Requisitos para um diploma - Simoraya

Capítulo 7 - Sobre criar expectativas

Simone

As iniciais de Soraya estão bordadas nos punhos da sua camisa social, em uma linha cinza clara que se mescla de forma agradável no branco. O detalhe é tão compátivel com sua personalidade que cai bem de uma forma que não se assentaria em mais ninguém. Suas mãos estão fechadas em punhos apertados, apoiados nos descansos da cadeira, enquanto ela olha em minha direção com a surpresa transparecendo em todas suas feições.

É quase como estar revivendo a última segunda-feira, quando a encontrei sentada na primeira fileira da minha classe, com a exceção que dessa vez eu estava preparada. Pelo menos o mais preparada que alguém possa estar para iniciar uma conversa cara a cara com seu marido e a mulher com qual você o traiu.

Desde o último sábado, quando por coincidência vi seu currículo jogado em meio a centenas de outros papéis no escritório de casa, sua entrevista marcada em caneta vermelha no calendário de mesa, eu estava me preparando para nosso encontro. O aviso prévio me permite encenar calma com perfeição ensaiada e mantenho um sorriso nos lábios apesar de que olhar para ela aqui, nesse momento, faz com que eu possa ouvir meu sangue sendo bombeado em meus ouvidos, acompanhando o ritmo do meu coração que dança frenético.

Ter tentado me preparar também não impede o aperto que sinto no peito quando a expressão de surpresa se desvanece do seu rosto, sendo substituída por um semblante neutro. Em compensação seus olhos, que continuam fixos em mim, brilham com a intensidade de um sentimento que só consigo ler como raiva.

Se ela pelo menos me desse abertura para uma única conversa.

— Simone. — Ela responde meu cumprimento vários segundos depois e Eduardo estuda sua reação com atenção.

— Então vocês já se conhecem? — Eduardo pergunta com seu típico tom animado,  revezando sua atenção entre mim e ela. Mesmo tendo percebido a reação desproporcional de Soraya, tenho certeza que a verdade sequer passa pela sua cabeça, ele nunca foi de perceber minhas indiscrições. Se ao menos ele soubesse o quanto nos conhecíamos.

— Soraya é minha aluna na UNAES. Estivemos juntas hoje mesmo, mais cedo.

Ele estende a mão em minha direção, me chamando para perto de si. Eduardo sempre teve essa mania de não conseguir ficar no mesmo ambiente que eu sem estar me tocando de alguma forma. Sua mão sempre estava segurando a minha, repousada em minhas costas ou em algum gesto carinhoso que fazia todas as outras mulheres em volta olharem com admiração.

Minha vida seria muito mais simples se eu fosse como elas e conseguisse apreciar esses pequenos gestos, que às vezes só me faziam querer sumir. No mínimo eu com certeza não estaria nessa situação. Me aproximo dele mesmo assim, seguindo todo o roteiro que se é esperado de mim e ele leva minha mão aos seus lábios, beijando meus dedos bem em cima da nossa aliança de casamento. Soraya que antes acompanhava todos os meus movimentos desvia o olhar, o direcionando para o chão sem nem mesmo piscar.

— Que coincidência! — Ele diz para mim. — Tinha me esquecido que você havia pegado matérias dos últimos períodos para lecionar durante esse semestre, era para eu ter percebido que teria chances de vocês se conhecerem de lá. Mas, que ótimo! Então podemos pular as apresentações.

— Sim, realmente é muita coincidência. — Soraya sorri mas seu sorriso não chega aos seus olhos, que normalmente se enrugam com o gesto mas que agora permanecem inexpressivos.

Só então me dou conta que não a vejo sorrir de verdade, daquela forma em que seu nariz se franze de felicidade, desde a última vez que estivemos juntas no Rio. Sinto falta do seu sorriso. Do verdadeiro e não dessa imitação pálida.

— Será um prazer trabalhar com você, Soraya. Li seu currículo, você vai ser de grande ajuda no admistrativo. — Com minhas palavras ela volta a focar em mim, pela primeira vez desde que Eduardo pegou minha mão. Meu estômago se embrulha quando mais uma vez noto a ira fervendo em seu interior, mas minha máscara permanece intacta, sem nem mesmo vacilar.