Capítulo 5

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No instante que provou a si mesmo que a sensação de estar sendo observada não era só uma sensação, Lia ficou mais tranquila. Isso porque ela prefiria estar sob ameaça, antes de mãos dadas com a morte do que maluca.

O último caso de maluquice na sua família acabou em suicídio. Ser morta parece mais digno do que tirar a própria vida, pelo menos para a vítima. Essa era uma linha de raciocínio que só estava ao dispor dela, parece que a primeira sessão de terapia já havia lhe dado alguns resultados. Infelizmente nenhum deles era aceito em sociedade como algo ético.

Agora estava tarde, um pouco mais que o habitual. As estrelas se encontravam presentes no céu enquanto o sol se perdia no horizonte. Lia passou a não temer mais pela própria vida. Afinal, o que de mais poderia acontecer em uma cidade tão pequena?

Pedalar por ai, sem saber com quem estava lidando era um ato de pura vergonha, ou no caso a falta dela. Quando finalmente avistou quem procurava parou, descida a tirar satisfações.

Novamente ela olhou ao redor, ninguém estava ali. Era ingenuidade pensar que poderia sair ganhando nessa batalha sozinha, sem testemunhas, sem proteção.

- O que você quer? Porque está me seguindo? E porque disse que eu não sabia segurar uma faca? - disparou suas perguntas, assustada assim que o viu.

- Não iria matar ninguém daquele jeito. - concluiu, se aproximando com pequenos passos.

- A intenção não era matar.

- Você é estranha.

A afirmação, lançada de forma seca e nua ao ar incomodou-lha. Ninguém fora tão sincero em relação a ela de forma tão vazia. Estranho tem vários significados, mas vindo de Lucian com certeza era um insulto.

- Eu? Porque?

- Como você usa uma faca como instrumento de defesa se não tem intenção de matar? - ele parecia incrédulo, mais do que precisaria.

- O que você quer? - tornou a questiona-lo.

- Uma amiga.

- Você não sabe fazer amigos.

- Desculpa.

- Desculpa? Você entra na frente da minha bicicleta, finge ter torcido o tornozelo, porque por algum motivo você sabia que eu andava com o kit na minha mochila. Invade minha casa, e espera que eu aceite suas desculpas?

- Você aceita?

Lucian estava sério, ele queria mesmo ser desculpado por isso. Como se tivesse pisado em seu pé, ou derrubado suas coisas. Sua visão de algo que poderia ser esquecido com um simples desculpa se distorceu em seu minúsculo cérebro.

- Se eu nunca mais precisar olhar para a tua cara. - empinou o nariz, cruzando os braços.

- Então não precisa.

- O que você quer dizer?

- Me encontre na praça perto da escola depois da aula.

- Não!

Lia desacreditou no que acabará de ouvir, Lucian teve a audácia de recusar as condições de nunca mais ve-la. Isso a deixou intrigada entretanto, lisonjeada.

- Estarei lá.

- E o que te faz pensar que eu vou estar?

- Você é curiosa e não tem medo da morte.

Diferente de antes, isso pareceu um elogio. Estranha, curiosa e possivelmente suicida. Era isso que ele pensava dela? Ela não sabia ao certo e nem se importava. Contextos muitos complexos diziam para ela se afastar dele o mais rápido possível mas não iria acontecer tão cedo.

- Você vai me matar? - engoliu em seco, dando alguns passos para trás.

- Talvez eu mate. - Lucian franziu o cenho. Era possível que ele apreciasse ideia.

- Eu vou chamar a polícia.

- E alegar o que, exatamente?

- Que tem um cara estranho me perseguindo.

Isso soou quase como uma pergunta, sua voz fraquejava a cada passo que Lucian dava em sua direção. A presença dele era intimidadora. Ele era mais alto, mais forte e mais velho que ela, o que certamente eram motivos suficientes para ser uma presa fácil.

- Com que provas? - inquiriu, quase a ridicularizando.

- Essa aqui.

Seu coração quase para quando ela procura o celular no bolso, percebendo que havia perdido. Devia ter deixado cair logo após ligar o gravador, na esperança de arrancar algo de Lucian.

- Não, você não perdeu. - ele balança o aparelho em sua mão, proximo ao rosto dela. - Tenha cuidado da próxima vez. Alguém pode roubar.

Com raiva, Lia arranca abruptamente seu celular da mão dele, lhe dando as costas e saindo as pressas. No caminho até sua bicicleta ela declara.

- Você não me conhece, não sabe do que sou capaz.

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