#34. Anomalia

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Na poltrona ao lado da cama de hospital, Arthur luta contra o sono e o cansaço. Quer se manter acordado como tem feito há uma semana, com pequenos intervalos de cochilo de exaustão, sem se alimentar direito, sem sair daquele quarto para cumprir suas funções como rei.

Vulko assumiu Atlantis durante esse tempo, administrando o verdadeiro caos que se instalou desde os ataques no fatídico dia do casamento real. Atlantis está sitiada, a população das periferias tem realizado saques frequentes às áreas nobres. Nos primeiros dias, depois da explosão da Fortaleza e do Palácio, não havia força militar o bastante para conter o crime. Cerca de mil e quinhentos soldados morreram naquele dia na Fortaleza. Poseidonis viveu uma verdadeira anarquia. Depois, Nereus enviou parte de seus soldados para ajudar a reestabelecer a ordem.

Corum Rath e uma coluna de rebeldes se autointilaram a nova regência de Atlantis. Num trono simples, de madeira, cercado de outras cinco lideranças do grupo rebelde da Nona, Rath angaria cada dia mais seguidores nas periferias para sua campanha contra a monarquia e contra Arthur. O Conselho e a nobreza não deram muita atenção, acham irrelevante, mas o movimento cresce como uma erva daninha nas profundezas de Poseidonis. Rath está seguindo os planos da N.E.M.O. que lhe prometeram o trono.

A estada de Ragnar na Nona ficou insustentável. Hyde levou ao Conselho o pedido para reitegrá-lo ao exército graças às ameaças sofridas e a falta de contingêntia, ao que aprovaram sem pestanejar. Qualquer soldado, agora, é indispensável.

Com a ausência do rei na tomada de decisões, o Conselho restabeleceu Vulko como vizir. Quanto mais ausente o rei fica, mais poder e respeito da população ele perde, pois um chefe de Estado tem que se mostrar solidário em um momento de crise, demonstrar força e poder político. Mas Arthur está devastado. Não consegue sair do lado de Mera e de seu filho cujas vidas estão por um fio.

Doutora Thnita entra no quarto para avaliar o estado de Mera e do bebê. Arthur se levanta, de súbito.

- E então, como elas estão, doutora?

A médica avalia pela tela de controle os batimentos cardíacos, oxigenação e pressão de Mera que está em coma já há uma semana. Prepara o material para um novo ultrassom.

- Mera deu muita sorte. A lâmina não perfurou o útero, a placenta ficou intacta, mas recebeu um pouco da hemorragia. Se não tivéssemos contido essa hemorragia tão rápido, enfim...

- E eu sou eternamente grato, doutora. 

- Vamos ver como está o bebê. 

Arthur observa atentamente, mesmo sem conseguir entender muita coisa das imagens na tela. Sente um alívio enorme ao ouvir as batidas do coração do bebê.

- A bolha de sangue não estorou nem aumentou, mas está pressionando a placenta. 

- O que isso significa, doutora? - Arthur esboça tremenda preocupação em suas feições. 

- Significa que o parto pode acontecer antes da hora. Se Mera continuar em coma, vamos esperar completar os 7 meses e faremos uma cesariana. 

- E qual o risco dela não acordar... não acordar mais? 

- A equipe médica está otimista. Mera perdeu muito sangue, mas é forte como uma rocha. O prognóstico não é ruim, Arthur. Mas também devemos nos preparar para o pior. De qualquer forma, faremos de tudo para tirar esse bebê dali à salvo. 

Arthur coloca os dedos sobre os olhos, disfarçando o choro. Foi uma semana pavorosa. O caos reinando em Atlantis, Mera recebendo transfusão de sangue, sinais vitais instáveis. A qualquer momento, o rei e super-herói poderia perder sua família de uma só vez, incapaz de salvá-los, de fazer qualquer coisa para impedir o pior. Tantas vezes ele segurou a mão de Mera e pediu perdão por não tê-la protegido. Por ter se dessentendido com ela no casamento. Por ser o culpado do ódio de Arraia que a atingiu. Se não tivesse feito a escolha errada de deixar o pai de David Kane morrer naquele submarino, nada disso teria acontecido. "Você matou meu pai, eu matei seu filho". A frase do seu arquinimigo ressoava insistentemente em sua cabeça. Culpa, remorso, sensação de incapacidade, medo, vingança. Queria voltar no tempo. Todos esse sentimentos o paralisavam ali naquela poltrona se postando alheio ao trono, ao povo atlante, e ao que quer que viesse por aquela porta. Aquele quarto era seu mundo e só ele importaria ser salvo. Essa talvez não fosse a postura correta de um herói e certamente não era de um rei. Mas Arthur não tinha forças para cuidar de mais nada a não ser estar ao lado de Mera na esperança de que ela acordasse a qualquer momento. 

Heart of the Ocean - 𝐀𝐐𝐔𝐀𝐌𝐀𝐍 & 𝐌𝐄𝐑𝐀Onde histórias criam vida. Descubra agora