Guilherme nunca achou que veria uma cena como aquela. Clarisse dançava de um jeito diferente e um pouco retraído, mas com certeza encantador. Pelo menos aos olhos do rapaz. Luzes coloridas piscavam sobre o rosto da garota, que tinha um sorriso satisfeito e um olhar apaixonado direcionado ao seu parceiro.
Havia, com certeza, mais de cem pessoas naquele salão de festas. O hotel fazenda tinha uma ótima estrutura, e recebia nesse final de semana mais de dez turmas de formandos, de diversas cidades. Essa festa, que começava sábado à noite e percorria toda a madrugada de domingo, era uma das atrações mais esperadas pelos jovens formandos. Era aquele lugar onde muitos tentariam fazer aquilo que não conseguiram durante seus três anos de ensino médio.
Clarisse não queria comparecer à festa, mas Guilherme convenceu-a argumentando que o ano estava acabando e ela provavelmente nunca mais veria nenhum deles. Sendo assim, não faria nenhum mal se soltar um pouco. De fato, apesar de acanhada, a garota estava se divertindo bastante. Para Guilherme, aquela festa sem cigarros, bebida ou maconha, era como uma festa de brincadeira. Não havia bebidas à venda no local, devido a maior parte dos formandos serem menores de idade. Apesar de alguns alunos terem contrabandeado garrafas e mais garrafas escondidas em suas malas, Guilherme não conhecia nenhum deles, então dançava bebendo algo que quase nunca consumia em festas: água.
Foram ao mesmo passeio outros vinte colegas da sala de Clarisse. Muitos deles passavam e cumprimentavam o casal, enquanto alguns olhavam e comentavam de longe. Já se formando e há poucos meses de completar dezoito anos, a garota se importava cada vez menos com a discrição de seu relacionamento perante os colegas. Estava tentando não pensar na possibilidade de algo dar errado, afinal, era a última vez que veria todas aquelas pessoas, com exceção de seu namorado. O ambiente estava escuro, lotado e luzes coloridas piscavam, então ela torcia para que ninguém o reconhecesse do parque de diversões, e achassem que eles apenas dançavam juntos.
— Você tá linda. — Guilherme disse, enfático em seus movimentos labiais para que Clarisse os lesse, diante da música alta do local.
A garota não respondeu. Apenas abriu um sorriso amplo e beijou-o. Estavam no ápice de seu relacionamento. Se davam muito bem, eram românticos e carinhosos um com o outro e ainda não haviam brigado ou se desentendido sobre nada. A sintonia estava perfeita. Continuavam se vendo semanalmente após as sessões de terapia, e eventualmente quando conseguiam um furo na rotina de Clarisse sem que seus pais desconfiassem.
A garota estava animada com a possibilidade de entrar na faculdade em 2020. Incentivada por Guilherme, prestou vestibular para o curso de psicologia e aguardava o resultado, que sairia no dia 24 de janeiro, justamente no aniversário de Guilherme. Seria um belo presente ter sua namorada aprovada no vestibular.
Os pais da garota preferiam que ela fizesse direito ou medicina, e fizeram questão de deixar isso bem claro. Quando disseram que psicologia não dava futuro e que era um curso que qualquer um fazia, Clarisse quase desistiu. Seu namorado, porém, não a deixou abandonar esse objetivo. Agora, ela estava ansiosa com a possibilidade de ter muito mais liberdade, tendo em vista que o curso era integral e que passaria o dia inteiro fora de casa. Guilherme poderia ir vê-la na faculdade sempre que pudesse ou quisesse.
Esse contexto lhe gerava, pela primeira vez em muito tempo, uma perspectiva positiva em relação ao futuro. Assim, esse passeio de formatura era quase uma cerimônia de libertação para ela. Tinha esperança de que, finalmente, conseguiria enxergar algum sentido em sua vida. Guilherme era o principal responsável por isso tudo.
Dançaram juntos por quase uma hora, suando diante das altas temperaturas do verão iminente. Clarisse estava feliz, sorridente e cansada quando o puxou pela mão em direção à saída do salão de festas.
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Não Voe Perto Dos Prédios
Teen FictionNossa vida é uma sequência ininterrupta de eventos, do nascimento à morte. Nem tudo está sob nosso controle. Sejamos honestos, o controle sobre a vida não passa de uma ilusão que, mais cedo ou mais tarde, se esvai. Guilherme Barone Vasconcelos, no d...