Eu tinha o costume de observar o relógio frequentemente enquanto estava em casa no final de semana. Minha mãe fazia questão de preparar alguma atividade pedagógica para mim. Uma vez, ela comprou um livro que estimulava a coordenação motora (um livro que fazia as crianças contornarem desenhos ou traçarem algumas linhas em aviões e carrinhos). Fora isso, ela me dava muitas atividades da escola para fazer, aperfeiçoava minha leitura e escrita, me corrigindo o tempo todo. Ela tinha medo que eu passasse mais de dez minutos em silencio longe de seu campo de visão. Meu pai era um cara que trabalhava como pedreiro e minha mãe era uma costureira. Meu pai constantemente pedia dinheiro para um agiota maldoso que tinha má fama de ser perigoso. Ele fazia isso para pagar algumas contas da minha escola e pagar os remédios da minha mãe, que não conseguia dormir e tinha que tomar remédios com doses altas. Um dia, quando eu, minha mãe e meu pai estavamos na nossa moto prestes a chegar na casa da minha avó materna, o agiota nos parou com alguns motoqueiros bloqueando a rua. O meu pai rapidamente desligou a moto e desceu dela junto de minha mãe e eu. O agiota apontava uma arma para meu pai enquanto perguntava "cadê o dinheiro, filho da puta?". É claro que meu pai não tinha dinheiro nenhum, então obviamente ele e minha mãe levaram um tiro. Me joguei no chão de joelhos, fazendo com que meus joelhos se ferissem e sangrassem, tentando "acordar" meu pai que estava no chão em meio a uma poça de sangue. Não foi apenas um tiro, e sim 10. Na minha mãe, foi apenas 3 tiros. O agiota me poupou da morte (algo que eu não gostaria que tivesse feito) e foi embora dentro de um carro junto de seus companheiros malignos. Minha mãe havia falecido com os olhos abertos olhando para mim, e isso me incomodou tanto ao ponto de fazer eu me levantar e fechar seus olhos. Dei um beijo na sua testa e deitei minha cabeça no seu ombro. Em nenhum momento parei de chorar, mesmo que meus olhos estivessem ardendo e eu estivesse suando frio. Tive uma crise de ansiedade onde eu tremi e me automutilei com mordidas pelo corpo para descontar minha raiva do agiota.
***
Eu havia ido morar com a minha avó, afinal, eu só tinha ela agora. Ela me tratava muito mal; não me alimentava bem, sempre me batia e me xingava desnecessariamente. Pouco tempo depois, o meu avô começou a ficar em casa por causa da aposentadoria. Eu me sentia extremamente desconfortavel com ele, porque ele sempre me incentivava a sentar no colo dele e ele me acariciava de um jeito horrivel. Cansado de viver desse jeito, denunciei para uma delegada que tratava desses assuntos com crianças. Contudo, finalmente fui para o orfanato, que não é um bom lugar, mas pelo menos não faz as crianças morrerem de fome. Com sorte, arranjei pais incriveis, que sempre me levam para a terapia e que compram PC gamers carissimos. É claro que, para alguém traumatizado, isso não era o bastante. Eu ainda tinha todas aquelas imagens horriveis de assassinato, mals tratos e pedofilia na minha mente. Eu tentei morrer diversas vezes, de formas horriveis que prefiro nem citar. Por uma puta sorte, minha mãe sempre me encontrava e desfazia aquelas ferramentas asquerosas que eu usava, logo me dando um abraço e dizendo com uma voz suave "está tudo bem." Meu pai também era legal, mas ele traía muito a minha mãe, e isso me desanimava um pouco. Fora que ele ficava muito tempo longe de casa para se encontrar com amantes. Pelo menos ele tentava conversar comigo e sempre me levava para a terapeuta.
flashback off.
Atualmente, estou jogando no PC observando cada movimento que meus personagens fazem, apertando as teclas cada vez com mais força e precisão. Monique estava indo até o meu lado, logo pondo a mão no meu ombro. Não me importei, pois não era a primeira vez que ela ficava carente me pedindo carinho quando eu estava ocupado. Eu me sentia em um poço de raiva quando estava jogando e ela ficava me atrapalhando, mas sempre disfarçava dizendo "espera um minuto, por favor." Isso não fazia ela ficar nada bem, e dava para ver que ela ficava cada vez mais impaciente. E por isso, decidi usar uma tática diferente: decidi que iria convidar ela para jogar comigo. Entretanto, meu plano foi por água a baixo quando ela disse:
- Amor, temos que conversar.
- Oh, tenho uma surpresa para você, mas se quiser, pode falar você primeiro. - eu disse ainda prestando atenção na tela do computador. Era tudo que eu queria: minha mulher jogando comigo, fazendo algo que eu gosto e se divertindo comigo.
- Thomas, as vezes eu me pego pensando... Espera, será que você poderia tirar a vista da porra do computador por uns 15 minutos?- ela aumentou o tom de voz na última frase.
- O que foi agora, Monique? - suspirei fundo antes de girar minha cadeira para frente de Monique e olhar diretamente nos seus olhos.
- Eu acho que quero... Eu só... Bom, eu quero algo.
- o que você quer? - me desesperei, mas não iria demonstrar para ela isso. Era vergonhoso para mim. Eu fechei minha mão com tanta força que ela ficou trêmula, então escondi ela dentro do bolso da minha bermuda. Eu não queria perder Monique, mas era isso que provavelmente iria acontecer. Eu gostava dela, mas era dificil para mim demonstrar isso depois de tudo que eu passei. Eu logo deduzi que provavelmente ela iria pedir um tempo no relacionamento, mas mesmo assim, preferi que ela me falasse isso da sua boca.
- Thomas, eu quero um tempo. - a voz dela ja estava pesada, como se sentisse o proprio peso das palavras que disse. Ela tentava conter as lágrimas, mas seus lábios trêmulos e sua respiração ofegante lhe entregava. Fechei meus olhos por um tempo para processar esse momento. Não conseguia pensar em mais nada, não sabia o que dizer, não sabia como se comportar diante isso. Eu apenas fiquei com dificuldade de respirar e joguei minha cabeça para trás. A mesma repousou em uma pequena almofada fofa da cadeira enquanto meus olhos se fechavam e eu soltava um suspiro pesado. Monique permanecia ao meu lado, a unica diferença é que ela tirou a mão do meu ombro e começou a segurar sua mão na sua outra mão. Ansiou por uma resposta da minha parte, mas fiquei mantendo isso em um silencio constrangedor por alguns segundos antes de finalmente falar algo, mas ainda sem abrir os olhos e mantendo a cabeça na almofada.
- É isso?
- como assim "é isso"?
- eu quero explicações, Monique.
- Porque você não me ama.
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Sem rumo.
RandomNesse livro, teremos a história de alguns adolescentes enfrentando seus problemas que os adultos sempre vêem como "bobagem".