Ele empurrou o peito de Carney com o ombro, separando as lâminas e fazendo o bandido cambalear para trás. Então, com calma, avançou, agitando a espada em combinações desconcertantes e apavorantes. Golpes laterais e por cima. Lateral, lateral, cortada à esquerda, ataque. Lateral, lateral, cortada à esquerda, cortada por cima. Ataque. Ataque. Ataque. Cortada para a frente, para trás. Uma combinação se transformava suavemente em outra, e Carney lutava desesperadamente para colocar sua lâmina entre seu corpo e a espada implacável que parecia viva e dona de uma energia interminável. Os golpes de Horace ficavam cada vez mais fortes e firmes até que, finalmente, com um último tinido surdo, Horace simplesmente arrancou a espada da mão entorpecida.

Carney caiu de joelhos com o suor escorrendo para dentro dos olhos, o peito se movimentando com esforço, esperando o golpe final que poria fim a tudo.

- Não mate ele, Horace! - Gilan gritou de repente - Quero fazer umas perguntas.

Surpreso, Horace olhou para nós, e então de de ombros, satisfeito por não ter que matar um oponente à sangue frio. Jogou a espada para o lado, colocando-a fora de alcance. Então, com a bota no ombro do bandido derrotado, empurrou-o para o chão, fazendo-o cair de lado.

- De onde vocês vieram? - Horace perguntou furioso - E por quê não me ajudaram?

- Pelo que vi, você não parecia precisar de ajuda - Gilan disse simplesmente, com um sorriso.

O bandido Bart estava se levantando devagar, balançando a cabeça, pois o efeito do golpe do cabo da espada começava a passar.

- Acho que seu outro amigo precisa de um pouco de atenção - eu disse.

Horace se virou e levantou a espada casualmente, batendo a lateral da lâmina no crânio de Bart. Ele deu outro leve gemido e caiu de cara no chão.

- Ainda acho que vocês deveriam ter dito alguma coisa.

- Nós teríamos feito isso se você estivesse com problemas - Gilan disse - Ayla estava pronta para atravessar aqueles dois com flechas quando eu a impedi.

Então ele atravessou a clareira e se aproximou de Carney. Levantou o bandido pelo braço, obrigou-o a ficar de pé, arrastou-o pela clareira e o jogou, sem delicadeza, contra uma rocha. Quando Carney começou a cair para afrente, ouviu-se um raspar de aço sobre couro, e a faca de Gilan apareceu em sua garganta, fazendo que o bandido ficasse com o corpo ereto.

- Então, esses dois pegaram vocês cochilando? - Gilan perguntou, e os dois aprendizes assentiram envergonhados.

- Desde quando vocês estavam aqui? - Will perguntou.

- Desde que eles chegaram - eu respondi, me aproximando de Gilan e o prisioneiro - Vi eles subindo a colina, e era óbvio que não tinham boas intenções. Então, os segui até aqui. 

- E por que não disseram nada? - Will perguntou. Dessa vez, Gilan respondeu.

- Porque vocês precisavam de uma lição. Estão num território perigoso, parece que a população desapareceu misteriosamente, e vocês ficam aí fazendo exercícios com a espada para que todo mundo veja e escute.

- Mas... - Will balbuciou - Achei que devíamos praticar.

- Não quando não há mais ninguém para ficar de olho no que está acontecendo - eu ressaltei - Quando se começa a treinar desse jeito, fica-se totalmente concentrado nisso. Esses dois fizeram barulho suficiente para chamar a atenção de uma vovó surda. Puxão até avisou você duas vezes e você não percebeu.

- É mesmo? - Will perguntou.

Nós não respondemos, encarando os aprendizes até termos certeza de que eles tinham aprendido a lição. Então, Gilan fez um gesto, indicando que o assunto estava encerrado.

- Agora - ele disse - vamos descobrir o que essas duas belezinhas sabem sobre o preço do carvão.

Nós nos viramos para Carney. Percebi o olhar dele sobre mim, me medindo enquanto eu me ajoelhava ao lado de Gilan. O arqueiro percebeu o olhar do bandido, e furioso, apertou a faca um pouco mais contra a garganta dele.

- Olhe para mim! - ele ordenou, e Carney imediatamente o fez, o medo espalhado por seu rosto.

- Há quanto tempo vocês estão em Céltica? - Gilan perguntou. Carney intercalou o olhar entre Gilan e a faca pesada pressionada contra seu pescoço.

- Da... de... dez ou onze dias, meu senhor - ele gaguejou.

- Não me chame de "meu senhor" - Gilan disse, com raiva, e então se virou para Will e Horace - Essa gente sempre tenta agradar quando percebe que está em dificuldades - ele se virou para Carney - O que estão fazendo aqui?

Carney hesitou, e evitou olhar para Gilan. No mesmo momento ficou claro que ele ia mentir.

- Só... queria conhecer a região, meu... - ele parou, pois se lembrou no último instante da instrução de não falar "meu senhor".

Gilan suspirou.

- Olhe, eu gostaria de cortar sua cabeça aqui e agora. Duvido mesmo que tenha alguma coisa útil para me contar. Mas vou lhe dar uma última chance. Agora, DIGA A VERDADE!

Ele gritou as últimas palavras, deixando de lado o resquício de humor. A mudança pareceu assustar ainda mais o bandido.

- Ouvimos dizer que havia coisa boa por aqui! - ele disse imediatamente.

- Coisa boa? - eu repeti, e dessa vez Carney dirigiu seu olhar a mim, como se pedisse por misericórdia.

- Todas as vilas e cidades desertas. Ninguém para vigiar nada, e todos os bens jogados pelos cantos para pegarmos à vontade. Mas não prejudicamos ninguém - ele explicou.

- Ah, não, não prejudicam. Vocês só entraram quando as pessoas não estavam e roubaram tudo o que elas possuíam de valor - Gilan completou. - Acho que ficaram até agradecidas pela sua contribuição.

- Foi ideia de Bart, não minha - o bandido tentou justificar, e Gilan balançou a cabeça com tristeza. 

- Gilan? - Will chamou - Como eles ficaram sabendo que as cidades estavam desertas? Nós não ouvimos nada.

- É a rede de informações dos ladrões - o arqueiro explicou - É desse jeito que os urubus se reúnem sempre que um animal esta morrendo. A rede de inteligência entre ladrões, bandidos e salteadores é incrivelmente grande. Assim que um lugar enfrenta dificuldades, a notícia se espalha como um rastilho de pólvora e eles surgem de todos os lados. Tenho a impressão de que há muitos mais nestas colinas. Não é mesmo? - ele completou, voltando a olhar para Carney.

- Sim, senhor.

- E devo imaginar que você tem uma caverna em algum lugar, ou algum túnel de mina deserta, onde escondeu o que roubou até agora?

Ele aliviou a pressão da faca apenas o suficiente para que o bandido pudesse assentir levemente com a cabeça, confirmando. Os dedos do bandido foram até a bolsa que carregava no cinto, mas pararam quando percebeu o que estava fazendo. Entretanto, Gilan tinha visto o movimento e, com a mão livre, abriu a bolsa com irritação e remexeu em seu interior até que finalmente tirou uma folha de papel suja dobrada em quatro. Ele a passou para mim.

Eu olhei rapidamente para o papel, que mostrava um mapa mal desenhado com pontos de referência, instruções e distâncias.

- Eles enterraram o produto do roubo - eu informei, e guardei o mapa com um pequeno sorriso - Ótimo. Sem isso, não vão poder encontrar ele de novo.

- Mas esse é o nosso... - Carney começou, mas eu o interrompi.

- Não tem nada de seu - eu disse, zangada - Foi roubado. Vocês se esgueiraram como chacais e roubaram de pessoas que estão em grandes dificuldades, isso é evidente. Não é de vocês. É delas. Ou de suas famílias, se ainda estiverem vivas.

- Elas ainda estão vivas - disse uma voz surgindo atrás de nós - Elas fugiram de Morgarath... As que ele ainda não capturou.

A Ordem dos Arqueiros - Arqueira do Rei ➀Onde histórias criam vida. Descubra agora