Califórnia

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Tudo mudou.

Mas, de algum modo, as coisas deram um jeito de se acalmar em casa depois daquele fim de semana.

E Bosten e eu conseguimos evitar o quarto de São Fillan pelos sete dias seguintes, o que representava um longo período de calmaria.

Bosten voltou para a escola e nós visitamos os Buckley de novo no domingo seguinte, como sempre fazíamos.

Só que, dessa vez, deixei Bosten e Paul sumirem sossegados, sem


ficar no pé deles.

Senti-me sozinho com isso.

Mas dava para ver nos olhos de Bosten o quanto ele amava Paul.

Minha mãe fumava cada vez mais.

Meu pai falava cada vez menos.

Eu e ele fingíamos que não nos lembrávamos do que ele tinha feito no quarto, ou preferíamos não acreditar que era verdade.

A noite, com meu ouvido colado no cano, fiquei imaginando formas de matá-lo se ele alguma vez machucasse Bosten de novo.

A partir da última semana de março, Bosten e eu ficaríamos sem aulas por duas semanas, por causa do recesso de Páscoa.

A senhora Lohman cumpriu sua promessa de perguntar se eu poderia dormir na casa de Emily por alguns dias naquela primeira semana,


enquanto Bosten ficou de ir para a casa de Paul.

A ideia de Bosten ficar junto dele me deixou um pouco preocupado com eles poderem se meter em confusão.

Eu comecei a ficar preocupado com tudo.

Bosten foi seguindo o Pontiac.

Voltamos para casa juntos da nossa visita aos Buckley.

Paul e Bosten tinham agido de maneira incomum durante o jantar.

Notei que eles evitaram olhar um


para o outro.

Não houve piadas nem qualquer conversa, exceto a dos adultos, que não pareceram perceber nada fora do comum entre os garotos.

Mas eu notei.

Fiquei observando as mãos de Bosten, como elas apertavam para a frente e para trás o volante do Toyota, enquanto ele mantinha os olhos fixos à frente, mal se movendo, como se estivéssemos sendo rebocados pelo carro de meus pais.

- Tem alguma coisa errada, não tem? - eu perguntei.

- Não precisa se preocupar com isso.

- É com você e o Buck?

-É.

E ele ainda não olhava para mim.

- Sabe, eu gosto do Buck, ainda que ele não converse mais comigo - eu disse. - Espero que fique tudo bem entre você e ele.

Bosten esfregou os olhos.

Eu podia ver minha mãe fumando no carro à nossa frente.

- Você ainda vai ficar na casa dele amanhã, não vai?

Bosten assentiu.

- Eu mal posso esperar para ir pra casa da Emily também.

Queria que ele me perguntasse sobre ela. Queria contar para ele o que tínhamos feito. Eu sabia que agora não teria problema, porque Bosten e eu tínhamos de criar uma espécie de concha em volta de nós dois e as coisas ficariam lá dentro, e assim manteríamos as outras coisas lá fora. Mas ele não perguntou.

Minha metade silenciosaOnde histórias criam vida. Descubra agora