Capítulo III

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O coração de Ludwig falhou as batidas quando ouviu a resposta de Papoila. Os seus olhos negros estavam repletos de confusão, sem entenderem totalmente se deveriam ser crédulos ou incrédulos.

— Como?

Foram as únicas palavras que o músico conseguiu proferir.

— Ouviste bem, caloiro.

Ludwig apoiou a sua mão na superfície fria e áspera da parede, tentando organizar os seus pensamentos que fervilhavam na sua mente.

— Como assim... Estamos dentro de uma caixa de música? — Tentou o máximo não erguer a voz àquela hora da madrugada. — Como isso sequer é possível? Estão a querer-me fazer passar por louco?

— Não, louco já o és, se conseguiste entrar neste lugar.

— Papoila. — O seu irmão repreendeu-a, encarando com um olhar intenso transparente nos seus olhos esmeralda.

— Falei alguma mentira? — Retribuiu o olhar. — De que eu saiba, não.

Lírio pousou a mão na testa e massageou-a, sussurrando para si:

— Eu nem acredito que ela é a mais velha.

— Lírio, eu ouvi isso.

O platinado revirou o olhar e retornou a concentrar-se em Ludwig.

— O que tu sabes ao certo sobre este lugar?

Ludwig expirou fundo, com o seu olhar focado no vazio, passando a ponta dos seus dedos por entre os seus cabelos negros, ao mesmo tempo que organizava todas as suas lembranças e pensamentos que vivera naquelas últimas horas.

— Eu estava a fazer uma viagem para longe da capital. Eu precisava hm... De organizar as ideias longe de... Muitas pessoas. — Enquanto falava, gesticulava com as mãos, esperando que conseguisse transmitir tudo de forma clara. — Eu simplesmente estava numa casa perto de um bosque, estava no meu escritório e de repente ouvi a melodia. A melodia levou-me a uma parte do bosque que eu não conhecia, a uma aldeia, onde a música vinha do centro dela, numa casa e simplesmente...

— Entraste.

Ele retomou o fôlego.

— Sim, foi isso.

Papoila olhou para Lírio, ainda de braços cruzados e com um olhar analítico.

— Era como disseste maninho, parece que temos aqui mais um Coração Perdido.

O asiático olhou-os, ainda mais confuso.

— Coração Perdido?

Papoila, observadora, perguntou:

— Quando eras criança, nunca ouviste falar da lenda da Pianista dos Corações Perdidos?

O compositor sentiu um salto no seu peito, sentindo o peso das palavras do revisor que o avisara no dia anterior, revivendo os olhares, as crenças e as palavras proferidas na carruagem daquele comboio expresso.

— Isso... — Ao fim de longos segundos de silêncio inquebrável, palavras tiveram coragem de sair dos lábios do músico. — Isso é verdade? Mas... Como? É só um conto de fadas...

— A música da Pianista tem um efeito digamos... Único. — O platinado interrompeu-o, explicando. — Tem um poder raro de atrair os perdidos, os que desistiram da vida e do amor. É como se sua música funcionasse como um farol, atraindo aqueles que mais precisavam.

Lírio fechou os olhos, pensando como seriam as suas próximas palavras:

— No entanto, os perdidos não sabem que a partir do momento que aceitam a luz da sua música, aceitam dar o seu coração, a sua liberdade, sendo trancados nesta caixa de música, tornando-a sua nova morada. — Encarou-o, com desencanto desenhado no seu rosto delicado. — Nada mais posso te podemos contar, porque nem sequer sabemos.

A Pianista dos Corações PerdidosOnde histórias criam vida. Descubra agora