39 - Trovões

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(POV Otto)

Já faz duas semana desde a revelação que sou filho da Glória. Ela veio umas duas vezes visitar a gente, para conversar comigo, perguntar como eu estou me sentindo depois de tudo, respondi que bem, e talvez essa seja a maior mentira que estou contando desde que isso veio a tona. Marcelo também veio aqui uma vez, tentar entender a minha versão das coisas, perguntar a quanto tempo eu sabia e como as coisas iam ser a partir de agora. Mas como eu vou responder isso se nem eu sei? Provavelmente uma família normal nós não somos. Poliana está super feliz com todas as novidades, ainda é algo que está apenas entre a família, então o resto do mundo ainda não sabe de tal novidade, pelo menos não por enquanto. E Luísa... Bom, Luísa ainda está chateada, não tiro a razão dela, eu também ficaria se ela me escondesse algo tão importante assim como eu fiz. Ela não para muito tempo em casa, passa a maior parte do tempo na casa de Durval. Aparentemente me evitando, acho que ela ainda não sabe ao certo o que fazer ou como agir diante todas essas circunstâncias. Por que isso a está afetando tanto? Nos vemos todos os dias, mas ela está distante, confesso que sinto saudades.

Pego a garrafa de vinho e viro o resto que ainda tinha na minha boca. Dois longos goles que descem rasgando pela minha garganta. Poliana está na casa de João fazendo trabalho da escola, e Luísa está na padaria. Estou sozinho, como a muito tempo eu não estive, o silêncio perdura nessa mansão e me sufoca, a solidão dilacera o meu peito. Preciso urgentemente conversar com Luísa e resolvermos como vai ficar essa situação, chega de esperar o tempo.

Saio do laboratório e vou até o quarto dela e de Poliana, vejo Bob deitado em uma das poltronas e vou até ele. Assim que me vê ele ergue a cabeça e balança o rabo, um gesto carinhoso do meu amigão, gosto da lealdade dos cachorros, não importa o que aconteça, eles sempre vão permanecer amando o dono. E ultimamente, é ele que me ouve todas as noites, ele quem aguenta todas as minhas chuvas de palavras.

Você deve estar cansado de me ouvir não é Bob? – interrogo mechendo em algumas decorações em cima da cômoda. – Você também acha que eu preciso conversar logo com Luísa e resolver isso? – Bob late em resposta. – Suponho que isso seja um sim. – dou uma risadinha fraca.

Ando pelo quarto, observando tudo, isso está me matando por dentro, em cada passo que eu dou sou invadido por imagens dela na minha cabeça. Vejo a ponta de um tecido azul pra fora do guarda-roupa e vou até ele, já imaginando do que se trata, abro o armário e lá está ele, o vestido que a dei, ela estava tão linda nele, e tudo acabou em uma noite catastrófica. Estou me sentindo um idiota. Foram duas semanas, duas longas semanas nas quais nós mal conversamos.

Idiota! Idiota! Idiota!

Bato minha cabeça com força no guarda-roupa com raiva de mim mesmo e ouço um barulho. Ergo a cabeça e vejo algo caído lá no fundo logo atrás de algumas roupas, parecia algum quadro. Que estranho, Luísa não guarda os seus quadros assim. Resolvo pegá-lo para olhar, era um quadro que eu nunca tinha visto, é uma obra incrivelmente linda, porque Luísa a escondeu aqui? A pintura parece apenas uma paisagem de inverno a noite, porém se observarmos mais de perto, a árvore no centro aparenta estar chorando, é uma árvore grande e linda, mas os detalhes dela são fascinantes, enquanto insetos em seus galhos buscam escapar das pequenas teias de aranha, outros estão mortos sob os seus galhos tortos. A árvore parece estar ferida, e uma chuva de sangue se faz presente, deixando apenas uns rastros brancos da neve ainda brancos embaixo da árvore. Suspiro profundamente, apreciando a obra, isso está perfeito, cada detalhe, uma pintura incrivelmente mórbida, mas com a sua devida beleza.

Doce Luísa | LuottoOnde histórias criam vida. Descubra agora