Capítulo 15 - Sem expectativas

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Ana Reyes:

Espero a porta do elevador fechar e escorrego para o chão. Minha respiração está ofegante, não esperava encontrar o professor Lucca. Tento controlar os batimentos cardíacos antes que chegue ao meu andar, não posso deixar minha presença tão óbvia. Digo pra mim mesma que a possibilidade de vê-lo existia, já que ele trabalha no hospital. Só não esperava que fosse hoje, ainda mais no escuro e em uma cama.

Agito a cabeça para afastar as ideias erradas e me encaminho para o quarto de minha mãe. Um médico me olha torto, mas o cumprimento sorrindo. Dentro do quarto deixo as garrafinhas com leite em cima da cômoda e guardo na mala o restante dos meus pertences. Nesse momento me dou conta que perdi o celular. Droga! Será que caiu quando corri?

Sento apreensiva no sofá, dividida entre voltar na sala de descanso para procurar ou deixar isso para depois. Não estou com coragem para encarar o professor e precisar me explicar. Por outro lado, não posso ficar sem o aparelho, pois Vicente ficou de confirmar por ligação um serviço para mim.

O que faço? Para minha sorte, Jess entra minutos depois no quarto. Ela disse que me viu apreensiva no corredor e decidiu dar uma olhadinha para saber se estava tudo bem. Conto sobre o encontro inesperado e imploro para que busque meu celular. Sei que ela correria o risco de levar uma advertência caso o professor Lucca resolvesse nos entregar para a diretoria, mas, mesmo assim, ela aceita me ajudar de imediato.

Fico grata e a vejo sair com as garrafinhas de leite. Por mais que eu pague o quarto privativo de minha mãe, não tenho permissão para utilizar os cômodos reservados para a equipe médica. Infelizmente não consegui pagar um quarto com banheiro, por isso usava o do andar em reforma (sem contar que as camas de lá são bem mais confortáveis do que o sofá daqui).

Espero, o que parece ser uma eternidade, até que minha amiga retorne com o telefone. Nesse tempo fico imaginando tudo o que Lucca pode falar ou perguntar. Só desejo que Jess não fique encrencada. Quem sabe ele nem está mais na sala? Iludida e preocupada, essa sou eu há meses. Fico mais tranquila quando Jess surge, dizendo que tudo correu bem e que o doutor havia encontrado meu celular.

— Relaxa que ele prometeu não contar nada pra ninguém. - Jess me entrega o que perdi. — A única coisa é que acabei falando da sua mãe e que você irá embora amanhã.

Respondi que não havia importância, o que acalmou minha amiga. O que era ele saber da minha mãe comparado aos nossos encontros vergonhosos? Primeiro na boate e agora aqui. Espero não cruzar mais com ele, ao menos, não em situações constrangedoras. Faço uma prece silenciosa, mesmo ainda estando no hospital, local de trabalho do professor Lucca.

Respiro fundo e volto a atenção para Jess, que está prestes a sair do quarto. Agradeço novamente a ajuda antes de nos despedirmos. Ainda é madrugada, então decido cochilar um pouco. Há uma mensagem de seu Vicente avisando que hoje precisarão de mim novamente na cafeteria. Fico animada, até que meu domingo não começou tão mal.

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Não dormi quase nada, estava inquieta. Tratei de me arrumar e ir pra cafeteria, chegando antes do dono. Estou atendendo as mesas há algumas horas e está bem divertido. Tem um grupo de senhorzinhos sentados no balcão vendo Fórmula 1, acho que até dinheiro apostaram. Já descobri a história de vida, quantidade de filhos e a rotina de cada um. Eles até me ofereceram apresentar os netos, o que gerou uma disputa engraçada de cargos e formações dos pretendentes.

Agradeço o ambiente acolhedor, quem dera eu pudesse trabalhar aqui por bastante tempo. Contudo o salário não é suficiente para pagar as contas do hospital e um possível aluguel. Tudo bem, darei um jeito. Recolho alguns copos e levo duas senhoras até uma pequena mesa. Elas conversam animadas e ignoram completamente os olhares apaixonados vindo do balcão.

Descobri que as duas são as solteiras mais cobiçadas da região. Uma perdeu o segundo marido e tem 5 filhos; a outra não é viúva, apenas optou por viajar toda a vida ao invés de se prender a alguém. Vejo cada um dos senhorzinhos se aproximando da dupla para fazer galanteios (como eles mesmos chamam). É uma cena fofa e cômica, pois as duas não dão uma chance aos homens. Todos saem com a mão no coração, fingindo estarem sofrendo.

Graças a eles minha manhã foi tranquila e animada, quando percebo já é horário de almoço. Vou para os fundos da cafeteria, onde está uma marmita à minha espera. Todo dia poderia ser assim, desejo baixinho, levando mais comida à boca. Sinto uma vibração e pego o celular no bolso. Termino rápido de mastigar e atendo a tia Clarissa:

— Minha filha, tenho uma novidade quentíssima pra você! - Sua voz é pura empolgação.

— A senhora será avó porque o Gui engravidou a namorada?

— Ficou louca, pirralha? - Dona Clarissa perde até a doçura por causa de minha brincadeira. — Ele ainda é novo para me dar netos.

— Eu sei, eu sei, tia. - Rio bastante.

— Liguei para contar que consegui um trabalho incrível para você!! Uma amiga que mora aí está procurando uma babá.

— Não brinca, tia!

— E você acha que eu brinco com trabalho, filha? - Verdade. Tia Clarissa sempre foi muito séria sobre serviço. — Você será babá de uma menininha de quase 1 ano de idade. Os pais são bem ocupados e a avó, que sempre ajuda, vai viajar por 6 meses. Durante esse tempo você morará na casa deles, receberá salário e poderá folgar no fim de semana. Ótimo, não?

— Eu, eu… nem sei o que dizer!



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Leite Proibido [HIATUS]Onde histórias criam vida. Descubra agora