Por um longo instante, o silêncio paira entre sobre mim como uma massa de concreto prestes a me esmagar.
Laura se levanta e, virando as costas em nossa direção, se posta diante da parede de vidro, cruza os braços e segue em silêncio. Tira a mão da frente da boca.
— Abuso? — Apolo soa chocado, sua voz falha. Parece que essa única palavra carrega mais peso do que qualquer outra agora.
Laura assente sem se virar, respira fundo e solta o ar lentamente. Nesse ângulo, o seu penteado sofisticado fica mais bonito, contudo não há beleza que faça com que o teor da conversa se amenize.
— Que história é essa de abuso? — Apesar de qualquer coisa, a voz de Apolo reverbera, forte, pela sala vazia demais e retorna para meus ouvidos como uma bala em ricochete.
— Não me faça perguntas difíceis, Apolo. Sei tanto sobre essa parte da vida de Dora quanto você. Isso é uma coisa que apenas ela poderá esclarecer. — A menção de Dora faz com que me sinta mais esmagado ao lembrar que ela ainda não sabe sobre a sua morte e, pensando sobre o que ela acaba de contar, seu suicídio não parece tão deslocado assim. Se Dora carregou isso consigo por tanto tempo, junto com o afastamento de Apolo, com certeza deve ter colaborado para chegar a esse extremo. — Ela nunca se sentou em uma conversa comigo para falar sobre. Acabei descobrindo por acaso enquanto ela conversava com Ligia, porque a depender dela, eu nunca saberia.
— Eu... Não sei o que dizer.
— Então não diga nada!
Apolo se levanta e caminha para perto da mulher, ergue a mão, porém não a toca e, hesitante, desce a palma fechada em punho.
— Tenho que te contar uma coisa...
— Sei que você têm razões de sobra para não acreditar em mim agora, sei que foi ela quem esteve ao seu lado durante todos esses anos e que não te procurei, mesmo depois que o Bruno morreu — dispara ela, quase que como se agarrando a uma centelha de oportunidade para ter coragem para falar enquanto ainda pode. — Mas quero que saiba que eu tive medo, não sabia o que encontraria lá, não sabia se acreditaria em mim ou se entenderia essa história maluca... Eu acompanhei sua vida como pude, só que fui fraca demais por não ter batido na sua porta para falar sobre tudo o que aconteceu. Eu tive medo.
Sem dizer nada, Apolo se vira e caminha pelo aposento, seus passos são firmes e altos. Ele vai para o lado oposto ao dela e a encara de longe, muito embora ela continue virada para a parede de vidro.
— Talvez essa distância que há entre nós agora nunca mais possa ser desfeita, mas eu quis vir até aqui para olhar nos seus olhos e procurar tentar entender o seu lado da história, porque sentia que merecia isso, principalmente depois de hoje. Sei que não posso esperar muito para tentar concertar as coisas, pois posso não estar aqui amanhã para isso. — Suas palavras retorcem meu estômago. Não gosto de ouvi-las, continuo permaneço estático, apenas como o telespectador penetra dessa conversa. Sinto que não deveria estar aqui, ao mesmo tempo quero estar. — De fato, não há o que você possa dizer para me fazer entender o que te levou a nunca me procurar, pois saber que teve medo não ameniza as coisas, porque você teve doze anos. Não foram doze dias nem doze horas, foram doze anos, enquanto eu acreditava que minha mãe tinha morrido no meu nascimento, enquanto eu nem sequer sonhava que Lady é minha avó. Qualquer mãe no seu lugar teria movido céus e terras para estar perto do filho, quer ele entendesse ou não. Eu merecia isso, merecia a verdade, merecia saber quem estava ao meu lado e porquê. Não deveria existir riqueza ou bens para impedi-la de fazer isso... Você diz que sua Dora não foi feita para ser mãe, mas parece que isso é hereditário e você também recebeu isso dela.
Sinto um amargor no fundo da minha garganta. As palavras de Apolo são o reflexo disso.
Ele coloca as mãos nos bolsos da calça e fica encarando as costas da mulher que lhe deu a vida, parecendo prestes a voltar até ela e obriga-la a se virar para encara-lo. Como se pressentisse isso, Laura se vira e olha para ele com uma expressão esquisita. Nem de longe é raiva ou rancor, mas também não chega a ser tristeza. Não consigo identificar o que ela está sentindo, o que só piora o clima inóspito.
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GUIANDO O PRAZER (+18)
RomanceQuando tudo parecia estar indo bem, Apolo e Alexandre descobriram que na verdade era apenas o começo. Seus problemas haviam apenas começado e agora terão que lidar com coisas ainda maiores, pois o destino tem seus próprios planos para suas vidas. Se...