Chamam-me de Palito

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Tenho 1,82 m, dois centímetros a mais que meu irmão Bosten, que está no segundo ano do ensino médio. Tenho 13 anos, e sou um palito.

Na verdade, meu primeiro nome é Stark. Para mim, isso é pior que ser chamado de Palito.

Era o nome do meu tataravô. Acho que meus pais estavam muito interessados em se ligar às nossas raízes ou algo assim quando decidiram que eu teria esse nome.

Meu tataravô passou sua vida inteira na Irlanda, morreu por lá e nunca me viu na vida. Mas tenho certeza de que ele me chamaria de Palito também, se tivesse me conhecido.

É muito comum que, depois que as pessoas fiquem sabendo do meu nome, elas digam alguma coisa do tipo "Olha, mas que nome diferente".
Isso, para mim, é o mesmo que dizer. "Olha só o pobre garoto deficiente".

Quando eu digo que não gosto de ser chamado de Stark, parece que todo mundo quer dizer algo para consolar.

-Aposto que você vai gostar do seu nome quando crescer.

Acho que as únicas coisas de que as pessoas gostam mais depois que crescem são bebidas e cigarros.

Meus pais fumam o tempo todo.


E eu passo tão despercebido quanto uma lata de milho.

Incomoda-me quando as pessoas me encaram. Na maioria das vezes, elas não têm como evitar, porque eu não tenho a orelha direita.

Além disso, com nomes como os que meu irmão e eu temos, nós deveríamos andar por aí com placas escritas "Olhem para nós". Afinal, pelo menos aqui onde a gente cresceu no estado de Washington, o normal seria que todos os garotos tivessem nomes como "Chip" ou "Robert".

Não Bosten e Stark McClellan.


Não Palito.

O mundo para mim soa diferente de como soa para todas as outras pessoas.

Basicamente o tempo todo, ele soa assim.

Metade da minha cabeça fica em silêncio.

Eu nasci assim.

A maioria das pessoas não percebe isso logo de cara, mas assim que percebem, dá para ver no rosto delas.

Eu fico observando quando elas dão uma olhada do outro lado - o lado cm que falta um pedaço - para ver o que há de errado comigo.

Tudo bem olhem para mim.


Eu sou feio.

Quando você me vê pela primeira vez, eu pareço ser só mais um adolescente, talvez apenas mais alto e mais magro.

Se você chegar de frente, olhando direto nos meus olhos,


provavelmente vai achar que tenho boa aparência, que sou um garoto até simpático, commeus olhos verdes, cabelo castanho, uma expressão tranquila (e isso é por eu não sorrir muito, provavelmente). Mas aí você chega do outro lado e vai notar. Eu tenho algo que parece ocontorno de uma orelha normal, mas ela é espremida contra a cabeça, amassada como se fosse feita de argila. Não tem um buraco, ou o que eles chamam de um "canal".

Nada entra na minha cabeça por ali.

Não consigo disfarçar bem porque meu pai não me deixa ter cabelo comprido.

Ele grita comigo quando eu uso meu gorro dentro de casa. Diz que não tem nada de errado comigo.

Mas eu sou feio.

Você vê o que eu estou fazendo, não vê?

Estou fazendo você me ouvir do jeito que eu ouço o mundo.

Mas não vou fazer isso demais, prometo.

Sei o que isso pode fazer com você.

Sei o que pode acontecer com uma pessoa quando ela não tem um buraco ali.

Seres humanos precisam daquele buraco, para que as coisas possam sair.

As coisas entram na minha cabeça e ficam quicando lá dentro até arrumarem um jeito de sair.

Minha mãe nunca fala sobre minha orelha.

Aliás, ela dificilmente fala comigo.

Acho que ela é triste e horrorizada comigo.

Acho que ela se culpa.

Mais que tudo, acho que ela queria que eu nunca tivesse nascido.

Minha metade silenciosaOnde histórias criam vida. Descubra agora