Embora a temporada ainda não tivesse começado, Lady Violet Bridgerton achou que seria de bom tom adiantar Eloise em suas apresentações aos possíveis pretendentes que encararia quando retornassem a Londres. Um número considerável de pequenas fotos, onde títulos e sobrenomes eram marcados, se encontravam espalhados sobre a mesinha de centro da sala de estar, enquanto a viscondessa-viúva tentava veemente fazer a filha gravar meia dúzia daqueles nomes.
— Senhor Dorset, Eloise! Não “Lorde” Dorset! — a repreendeu, exausta em ter de corrigi-la pelo que seria a milésima vez.
— Ai, mamãe, e haverá diferença no modo como este “Não-Lorde” me tratará em relação aos demais?! — a menina exclamou de volta, jogando-se contra o encosto da poltrona, os braços rudemente cruzados. — No fim, serei apenas um cordeiro preparado para o abate, não importa o pretendente que vá tentar me conquistar!
— Um belíssimo cordeiro, de fato. — Colin gracejou, surrupiando das mãos de sua mãe a foto do pretendente que discutiam no momento. — Ô, Senhor Dorset! Me daria a honra de uma dança?! — rira, afinando sua voz numa tentativa muito bisonha de imitar a irmã.
— Mas é claro, milady! Por que haveria de eu olhar para outra dama neste baile, senão você?! — Benedict, que também se encontrava à sala, resolveu entrar na brincadeira, sua voz adquirindo um tom pomposo que só poderiam imaginar ser o do “Não-Lorde” Dorset.
— Meninos, por favor, parem de implicar com sua irmã! — Violet os censurou, quando eles iniciaram uma dança atrapalhada no meio da sala. — Com todas as preocupações que ela terá quando a temporada iniciar, certamente ela não precisará ter de lidar com as tolices vindas de vocês!
— Assim nos magoa, mamãe! Mas, se é de sua vontade que deixemos nossa irmãzinha em paz, posso até ponderar sobre. — acordou, aproximando-se o bastante para apertar uma das bochechas de Eloise, que nem menos hesitara em lhe retribuir com um tapa na mão.
— Pois eu acho bom. Afinal, não deveriam se sentir tão privilegiados em relação a ela, já que assim que Anthony se casar nessa temporada, vocês serão os próximos a caírem em meus cuidados de casamenteira. — pontuou, sorrindo para as expressões incrédulas nos semblantes de seus filhos.
— Com sorte não me casarei na minha primeira temporada, e assim poderei vê-los passando pelos “adoráveis sufocos” em serem caçados pelas mamães casamenteiras e suas filhas donzelas! — Eloise riu, animando-se com aquela perspectiva.
— Não tão rápido, irmãzinha. Como mamãe bem pontuou, Anthony terá de se casar antes! — Benedict fizera questão de salientar esta condição.
— Mas afinal, onde está Anthony?! — Colin se questionou, e por um segundo todos na sala se silenciaram para se fazerem esta mesma pergunta.
“Bom, talvez não tivesse acordado ainda” Violet ponderou, não se recordando de vê-lo na sala de refeições quando todos se juntaram para tomar o café da manhã. Ainda assim, parecia uma ideia pouco válida, já que seu filho não era realmente conhecido por se prolongar dentro de seu quarto, o que a fazia mudar a questão para uma outra alternativa.
— Alguém teria o visto sair mais cedo? — perguntou, muito embora achasse difícil alguém poder lhe responder, dada a confusão com que todos tratavam o paradeiro de Anthony.
— Tenho a impressão de ter visto a carruagem da família retornar há algum tempo, mas não me lembro de ninguém nos estábulos além do cocheiro. — Colin matutou, trocando olhares com os demais, a procura de alguma outra informação que pudesse ser emendada ao fato que estava expondo.
— Mas por qual motivo ele teria pego a carruagem, para então se desfazer dela? São pontuações válidas, mas parecem fazer tão pouco sentido... — a matriarca contra-argumentou, de repente se sentindo apreensiva com aquela falta de respostas às dúvidas de todos.
— Teria se encontrado com alguém da família Bennet? — Hyacinth, que nem mesmo se encontrava na sala há poucos instantes, opinara, fazendo todos se voltarem para sua pessoa.
Os Bennet. Violet quase havia se esquecido que seu filho havia ido de um sujeito totalmente avesso a alguém extremamente presente na vida dos residentes de Longbourn, apesar de ter plena ciência de que ele permanecia a agir de tal maneira por conta de seu espírito inconvenientemente impulsivo. De todo modo, a conjectura de sua caçula lhe aliviara o espírito inquieto, afinal, parecia muito plausível imaginar seu primogênito visitando a residência deles logo pela manhã.
E, como se o universo estivesse disposto a finalmente dar-lhes uma resposta a suas dúvidas, uma carruagem de porte modesto não tardou a estacionar na frente da residência dos Bridgerton, que correram para receber a figura que estaria ali dentro.
— Vejo que estão todos de pé, afinal! — Anthony gracejara no hall de entrada, vendo seus irmãos e mãe se aprumando a sua frente. — Um bom dia a todos.
— Por onde andou? — Violet nem pensara duas vezes antes de lhe perguntar diretamente.
Para seu azar, o visconde não parecia muito propenso a lhe dar uma resposta imediata, já que nada mais fizera além de sorrir em sua direção, contornando seus familiares para adentrar ainda mais a mansão, deixando-os para trás.
— Oras, deixe de mistérios...Por onde andou?! — a mulher repetira sua pergunta, possuindo uma certa vantagem em relação aos demais em sua corrida ao encalço de Anthony.
— Apenas estive andando por aí, mamãe. Mas não se preocupe, creio que tenha tirado dessas “andanças” algo que irá lhe agradar e muito. — garantiu, girando os calcanhares para se por a frente dela, que por sua vez se atrapalhara com aquela súbita parada de passos.
Violet não estava inteiramente satisfeita com aquilo. Arriscaria dizer que terminou com mais dúvidas do que estava a princípio.
— Mas então, sobrou algo do café da manhã? Não comi nada mais cedo, e confesso que estou faminto! — o visconde pontuou, dando um fim em todos aqueles questionamentos sobre seu paradeiro.
...
Estirada no gramado da residência de Netherfield, Elizabeth se sentia mais leve do que as gotículas de orvalho que umedeciam aquele vasto verde. Aquela era a primeira vez que retornava de uma conversa com o visconde sentindo-se tão...bem. Poderia até soar algo estranhamente incômodo, se no fim, a moça não tivesse se dado por vencida, decidindo apenas abraçar a calmaria que afagava sua mente e coração.
— Parece tão em paz. Seja lá o que estivesse nublando seu humor nos últimos tempos, certamente não a afetava mais. — Jane declarou, admirando a irmã, sentada a não muitos centímetros de distância.
Havia sido uma exigência dela aprontarem o chá da tarde nos jardins, afim de aproveitarem do bom clima daquele dia. A Senhora Bennet não pareceu muito feliz em ter de abandonar uma sala finamente decorada para se dispor na grama, mas no fim todos pareciam minimamente satisfeitos com a decisão da senhora de Netherfield.
— Não mesmo. — Elizabeth admitiu, rindo feito uma boba.
— E se importaria de dividir com a sua irmã o que teria a incomodado? — Jane inquiriu. Podia ser uma pessoa que prezava a boa privacidade das pessoas, mas não conseguia se fazer indiferente ao que teria afetado sua irmã.
— E tal conhecimento faria alguma diferença?! Agora que não me vejo mais sendo incomodada, todo o resto parece tão...irrelevante. — Elizabeth retrucou, sem sair de sua posição relaxada.
— Se é o que pensa, então fico feliz por você. — a irmã dera de ombros, dando-se por vencida.
— Oras, mas o que tanto fofocam entre si, tão à margem dos outros?! — a Senhora Bennet questionou, saindo da tenda que teriam disposto para a família, salvo as duas irmãs, que haviam preferido a sombra natural das árvores.
— Discutíamos quanto tempo levaria para a senhora vir desfrutar da grama conosco, mamãe! — Lizzy exclamou ironicamente, ambas as meninas rindo da cara de choque que sua mãe fez.
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Desprezo & Devoção
RomanceDes.pre.zo: Falta de estima, repulsa. De.vo.ção: Afeto, dedicação. Como palavras tão distintas em significados poderiam ser despertadas simultaneamente em presença de um certo alguém? Nem Elizabeth Bennet, tampouco o Visconde Anthony Bridgerto...