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Eu mal dormi á noite temendo que algo nos atacasse durante a madrugada.

Confio nos soldados, mas algo sempre me deixa em estado de alerta... e eu estou cansado. Manter a magia de vários itens da base da Ordem ao mesmo tempo suga minha energia mais do que eu gostaria de admitir. Camas, cobertores e outros itens necessários para a vivência de todos. Por mais que venham do Createnomicon eles continuam a drenar minhas forças a cada segundo, por isso estou sempre cansado.

Porém não posso deixar transparecer. Essas pessoas precisam de um líder confiante, forte e determinado. Se soubessem mesmo que por um segundo meu estado físico, talvez eles recuassem ou não se sentissem tão preparados para a batalha. Afinal porque lutar se meu líder não consegue nem se levantar da cama sem ter crises de tontura?

Mas eu me levantei como todos os dias. O sobretudo branco já não me seria útil aqui então o deixei dobrado em cima do criado mudo de madeira escura. As mulheres da Ordem costuraram um dos macacões pretos para mim, cheio de bolsos para que eu não me perdesse na hora de separar os papéis. No braço direito armas, no esquerdo utilitários, na perna esquerda... eu já nem me lembro mais. Que dia é hoje? Por que tudo parece tão escuro? Já era pra ser de manhã... o Sol invadia minha janela, mas... está tudo ficando preto lentamente. Eu não consigo... Vidya.

Talvez se eu recolher os itens do castelo eu consiga descansar um pouco.

Concentrei o pouco que restava de minha consciência para desfazer todos os itens que drenavam minha energia dia após dia e...

Deuses, como é bom poder respirar de novo, o peso que caminhava junto comigo havia desaparecido. Ergui meu corpo com a rajada instantânea de energia que me atingiu, me deixando levemente ofegante e eufórico. Passei as mãos por meus cabelos e suspirei com força, balançando a cabeça para manter a lucidez.

— Não é hora de desmaiar, Lukas. — Disse para mim mesmo. — Hoje é o grande dia.

Após alguns minutos desenhando e recortando partes das folhas do Createnomicon como fazia todos os dias, eu guardei os papéis em seus respectivos bolsos e enfim saí de meu quarto.

A ala oeste estava estranhamente vazia. Àquela hora da manhã já deviam ter pessoas caminhando pelos corredores ou conversando pelo salão abaixo, mas o silêncio se instaurava por todo o lugar, o suficiente para eu ouvir o eco de meus passos conforme eu seguia em direção ao refeitório.

Quando cheguei lá, me surpreendi. Estava vazio. Apenas um prato com ovos, pães e frutas e uma jarra de suco de laranja ao lado me aguardava. Crendo que aquele café da manhã fora preparado para mim eu me alimentei e segui para o lado de fora. Ao abrir os portões de aço fui recebido pela luz do Sol diretamente sobre meus olhos, que demoraram a se acostumar.

Após algumas piscadelas para ajustar a visão à luz eu pude ver algo que derreteu meu coração e quase me fez desabar em lágrimas.

Fileiras e fileiras de soldados com o uniforme da Ordem de frente para os portões, me aguardando. Em frente de cada grupo de fileiras havia um capitão batendo continência para mim. O que era aquilo? Todos acordaram antes do Sol nascer?

Alycia se aproximou de mim, bateu continência – o que nunca havia acontecido – e pôs as mãos para trás do corpo, como se fosse um soldado condecorado.

— O que está acontecendo Aly? — Perguntei, começando a ficar tímido com toda aquela formalidade que nunca tivemos dentro da Rosa de Sangue.

— Estão esperando o líder deles. Acordamos antes do Sol nascer e deixamos tudo preparado para ir até o castelo. Levann concordou em ser algemado, as armas estão prontas, águias armaduradas e seladas prontas para voo. Ás suas ordens, capitão. — Eu nunca ouvira Alycia falar de forma tão determinada e confiante em toda minha vida. Nem mesmo quando ela tinha certeza de algo. Será que estava tentando esconder o nervosismo da batalha? Quer dizer, mais do que o habitual?

Pus a mão sobre os cabelos finos de minha irmã e os baguncei em um gesto de carinho. Ela respirou fundo e se pôs a ajeitá-los enquanto saía da minha frente para que eu fosse até os outros membros da Ordem. Minhas mãos suavam, mas eu estava ereto, sorridente e confiante. Orgulhoso de todo o caminho que trilhamos até aqui. Naquele momento eu soube que, independentemente do resultado, podíamos sair orgulhosos de todo o esforço dedicado.

Sempre fui bom em discursos, mas ao olhar aqueles olhares sérios, determinados e carregados de coragem eu percebi que não precisariam de mais incentivo. Apenas uma única palavra. Não como uma ordem, mas como um convite:

— Vamos.

E assim montamos em nossas águias e partimos em direção ao castelo Klaus.

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