Capítulo 3

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Apenas na manhã seguinte, Lia podia ficar calma. Havia passado a noite em claro com medo que o ocorrido se repetisse. Levantou-se fraca, sonolenta e faminta. Se arrumou para sair, tomou um banho gelado para despertar e em decorrência do seu péssimo estado foi até a cozinha pegar um copo de água.

Charlotte Paulsen já desfrutava o desjejum quando sua filha adentra a cozinha, ainda hesitante, sem ao menos comprimentar, ela revela.

- Marquei terapia para você.

- O que? Mãe, isso é ridículo! - ela largou seu copo e se virou em direção a mais velha.

- É para o seu próprio bem. - suspirou, tomando mais um longo gole de café.

- Eu não vou.

- Vai te ajudar.

- Obrigada mãe, eu te amo. Você é muito atenciosa. Mas eu não preciso de ajuda. - admitiu pausadamente.

- Você não precisa ou não quer?

- Ah, por favor! Isso é por causa de ontem?

- Não só isso, você se tornou uma pessoa amarga desde o Alex morreu.

A expressão de Lia mudou drasticamente, ela com certeza não queria um sermão logo de manhã. Sua cabeça já estava cheia de mais, muitos pensamentos de uma só vez.

- Meu irmão não tem nada a ver com isso.

- Todos nós ficamos abalados e talvez você precise desabafar. - a voz doce quase fez piedade a Lia, mas ela já conhecia os truques persuasivos de Charlotte bem de mais para cair neles.

- Eu não preciso que um estranho me ouça falar sobre meu irmão morto.

Aquelas palavras, todas ditas em voz alta tornava tudo tão real, mais doloroso. Ela só queria esquecer que aquilo havia acontecido, pelo menos por um tempo, até se recuperar por completo do luto.

- Mas será bom para você...

- Por favor, me diz que o pai não concordou com essa ideia ridícula. - resmungou, massageando as têmporas do rosto.

- A ideia foi dele.

- Não. - resmungou ela, jogando a cabeça para trás.

- Meu anjo, ele se preocupa com você. Nós estávamos conversando ontem e essa é nossa decisão.

Charlotte aproximou-se de sua filha para dar um abraço, como sinal de consolo. A última coisa que Lia precisava era da piedade de alguém, isso só fazia com que ela se sentisse pior. Com raiva, desviou-se da mãe e foi em direção a porta.

- Eu não quero mais ouviu, to indo para a escola.

- Vai com Deus, filha.

- Amém.

Um alívio imediato a tomou logo que fechou a porta, ela pegou sua bike encostada no quintal e atravessou o portão. Ainda segurando a bike resolveu olhar suas mensagens, notando que um número desconhecido tinha mandado mensagem ás 04:21 da manhã.

"Não é assim que segura uma faca, doutora."

- É ele, aquele desgraçado! Mãe, mãe! - ela voltou correndo para dentro da casa com seu celular nas mãos. - Eu disse que não estava louca.

- O que aconteceu?

- Olha essa mensagem.

- Não tem nada. - a senhora Paulsen deu de ombros, confusa.

- Ele apagou!

Lia suspirou, frustrada. Não tinha nenhuma prova de quem ele era, o que ele fez ou que ele se quer existia. Isso soava assustador.

- Você vai se atrasar.

- Por favor, você precisa acreditar em mim. - suplicou, gesticulando a aprovação dela.

- Conversamos mais tarde, você vai se atrasar.

Charlotte encontrava-se impaciente, provavelmente sua filha estava em um grande estado de stress pós-traumático. O que mais a preocupava era que Lia não reconhecia sua falta de lucidez.

- Tudo bem então. - bufou, saindo à passos largos e com os braços balançando pendente ao corpo.

- Não quer comer nada antes de ir?

- Eu já comi.

Ela permaneceu imóvel, gélida por conta da pergunta. Agradeceu a si mesma por ter andando uma distância consideravelmente grande, e que naquele instante sua mãe não conseguisse ver a mentira estampada em teu semblante.

- Eu ouvi você vomitando ontem, teve outra crise?

- Não, foi só mal-estar.

As palavras quase não saíram de sua boca. Ela pegou sua bicicleta e correu, encolhida e com seu rosto contorcido pela vergonha.

- Droga, droga, droga!

...

Debruçada sobre a carteira, Lia sentiu uma mão deslizando suavemente pelo seu ombro, com a intenção de desperta-lá.

- Eu estou acordada! - balbuciou. Enquanto tirava os cabelos do rosto sua visão se tornou constante novamente, ela ainda tentava decifrar o dono do toque.

- Amália, você dormiu na minha aula. Está tudo bem?

- Tudo... Sim, é claro! - precipitou se. - Porque não estaria?

- Não é a primeira vez que isso acontece. Suas notas estão baixas, o que está acontecendo?

Enquanto sua alma decididamente se estabilizava em seu corpo, ela tentava entender o motivo se sua professora puxar uma cadeira ao seu lado, tão atenciosa. Quando repassou seu olhar pela sala vazia percebe que estava na hora de ir.

- A aula já acabou!? - espantou se, tentando puxar em sua memória exatamente o momento que havia dormido.

- Acabou. A senhorita dormiu a minha aula inteira.

- Ah, eu sinto muito.

- Eu que sinto por você, estávamos revisando o conteúdo da prova de amanhã.

- Merda.

- Acho bom você estudar, se não passar na prova irá reprovar na minha matéria.

- Eu vou estudar, eu vou me esforçar, eu prometo.

- Acredito em você e em seu potencial.

Lia jogou os cadernos dentro da mochila apressadamente, concordando com o que seja lá que sua professora dizia. Saiu correndo da sala, mas não quis parecer rude.

- Obrigada, tchau Sra. Kinsey.

- Tchau Amália.

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