Requisitos para um diploma - Simoraya

Capitulo 22 - Versão de nós

Soraya

O escritório está ainda mais tumultuado do que de costume, o barulho estridente de cadeiras sendo arrastadas no chão de madeira ecoa. Os funcionários levantam com uma pressa desenfreada entre uma e outra tarefa e somados as vozes estressadas que se juntam em um burburinho incompreensivo, o ambiente se torna uma perfeita performance do caos.

Marcelly já havia aparecido desesperada em minha mesa ao menos duas vezes desde o início de nossos expedientes, pouco mais de uma hora atrás, perdida em meio a confusão criada após as acusações de fraude fiscais contra o maior cliente da C & T advocacia ter explodido na mídia de forma súbita. Todos que antes já estavam com as mãos tão cheias de trabalhos, correndo contra o tempo para o fechamento de vários casos, agora estão atolados e sem previsão para um possível descanso.

Em um bom momento talvez minha concentração permitisse que meus dedos fossem ágeis o suficiente para responder, com rapidez satisfatória, os e-mails que chegavam sem descanso em minha caixa de entrada já abarrotada. Mas esse terminantemente não seria um dos dias em que poderia me gabar do meu foco e agilidade. Não com a cabeça tão cheia de Simone. As palavras dela não saem das minhas ideais e me tornam reféns das minhas próprias lembranças, presa na minha projeção particular que se reinicia sempre que chega ao fim.

Sua declaração naquela sala de aula onde nós reencontramos meses antes. Repetindo as palavras ditas por mim e que agora me parecem teatrais da minha parte, mas que encaixam a perfeição quando saídas de sua boca.

A maneira que ela deixou seus dedos roçarem em todo o cumprimento do meu torso quando veio até mim pedir um favor alguns minutos mais cedo. Fazendo todos os pelos do meu corpo se arrepiarem como em algum tipo de encanto que apenas ela conhece as palavras de invocação.

A piscada e o sorriso que ela deu apenas para mim, em meio a uma discussão acalorada ao telefone no interior de sua sala. O seu rosto se se suavizando de todo a irritação causada pela ligação assim que seus olhos encontraram os meus.

E então, tudo do começo. Outra e outra vez. Sem acreditar inteiramente que tudo é real.

— Soraya? Porque você 'tá rindo sozinha? — O chamado da ruiva, tão próximo de uma risada, me acorda do transe.

— Oh, desculpa. Só me distrai um pouco lembrando de uma coisa que vi.

— Uma coisa que você viu? Conta outra. — Marcelly mantém seu tom brincalhão, aproveitando para se apoiar em minha mesa. — Quem é o sortudo?

— Sortudo? Que sortudo? - Pergunto confusa, demorando alguns segundos para entender onde ela de fato quer chegar.

— Não se faça, Soso. Essa carinha de apaixonada entrega de longe que tem algum homem na jogada, nunca vi ninguém sorri tanto para as paredes.

Sinto o meu sangue subir para meu rosto e minha bochechas ardem como se estivessem expostas ao ar frio em um dia que beira ao glacial. A vergonha por meus sentimentos estarem tão expostos ao menos é sobrepujada pelo alivio de não se haver desconfiança sobre quem era o alvo da minha afeição. Quase ter sido pega duas vezes me deixa em um estado de alerta constante, que estava se provando não fazer bem para minha sanidade.

— Te juro que não tem homem nenhum. — Garanto rindo e dessa vez nem mesmo preciso mentir. Homem nenhum jamais me faria sentir o que Simone Tebet conseguia com um único sorriso. — Só lembrei do vídeo que um amigo me mandou.

Marcelly arqueia suas sobrancelhas aparadas a perfeição em minha direção, apenas para deixar claro que não acredita em mim nem por um segundo.

— Dessa vez eu vou deixar passar só porque estamos atoladas nessa confusão, mas fique preparada que vou querer saber pelo menos se ele é da faculdade. — Diz e me olha com seus  olhos verdes e grandes de Bambi, que tenho certeza que já foram responsáveis por a garantir muitas concessões.