35 - Sussurros da meia noite

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     Por mais uma noite eu estava sentada na mesa, frente a frente com o homem mais desprezivel do mundo, como se estar dia e noite nesta maldita casa já não fosse tortura o bastante. Comia vagarosamente, com talheres de plástico, uma carne com batatas, que sinceramente, não sentia gosto nenhum. Olhando agora, achei engraçado pensar que de certa forma Gong Yoo se sentia ameaçado com minha presença a ponto de me tirar os talheres de prata.

Ou era mais uma de suas formas de mostrar que estava acima de mim.

O encarei por um momento, imaginando como adoraria realmente enfiar uma faca naquele homem e vê-lo sangrar até a morte, lentamente. Adoraria torturá-lo, arrancar suas unhas da mesma forma que Levi Ackerman fez com os inimigos da Divisão de Reconhecimento. Da mesma forma que Jungkook talvez fizesse.

Me permiti rir com a situação. Acho que finalmente o instinto assassino de Jungkook havia tomado conta de mim.

— Como foi seu dia? Conseguiu visitar novos locais da casa? — perguntou Gong Yoo me dando o desprazer de ter que encará-lo mais uma vez naquela noite. - Acho que com o tempo você se acostuma.

Com o tempo?

Era ridículo pensar que eu teria que passar muito mais tempo nesta casa imunda com ele. Saber que Gong Yoo era de fato pai de Jungkook me fazia acreditar que nada daquilo era real, que na verdade estava vivendo uma versão da história de Coraline no mundo sombrio. E não duvidaria se Hyunjin um dia quisesse costurar botões nos meus olhos.

Talvez assim fosse uma alternativa válida para evitar olhar aquelas caras feias.

— Não quer conversar? — perguntou ele cinicamente.

— Por que eu iria querer uma coisa dessas? — perguntei.

— Acho que o jantar é um bom momento para conversas.

— Só pode estar brincando — revidei.

— Se vai estragar o jantar devia ter ficado no seu quarto.

— Sei que é pai do Jungkook – revelei, mas ele sequer demonstrou alguma emoção humana.

Ele limpou a boca e colocou o lenço na mesa, fazendo cada movimento minuciosamente. Como se propositalmente, sua lentidão fosse só para aumentar ainda mais minha impaciência.

— Qual o sentido disso? — insisti soltando os talheres de plástico sobre a mesa. — Você me tortura, alimenta e me deixa passear pela casa como se eu fosse seu bichinho de estimação. Enquanto mantém Jungkook sei lá onde. Seu filho, por sinal.

Gong Yoo me fitou seriamente, analisando meu rosto, minha expressão e tendo a certeza de que apenas com seu olhar frio era capaz de me congelar de medo.

— Faz três semanas que está aqui e não tentou fugir nem uma vez – analisou ele. — Por que meus homens não relataram uma ocorrência sequer, Jieun?

Aquela frase me pegou de surpresa, parecia ter sido atropelada por um trem e ficado apenas os pedaços nos trilhos. Com toda certeza pareceria melhor do que estava após ouvir aquela frase.

Eu não havia tentado fugir nenhuma vez desde que cheguei. Por que?

Porque sofrer, ser torturada trancafiada em uma casa sozinha não me fez tentar fugir nem uma única vez?

Por noites bolei planos, imaginei minha fuga, sabia até mesmo o que dizer a Gong Yoo após tantos ensaios de possíveis conversas em minha mente. Planejei minuciosamente meus passos, meus diálogos, mas era incapaz de fazê-lo.

Poderia ser pelo fato de Jungkook ainda estar aqui tão sozinho quanto eu. Por minha família estar em risco iminente. Por meus novos amigos ainda mais amedrontados que eu. Sim, obviamente tinha a ver com todos eles, mas ainda mais com o simples fato de não me achar digna de voltar para os braços daqueles que amava.

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