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23/11/2022, Catar
Sabe aquelas metas que nós fazemos no calor do momento?
Então, eu fiz uma dessas há alguns meses. E agora, em novembro, estou em Catar cobrindo a Copa do Mundo com a Globo.
Sinto meu relógio vibrar, enquanto caminho em direção à saleta reservada para o nosso time. Vejo que minha mãe me ligou por chamada de vídeo e me apresso para retornar.
—Filha, 'tá tudo bem? Por que você não me atendeu? —Ela indaga assim que eu atendo.
—Mãe, estou voltando do almoço. Quando fui atender a chamada caiu. —Falo mostrando meu crachá para o segurança que permite a minha entrada.
O fato de eu estar em outro país, sozinha e aos 18 anos faz com que a minha mãe tenha 50 tipos de surtos diferente.
—Mamãe, vou ter que desligar. —Digo ao ver que esqueci meu caderno dentro da van. —Beijos, até mais tarde.
—Beijos, filha. Se cuida e não ande sozinha. —Faço um joinha para a camera e desligo.
Saio a passos rápidos, caminhando em direção ao estacionamento. Quando chego ao local olho ao redor a procura da minha van.
E advinha? Eu não achei a minha van. Eu olhei por todo lado pelo menos umas três vezes. E simplesmente não achei. Ela não deveria estar aqui? Até aonde eu sei ela ficaria estacionada até o momento de irmos embora.
Coloco as mãos na cintura e peço a Deus, silenciosamente, que me proteja e me oriente porque quando uma coisa começa a dar errado na minha vida uma onda de desgraças ocorrem e o pior, de forma seguida.
Depois do meu pequeno surto interno por ter perdido o meu brieffing. Olho novamente para o estacionamento e como se fosse uma luz no fim do túnel enxergo a van manobrando em uma vaga a alguns metros.
—Obrigada Deus! —Murmuro caminhando até ela depois de assegurar que era a van correta.
Dou uma corridinha até a porta lateral e a abro com um pouco de dificuldade e foi ai que o problema começou.
Como eu sou meio tapada, eu só fui perceber meu erro dentro do carro. Olho para os bancos e ao invés de encontrar o vazio encontro homens.
Homens bonitos. Quer dizer, jogadores de futebol, que agora me encaram como se eu fosse uma das dez pragas do Egito. Devo confessar que eu não conheço nenhum deles e por ser péssima em geografia eu não reconheci a bandeira estampada na blusa de frio.
—Então gente, —Falo assim que percebo a merda que eu fiz —eu acho que errei a van, me descu-...—Foi nesse momento que eu percebi que, sim, o que já está ruim pode e vai piorar. E eu constatei isso ao sentir um solavanco e meu corpo ser arremessado para frente.
Antes que eu pudesse fazer alguma coisa uma voz em espanhol falou em meu ouvido.
—Quando dizem que jogadores de futebol tem mulheres se jogando aos seus pés, eu pensei que era brincadeira. —Senti sua mão em minha cintura e sua respiração em meu pescoço. Coloco minha mão no ombro do sujeito para sair de cima dele, mas quando impulsionei meu corpo percebi que não foi uma boa ideia, já que mais um solavanco aconteceu me fazendo segurar firme em seu casaco para não beijar o chão.
—Desculpa, não queria fazer isso. —Disse tentando recuperar minha dignidade. —A primeira vez foi a força que atuou sobre mim, já a segunda vez foi a força mais a minha consciência evitando que eu beije o chão. —Murmurei, usando meu espanhol bem enferrujando, essa última parte e os jogadores pareciam se divertir comigo.
—Qual o seu problema com o chão? E é melhor você se segurar... —O homem, -ou seria garoto?- que eu cai e usei de bote salva-vidas disse.
—Bom, o chão não faz muito meu tipo sabe?! Ele é duro e frio, digamos que eu gosto de... —Observo o garoto (ele tem cara de bebê), pela primeira vez. Ele era lindo e gato, muito gato. E o sotaque, puta merda! Eu tenho um fraco por homens falando em espanhol.
—De...— O jogadorzinho repete. Balanço minha cabeça ao perceber o que eu estava falando.
—Preciso ir. Tchau e desculpa.
—Volte sempre furacão. —Escuto alguém dizendo, mas não olho para trás para ver quem disse.
Resignada e morta de vergonha acelero o passo para voltar para o lugar que eu nunca deveria ter saído.
—Aonde você estava? Já estamos prestes a nos atrasar. Não sei o porquê de acharem que era uma boa ideia contratarem uma garota tão jovem para uma coisa tão grande. —Meu superior resmunga assim que entro na sala.
—Porque eu sou boa, oras. —Falo e no mesmo instante me dou um tapa mentalmente.
Primeiro: eu sei que sou jovem e nem formada eu sou. Entretanto, o fato de eu estar na faculdade desde os 16 anos só comprova que, sim, eu sou mais que capaz.
Ah, mas você só conseguiu isso por ser filhinha de papai. Sim, eu sou filhinha de papai, mas não no sentido normalmente usado. Sou de uma família classe média-baixa e meus pais me manteram com muito esforço (e descontos) na escola particular. Minha mãe que não sonhe com isso, mas eu escutava ela chorando baixinho e pedindo a Deus que a ajudasse a pagar a mensalidade. Apesar dos meus pais fazerem de tudo para eu ter as coisas do bom e do melhor, eu ouvi vários não, apanhei tantas vezes que eu nem posso contar nos dedos.
Então sim, eu sou filhinha do papai porque ele me dá carinho, amor e atenção.
Segundo: Sou mulher e brasileira. Olha que legal, eu não sou uma puta interesseira. E mesmo se fosse, o que esse velho tem a ver?
Melhor trabalhar de forma honesta, do que desviar dinheiro.
Terceiro: Ele nem me deu espaço para justificar meu atraso. Silenciador de minorias rs.
—Vamos lá, Milena. Vou fingir que não ouvi o que você disse. —Mordo minha língua para não rebate-lo.
—Sim, Cleiton.
Caminho até a equipe enquanto arrumo a camisa social azul em meu corpo. Vejo no reflexo se algum fio está fora do lugar e como já era de se esperar, tinha, mas especificamente todos. Cabelo cacheado é complicado.
—Bom dia. —Saudo, enquanto uma mulher vem colocar um microfone em mim. Minutos depois já estou posicionada em frente a câmera para começar o programa de hoje.
—Bom dia, mais um dia de Copa do mundo, 2022. Ela acontece em Qatar, continente localizado na Ásia. —Começo sorrindo de forma simpática para a câmera. —Bom, hoje os jogos serão Croácia e Marrocos, Alemanha e Japão, Espanha e Costa Rica e para fechar o dia Bélgica e Canadá. Quais são suas expectativas para o jogo de hoje, Paulo? —Jogo a bola para meu parceiro de time, que vem analisando todos os jogadores e seus respectivos grupo.
—Enquanto, eu fazia minhas pesquisas e estudos, cheguei a conclusão que Croácia e Marrocos terá um jogo acirrado e irá finalizar no 0x0. Alemanha e Japão poderá surpreender já que ambos estão fortes. Infelizmente, como eu comentei ontem Espanha e Costa Rica são adversários opostos em todos os sentidos e o ataque da Espanha está bem pensado e treinado. Por último, Bélgica e Canadá seria uma bela surpresa se o Canadá vencesse, primeira vez em anos que este país está de volta a concorrência, mas a Bélgica está mais forte. Milena.
—Muito obrigada, Paulo. Vamos para um rápido intervalo e logo mais estaremos de volta com o primeiro jogo do dia 23.