Capítulo IV

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Uma voz mais nova acordou-o aos poucos, ao mesmo tempo que sentia pequenas palmadinhas no ombro. O maestro, ainda sentindo as suas pálpebras pesadas e o seu corpo afundado na cama, passou a mão por entre os seus cabelos, tentando aperceber-se onde estava.

O sol estava baixo, tão tímido que parecia só conseguir espreitar pelo horizonte, colorindo o céu de quentes avermelhados e alaranjados que contrastavam com o azul da noite que teimava em não partir.

Olhou em redor, sonolento, observando o ambiente em seu redor. No canto oposto da divisão estava o beliche onde dormia Papoila, agora vazio e já todo arrumado. Ao seu lado, ainda com a mão pousada no ombro, estava o seu novo amigo platinado, com os seus olhos esmeralda profundos a observá-lo.

— Tens um sono muito pesado, não tens? — Finalmente, retirou a mão do seu ombro, apoiando-se no varal do beliche. — Estávamos a chamar por ti já há quase uma hora.

— Que exagero, eu nunca dormi assim tão...

Naquele momento, os olhos negros esbugalharam-se, à medida que imagens da noite passada passavam na sua mente como estrelas cadentes. Os olhares, a figura etérea, a voz que mais parecia de uma sereia a encantá-lo à luz do luar e, por fim, a escuridão. Com todas aquelas lembranças, o seu coração falhou as batidas, fazendo-o pousar a mão no seu peito, perguntando-se o porquê dele se descontrolar diante daquela presença.

Uma mão surgindo à frente dos seus olhos acordou-o dos seus pensamentos:

— Ludwig? Estás aí?

— Ai, desculpa. — Apoiou a testa nas suas mãos, mexendo nos seus cabelos. — Estava pensando.

Lírio estreitou os olhos, numa expressão desconfiada, cruzando os braços.

— Estás mas é bem estranho.

— Por momentos parecias a tua irmã.

O platinado revirou os olhos, soltando um pequeno riso.

— Somos gémeos, é normal termos manias parecidas.

— O quê?! — Ele arregalou os olhos. — Vocês são?...

— Não fiques chocado, como sou mais bonita, ficam surpresos que ele seja meu gémeo. — A ruiva exclamou, num tom maroto, encostada à ombreira da porta.

— Papoila.

— Quê? Falei alguma mentira?

Lírio pousou a mão na testa, fazendo círculos com a ponta dos seus dedos, e suspirou:

— Irmãs. — Depois, olhou para ela, com uma pose confiante. — Eu claramente sou charmoso e bonito, sua boba!

— Se tu o dizes... — Tinha uma expressão de pouco convencida. — Quem sou eu para questionar.

— Ora sua!

— Bom dia, — disse, fingindo uma cara angelical, desviando o assunto. — Belo Adormecido.

— Ei! — Ele afastou os lençóis e cruzou os braços, imitando o platinado. — Eu não exagerei no meu sono.

— Caro amigo, mesmo com mil andorinhas estelares a cantar ao amanhecer, nem te conseguiam acordar.

Andorinhas estelares?

— Maninho, vou indo trabalhar. — Terminou de ajeitar os seus cachos ruivos e de adornar as suas orelhas com dois simples brincos de flores brancas. — A elegantíssima Madame Edelgard não espera.

— Está bem, mas tem cuidado com essa língua afiada.

— Eu não tenho sempre, maninho? — Ela sorriu, marota, e despediu-se, descendo por fim as escadas.

A Pianista dos Corações PerdidosOnde histórias criam vida. Descubra agora