Capítulo 4 - Professora Tebet

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Soraya

Ainda é estranho estar de volta ao Mato Grosso do Sul. Mesmo já prestes a completar 4 anos desde que me mudei para o Rio, agora que voltei ao estado, ele ainda me parece exatamente igual. As mesmas lojas abertas espalhadas pelo centro de Campo Grande, fazendo com o que o movimento naquela parte da cidade esteja sempre caótico, independente do horário do dia. A sorveteria que eu frequentava com minhas amigas no ensino médio ainda tem os mesmos bancos verdes forrados e o menu continua desatualizado, constando o sabor Céu Azul que já não era vendido por eles há pelo menos uma década.

Nesses dois dias desde que cheguei fui perseguida pela sensação de quase déjà vu. Tudo me parece ainda mais esquisito porque apesar de que aparentemente nada tenha mudado, eu sou uma pessoa diferente por completo da Soraya de 4 anos atrás que se sentia em casa caminhando por essas ruas.

Meu apartamento também não está sendo de grande ajuda para me libertar dessa estranheza. Os móveis que eu havia deixado para trás quando me mudei para o Leblon, continuam nas exatas mesmas posições e os diversos livros sobre administração na estante da minha sala só me fazem lembrar das noites em claro estudando para as aulas da minha primeira graduação. Por isso estou fazendo de tudo para terminar de desencaixotar minha mudança o mais rápido o possível, mas parece que quanto mais caixas eu esvazio mais caixas aparecem em seus lugares e é impossível achar qualquer coisa específica no meio dessa bagunça.

Respiro fundo e olho para o teto, tentando reunir o mínimo de paciência, quando termino de abrir a décima caixa de papelão lotada de livros que estão espalhadas pela minha sala. Minha primeira aula do semestre começa amanhã às 7h e realmente preciso do meu livro de oratória forense, que teoricamente deveria estar em alguma dessas caixas.

Eu realmente odeio mudanças.

Passo o estilete no durex que fecha a última caixa marcada como “livros” em sua lateral. É claro que o livro estaria na última caixa que eu abrisse, como algum tipo de pegadinha babaca do universo.

Antes que eu possa olhar melhor quais os títulos dos livros na última caixa, ouço alguém batendo em minha porta. Pego meu celular quase soterrado por livros em cima do sofá, o relógio marca 22h27, tarde demais para fazer uma visita não marcada a qualquer pessoa. Só pode ser ele. Suspiro, já sentindo meu corpo pesado em exaustão. Estava com esperanças de poder adiar esse encontro até o final da semana.

Os cabelos da lateral de sua cabeça estão muito mais grisalhos do que da última vez que o vi, mas o seu sorriso é o mesmo. Aberto o suficiente para que pequenos vincos apareçam em seus olhos e tão parecido com o sorriso que vejo no espelho a ponto de ser desconcertante.

—  Pai.

— Boa noite, minha oncinha. Estava com saudades.

Ele me abraça, seu perfume amadeirado me lembra minha infância. Quando ele me levava para o seu escritório e me deixava brincar de presidente, sentada atrás da enorme mesa de mogno, naquela poltrona que era três vezes maior do que eu.

— Também estava. — E essa é uma meia verdade. Sinto falta do meu pai de antes, não do homem que ele havia se tornado. — Entre, vou te servir um café.

— Paulo César entrou em contato — Ele diz, sentando na cadeira alta em frente a bancada da minha cozinha.

Aí está. E dessa vez não tinha demorado sequer cinco minutos. Entrego o copo com café a ele, ficando em silêncio por alguns segundos antes de responder.

— Não quero falar sobre Paulo César, papai. Nós terminamos. Fim.

— Ele é um bom homem, seria um excelente marido. Talvez você devesse repensar sua decisão, tenho certeza que ele está disposto a te aceitar de volta.

Requisitos para um diploma - SimorayaOnde histórias criam vida. Descubra agora