Era Um Dia Chuvoso

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° P.O.V Dante °

Era um dia chuvoso.

As nuvens cinzentas cobriam toda a extensão visível do céu, omitindo o azul celeste acompanhado do sol em uma onda de calor que assolava a cidade. Seguido das nuvens, uma brisa refrescante que exigia um agasalho carregava o cheiro inebriante de terra molhada devido à chuva que caiu durante toda a manhã.

Cores quentes foram substituídas por cores frias, cinzentas e sem graça. O ruído das gotas no asfalto sendo obstruído e sufocado pelos pneus perfurando as poças de água.

Isso, pelo menos, fora da floricultura.

Dentro da estufa completamente alheia ao ambiente externo, o clima era agradável. As flores permaneciam com seu charme de cores vibrantes e imaculadas, enfeitando as prateleiras com cheiros, formatos e combinações diversificadas. Era muita informação para os olhos, cada pétala individual possuindo sua característica única que poderia facilmente passar desapercebida se você não prestasse atenção, já que ao todo elas se mesclam em uma bagunça caótica, mas bela.

Cuidadosamente retirei a grama que crescia ao redor, até que um pensamento repentino e intrusivo me fez parar. Não tenho certeza o porquê, mas a partir daquele momento, minha mente não conseguiu se concentrar nas flores.

Arthur.

Esse nome não traz tantas memórias, mas todas que vêm à mente são significativas, de uma forma ou outra. A primeira que veio, estávamos na sala de aula.

Eu sempre gostei de observar os outros, mas o Arthur era uma pessoa que prendia a minha atenção. Parecia sempre animado, com algo em mente, cheio de maneirismos e expressões que cativavam as pessoas ao seu redor. Por isso todos na turma o adoram.

Eu percebi que o Arthur também olhava para mim.

Eu não estava fazendo nada de tão interessante quanto ele. Eu estava apenas ali. Ocasionalmente lendo um livro, respondendo educadamente meus colegas, fazendo lições ou encarando o nada. Encarando ele, principalmente. Acho que ele nunca percebeu.

Foi uma sensação estranha, para dizer o mínimo. Era como se o ator mais cativante da peça no teatro virasse para o público e olhasse diretamente para você. Quase como uma quebra de quarta parede.

Teve uma vez que ele percebeu, no entanto. É uma analogia estranha, mas foi como você gesticular sutilmente para um cachorrinho um pouco de afeto. Seus olhos brilharam e ele se aproximou rapidamente, apresentando seu nome. Pouco tempo depois, ele estava sentado na minha frente. Menos tempo ainda, estávamos atuando no mesmo palco. E ainda mais rápido me vi saindo separadamente com ele.

Quando penso no nome do Arthur, me lembro de um cachorrinho fofo, dócil e extremamente animado. Espero que caso eu revele isso um dia, ele não se sinta ofendido.

A próxima memória, curiosamente, foi em um dia chuvoso como esse. Era noite, entretanto. Sentados abaixo do telhado de uma loja de conveniência, eu encostei minha cabeça no seu ombro.

De repente, me vi cheio de sensações. Consigo me recordar do cheiro, das luzes da vitrine, da leve música que tocava lá dentro, da brisa fresca, da sensação molhada da sua camisa na minha bochecha enquanto seu ombro se movia levemente com sua respiração.

Muito levemente. Ele parecia um pouco tenso.

Eu, pelo contrário, nunca tinha me visto tão relaxado com alguém desde que cheguei naquela escola. Geralmente demora mais para mim me recuperar quando me esforço demais fisicamente, principalmente pelo fato que fico nervoso, exigindo mais do coração, e as vias respiratórias se estreitam, tornando difícil a respiração. Entretanto, com o Arthur, naquela noite, não demorou uma hora e eu havia me recuperado.

Os problemas do amorOnde histórias criam vida. Descubra agora