Capítulo 13

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Manon agarrou a sela de Abraxos com força para não ser jogada para fora pelo vento. Um trovão sacudiu o ar em algum lugar atrás deles, no meio das tempestades de neve que encontraram no desfiladeiro Ferian e pioraram conforme voavam para o norte. O frio cortante atravessou as roupas da bruxa fazendo com que ela o sentisse até os ossos. Só mais um pouco.

Quanto mais cedo chegassem menos correriam riscos, aquele voo era qualquer coisa, menos seguro. Ainda assim, ela percebia a hesitação de Abraxos quando acelerava, e que a velocidade não era constante. Ele queria chegar a Orynth tanto quanto ela. 

A serpente alada olhou para trás, os olhos determinados, mas solitários, procurando o conforto que os dois só encontravam um no outro. Arriscando perder o equilíbrio para o vento, a rainha se inclinou, mantendo uma mão firme na sela para passar a outra pela lateral de sua montaria. O couro estava tão gelado que atravessou a dormência nas pontas de seus dedos.

Depois de mais uma hora desaparecer, quando ela começou a pensar em mandá-lo descer e esperar até amanhecer, pequenos pontos de luz começaram a surgir na escuridão.

Conforme os dois se aproximaram, ficaram mais numerosos do que os de qualquer vila ou cidade pelas quais tinham passado. As manchas escuras que cortavam o céu ao longe se tornaram torres de um castelo.

Mas eles não pararam quando se aproximaram o suficiente para Manon identificar a muralha e as casas. Ou quando alcançaram a cidade. O barulho das asas de Abraxos parecia ter sido engolido e carregado para longe, e não houve nenhum alarme quando sobrevoaram Orynth. Ninguém os viu. Ele continuou, até chegar em uma planície completamente branca, sem nada na paisagem além das árvores e montanhas ao longe.

O barulho oco que Abraxos fez quando pousou soou errado no lugar completamente silencioso. Pareceu demais com o som do corpo de Narene se quebrando. O vazio no peito que estava ali toda vez que ela sentia que estava se tornando um fantasma, que deixava Manon tão longe de si mesma e do mundo que a fazia sentir que iria desaparecer, se agitou e deixou o corpo dela. Pela primeira vez em muito tempo a deixou completamente.

A Rainha desmontou da sela devagar, até alcançar o chão e cair de joelhos nele. Não era apenas neve, Manon percebeu, enquanto Abraxos passava a asa em volta dela. Eram flores.

Milhares de flores brancas que de alguma forma tinham sobrevivido ao inverno, e eram tantas que a grama mal era visível por baixo delas. Era lindo, mais do que qualquer coisa que a bruxa pudesse fazer por suas irmãs. Ainda assim não havia nenhum indício de que elas estiveram ali, lutaram ali ou morreram ali. 

Um barulho ensurdecedor preencheu a cabeça da rainha, mas não era o som das batalhas, ou de gritos de morte. Eram as muralhas que ela construíra tão cuidadosamente, todos os malditos dias, desmoronando bem na frente dela. Tudo que ela fizera para não afundar no luto, todos os momentos em que achava que poderia se manter firme. A dor ainda estava lá, crua, exatamente como naquele dia, mais forte do qualquer coisa que ela já tivesse sentido.

Ela não tinha poupado as lágrimas durante os últimos meses, não fazia ideia de quantas vezes tinha chorado. Mas aquelas eram diferentes, queimaram todo o caminho para os olhos e o peito dela conforme caiam, como se tivessem ficado guardadas, apenas esperando que ela parasse de fingir que poderia superar aquilo.

Reconstruir o reino, unir seus povos, não era a parte mais difícil da promessa que Manon não tivera a oportunidade de fazer. Era a primeira parte, a que Asterin dissera em primeiro lugar porque sabia o que a rainha sentiria, sabia exatamente o quanto aquilo iria destruí-la. Viva, Manon. Mas como? Como ficaria feliz sabendo que elas não estavam ali, que nunca veriam Erilea em paz? Ela via o mundo melhor que conquistaram, ele estava nos clãs unidos apesar das brigas, nas duas bruxinhas brincando juntas, na família de Chaol e Yrene, no sorriso de Dorian. Mas aquele mundo não era dela, e ela não estava nele.

𝐌𝐀𝐍𝐎𝐑𝐈𝐀𝐍- 𝐖𝐀𝐑 𝐎𝐅 𝐇𝐄𝐀𝐑𝐓𝐒Onde histórias criam vida. Descubra agora