30 de junho de 2015

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Ainda eram cinco da manhã quando Guilherme abriu os olhos. Ficou deitado por alguns minutos, encarando o teto no quarto ainda quase completamente escuro. Com sono, sua mente cambaleava pela linha tênue que existe entre o dormir e o despertar. Seus olhos pesavam para fecharem-se novamente. Até que ouviu novamente alguém batendo à sua porta:

– Eu já to indo na frente. Vê se chega lá antes das seis – era Otávio.

A vontade de voltar a dormir era muito grande, mas sabia exatamente o que escutaria caso acontecesse. Ciente disso, o rapaz forçou seu corpo a se levantar, caminhando até o banheiro para escovar os dentes. Ele prometera que ajudaria seu pai na padaria nesse dia. O padeiro havia apresentado um atestado médico, estava com uma gripe muito forte, o que levou Otávio a voltar para sua antiga posição e assumir o lugar do funcionário doente. Com Pedro no caixa, sobrou para Guilherme assumir o balcão durante a manhã.

Ligou o computador e esperou ansiosamente enquanto a máquina começava a funcionar e carregava o sistema. Abriu sua única rede social para conferir o chat de conversas, em busca de alguma mensagem de Amanda. A última mensagem entre eles havia sido enviada por Guilherme e já faziam dois dias, até agora sem respostas por parte da garota. Isso o deixava triste, porém a garota nem sempre tinha acesso à internet com facilidade para responder. O que realmente o incomodava era o fato de que essas longas pausas não aconteciam nem quando ela ainda morava em São Paulo e os dois se viam toda semana.

Abriu o guarda-roupas e procurou por algo branco para vestir, como seu pai pedira. Não tinha nada branco ali – coisa que ele já imaginava. Como de costume e com uma boa justificativa, vestiu as primeiras roupas que encontrou depois que desistiu de sua inútil busca pelo branco. Pendurou a câmera no pescoço, pegou a mochila e saiu de casa, sem tomar café mesmo.

Era uma manhã fria de inverno, o céu estava sem nuvens e uma brisa gelada soprava pelos cantos de concreto. Guilherme caminhava pela avenida de sua escola, quase à frente da mesma, e reparou que o sol estava prestes a nascer. O céu pintava-se de um azul mais claro, enquanto o horizonte tingia-se de laranja. Parou de caminhar por alguns instantes e procurou por uma boa posição para a primeira foto do dia. Notou uma árvore do outro lado da rua e aproximou-se dela, mirando sua câmera para capturar as folhas amareladas frente ao céu alaranjado no fundo da fotografia.

A poluição daquela cidade sempre o deixava frustrado. Imaginava o quanto aquele céu seria mais bonito sem a névoa cinza que o preenchia. Continuou sua saga rumo à indesejada manhã de trabalho, encontrando seu tio varrendo a calçada na frente da padaria.

– E aí, meu garoto – Pedro disse. – É hoje que a gente te converte ao incrível mundo da padaria?

– Acho difícil – ele respondeu, com um pequeno sorriso. Após alguns instantes, antes de entrar na padaria, o garoto retomou a conversa: – Aliás, tio, eu nunca te perguntei, por que você gosta disso?

Ele era maneiro demais para trabalhar em uma padaria – pelo menos na visão do garoto. Pedro encarou o sobrinho com uma feição confusa. Guilherme nunca falava muito, mas quando o fazia, sabia bem o que dizer.

– Olha só que boa pergunta – o tio finalmente respondeu. – Bom, eu gosto de trabalhar com teu pai... gosto de ficar perto da mãe – pensou por mais alguns instantes – gosto de conversar com os clientes... ah e tem o dinheiro, eu gosto do dinheiro – Pedro terminou de responder, rindo para Guilherme.

– Acho que são bons motivos – o rapaz falou, consideravelmente impressionado com a resposta do tio.

– Bom e teve meu pai. Você não conviveu muito com o ele, mas o velho vivia essa padaria, a gente acabou se envolvendo, eu acho. Eu sentia aquela coisa de querer dar orgulho pra ele e o Otávio, ajudar eles... e teu pai é meu irmão mais velho... eu queria ser mais como ele também. Nossa, isso já tá virando quase terapia – abriu um sorriso divertido, respondido à altura por Guilherme. – Agora vai lá ver o que teu pai quer, que ele já tá com a mão na massa. Literalmente.

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