir para o mundo.
Fleur sorriu.
Vlad sentiu aquele olhar inocente pesar em sua mente como uma espécie redenção e aquela sensação doía na mesma intensidade em que sofreu em todas as partidas de Mirena. Ele perguntava a si mesmo se Fleur seria sua fonte de felicidade mesmo que não fosse a reencarnação de sua amada? Ou ela seria uma armadilha que Baltazar colocou em seu caminho para confundi-lo?
Naquela calmaria abaixo do carvalho que antecipava uma forte tempestade nasceu outra lenda, onde a emoção era irrevogável, a devoção era grotesca e poucos mortais iriam testemunhar memórias que seriam devoradas pelo tempo.
Ela agarrou-se a aquela memória e momento para mantê-la viva se alguma tragédia separasse sua alma de Vlad. Porque Fleur sabia que almas não são lembradas e nem tampouco imortais, e apenas sua essência sobreviveria.
Fleur manteve-se concentrada na imagem que tinha diante de seus olhos e quanto mais observava ele sentia-se atraída pela sensação obscura e antiga que o acompanhava. Mas ela manteve-se intacta e viva enquanto Vlad transparecia ser o castelo que a manteria sã e a salva.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Drácula - O Prometeu Proibido
Mystery / ThrillerApós a morte de Natasha, uma nova chance de amar e encontrar a alma de Mirena é concedia a Vlad. Ele viaja para Londre em busca da única lembrança da primeira vida enquanto procura pela sua amada em outro corpo. Dentro de um lugar que armazena diver...