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— O quê? — Perguntei, piscando os olhos algumas vezes, como se tentasse voltar á realidade do meu problema.

Eu estava algemado, minhas forças eram sugadas a cada segundo, meu estômago roncava tão alto quanto o rugido de um leão e tinha aquela... garota me enchendo de perguntas. Como ela conseguia não ter absolutamente nenhuma expressão? Nenhuma sombra sequer de algum sentimento, algum sinal de que ela sentisse algo além... de indiferença por mim.

— Eu perguntei por que você matou Sarah Klaus? Qual foi sua motivação? — A garota tomou outro dos cookies entre o indicador e o polegar e o abocanhou como se estivessem deliciosos. Bom, o cheiro era realmente muito bom.

— Eu não matei- quer dizer matei... mas não foi exatamente isso o que aconteceu. Não é fácil explicar. — Eu disse sem pensar. O que estava acontecendo com minha mente? Aquelas algemas estavam realmente acabando comigo.

Aos poucos minha visão começava a ficar turva, meu corpo parecia pesado demais. A pouca água que eu havia tomado havia sido o suficiente apenas para eu conseguir falar, mas ainda estava com sede.

Ela mordeu novamente o doce, a cada segundo que ela me encarava com os olhos púrpuras eu sentia como se estivesse sendo apunhalado por uma estaca de gelo do submundo. Ao menos era essa a sensação de estar frente a frente com aquela mulher, era como se tudo fosse frio, gelo, morte... Como se a felicidade se esvaísse e sobrasse apenas o frio da solidão.

Mas havia curiosidade em meio àquele tom de violeta nebuloso de seus olhos. Ela não estava ali apenas para me interrogar, ela queria entender, ela queria ouvir uma boa história.

— Prossiga. — Ela disse calmamente, tão doce quanto o sussurro de um espectro poderia ser.

Eu respirei o mais fundo que meus pulmões me permitiam - o que não era o suficiente - e umedeci os lábios.

— Pode... tirar uma.. das algemas? — Supliquei. O mundo parecia lentamente perder as cores, tons de cinza se amarravam ao suéter da garota à minha frente, à sua pele. Mas seus olhos... nada parecia ousar combater suas cores mortais.

Ela se conteve por um momento, analisando meu estado patético enquanto lambia, sem pressa, os farelos que sobraram dos cookies de chocolate presos às pontas de seus dedos finos.

— Vai tentar me matar se eu tirar uma delas? — Ela perguntou sem olhar para mim, e, sem as cores de seus olhos, tudo finalmente pareceu cinza, sem vida e sem sentido. Eu mal consegui abrir a boca, apenas balancei a cabeça em negação.

Ela mordeu o lábio pensativa, abaixando o olhar para a mesa. Pude jurar que ela conseguia ver minhas algemas através daquela madeira, mas com certeza era só minha imaginação. Ela então se levantou e caminhou sem pressa até a porta, foi quando pude ver mais de meu carrasco de um metro e sessenta: Seu corpo era pequeno, magro, frágil como porcelana, delicado como uma boneca. Vista de longe ela era apenas aquela mesma garotinha das fotografias do chalé da forja em Roseville; Ela pôs o rosto para fora do cômodo e falou com alguém. Um homem de quase dois metros de altura - um armário em todos os sentidos - de cabelos castanhos, armadura dourada reluzente e diversas cicatrizes no rosto entrou na sala, se aproximou com uma expressão ameaçadora, ergueu uma das mãos grandes em minha direção e desfez uma das algemas de meus pés.

Meu pulmão pareceu ser liberto de baixo de uma pilha de pedregulhos. O mundo ganhou cor novamente e eu pude enfim me manter ereto na cadeira, estava ofegante e até mesmo eufórico após isso, mesmo com outras três algemas presas ao meu corpo.

O guerreiro levantou o polegar para mim discretamente, desfazendo a expressão ameaçadora em um sorriso largo e foi embora logo em seguida, ele havia sido... legal? Acenei com a cabeça para ele em agradecimento antes que ele deixasse o cômodo e a garota de olhos violetas voltasse à cadeira.

A Rosa de SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora