– Certo, você está pronto para ter o rumo da sua vida mudado permanentemente? – Crowley segurava o controle da televisão em uma mão, enquanto abraçava uma almofada amarela em outra.
Os dois tinham decidido, ao decorrer da semana, que a melhor data para ambos seria durante o final de semana – até porque não existia, além dos sábados e domingos, um dia em que seus horários batiam o suficiente para nem mesmo um único episódio. Crowley sempre tirou os finais de semana de folga, porque eram os dias mais movimentados e, embora também fossem os dias mais lucrativos, ele nunca pensou que valiam a dor de cabeça. Aziraphale poderia abrir a livraria quando bem entendesse, mas naquele final de semana não sentiu vontade – mas não tinha relação com o compromisso marcado com Crowley, foi apenas uma feliz coincidência.
– Sim, com certeza! – Aziraphale sorriu.
[Pensei em tudo que é possível falar; Que sirva apenas para nós dois; Sinais de bem, desejos vitais; Pequenos fragmentos de luz]
Eles começaram, obviamente, pela primeira temporada – uma das favoritas de Crowley. Aziraphale teve uma certa dificuldade em assimilar todo o enredo de manequins assassinos, mas a história em si realmente o interessou: imaginar viver por tanto tempo, ser capaz de visitar qualquer lugar no tempo e espaço, talvez até mesmo conversar com alguma figura histórica... Ele conseguia entender os motivos para a série ser tão popular.
– Então... manequins assassinos? – Ele perguntou.
– Sim! Genial, não é? – Crowley abriu um largo sorriso. – Se você pretende rir dos efeitos especiais eu terei que te interromper agora mesmo, ok? São efeitos especiais até que muito bons para a época e o orçamento que a série tinha. Não me faça ter que brigar com você. – Ele levantou o dedo indicador, fingindo uma ameaça.
– De maneira nenhuma, os efeitos especiais são ótimos! – Aziraphale levantou as mãos, se rendendo. – E eu realmente gostei como no episódio seguinte a música do fim do mundo era... Toxic, da Britney Spears.
– Arte em seu estado mais puro.
A série era realmente muito boa. Aziraphale chorou em algumas cenas (como quando Rose e o Doutor viam a destruição da Terra) e riu em outras: cada episódio era um grande misto de emoções. Crowley chorou em apenas um episódio. O sexto episódio da primeira temporada, Dalek.
– Esse episódio em específico eu já assisti umas boas cinquenta vezes, mas sempre acabo me emocionando um pouco demais. – Crowley riu, enxugando rapidamente uma lágrima antes que ela caísse e ele voltasse a chorar novamente. – O paralelo entre o Doutor, que é o "herói" da história e um Dalek, indiscutivelmente um dos maiores vilões da série e rivais dos Senhores do Tempo... "Você daria um bom Dalek"? Uma das cenas mais fortes, tristes e lindas já escritas na história da humanidade, isso eu digo com convicção.
– E é tão triste se imaginar completamente sozinho no tempo e espaço... Você pode ir para qualquer lugar imaginável e inimaginável, mas em todos você continuará sozinho. Mesmo com todas as possibilidades, o único lugar que você não consegue voltar é para casa. Acho que a Taylor Swift escreveu algo assim. – Crowley continuou, mal parando para recobrar o fôlego.
– Além do mais, a ideia de ser um alienígena que nunca sentiu uma única emoção além do desejo de morte e destruição para, depois de muitos anos, sentir todas as emoções humanas existentes? Completamente assustador, acho que eu não aguentaria sentir solidão pela primeira vez em sabe-se lá quantos anos de existência. Eu gosto muito desse episódio, acho que falei demais. – Ele parou, rindo.
– De maneira nenhuma! Eu gosto de ouvir você falando de maneira tão apaixonada assim por um tópico que claramente te interessa. – Aziraphale sorriu.
[Falar da cor dos temporais; De céu azul, das flores de abril; Pensar além do bem e do mal; Lembrar de coisas que ninguém viu]
Os episódios seguiram rapidamente – até porque ambos permaneceram absortos demais na série para ver o tempo passar. Aziraphale chorou mais uma vez com o nono episódio e Crowley deu seu melhor para tentar demonstrar conforto ao amigo – coisa que ele não era muito bom, mas se virava com pequenos tapinhas nos ombros. Quando o décimo terceiro episódio vinha chegando ao fim, porém, Aziraphale ficou catatônico.
– O que...
– É isso aí. – Crowley respondeu.
– Mas como... Mas eu gosto tanto dele...
– Eu também.
Nesse momento, o rosto do décimo doutor se iluminou na tela.
– Vocês são idênticos! – Aziraphale se levantou do sofá, apontando para a televisão e em seguida para Crowley, com a boca entreaberta de surpresa.
– Parecidos talvez, mas idênticos eu acho exagero... – Crowley se ajeitou no sofá.
– Você deveria levar como um elogio! – Aziraphale gargalhou com a reação do vizinho. – Sejamos honestos, ele é muito bonito! É uma coisa boa vocês se parecerem tanto.
– Ah sim, nisso eu concordo, ele realmente é muito bonito. E eu agradeço o elogio. – Ele lançou um sorriso que era um misto de sarcasmo e malícia. – É uma honra saber que você me acha muito bonito.
– Se eu soubesse que você era tão convencido eu não teria dito nada. – Aziraphale tentou disfarçar o vermelho das bochechas. – Sem conversa fiada, direto para a segunda temporada, vamos. – Ele tentou tirar o controle das mãos de Crowley.
– Por mais que eu fosse adorar... – Crowley puxava o controle de um lado enquanto Aziraphale puxava de outro. – Faz umas dez horas ininterruptas que estamos na frente desta televisão, eu não acho que isso seja muito saudável. Qual foi a última vez que você comeu algo além daquele balde de pipoca cinco episódios atrás?
– Você tem razão. – Aziraphale murmurou baixo, soltando o controle e se dirigindo para a cozinha. – Tem alguma coisa que você gostaria de comer?
– Uau, primeiro você me compara com a beleza de um ator de cinema e agora você me convida para jantar? Achei que nosso encontro seria apenas em dezembro, na reunião de condomínio. – Ele gargalhou, cruzando os braços.
– Se você morrer de fome no meu apartamento e ligarem isso com o fato de eu ter derrubado um vaso na sua cabeça podem pensar que eu tentei assassinar você. Não ficaria muito bonito para a minha imagem, não é? – Aziraphale brincou, apoiado na geladeira. – Você quer alguma coisa ou não?
[O mundo lá sempre a rodar; Em cima dele tudo vale; Quem sabe isso quer dizer amor; Estrada de fazer o sonho acontecer]
– Sim, senhor. – Crowley levantou do sofá. – Eu posso ajudar em alguma coisa, mas eu não sou muito bom com isso. – Ele gesticulou vagamente para todos os itens na cozinha.
– Sim, eu sei. Você tem cara de quem não é um cozinheiro muito bom. – Aziraphale disse distraído, enquanto procurava uma panela no armário. – Desculpe, não era minha intenção soar tão rude! É só que...
– Tudo bem. Eu disse que você tinha cara de não saber cuidar de uma planta, você disse que eu tenho cara de quem não sabe cozinhar. Estamos quites e ambas as coisas são verdade. – Ele gargalhou. – Me diga o que devo fazer e eu farei.
– Eu posso confiar em você com facas? – Aziraphale perguntou com genuína apreensão em sua voz.
– Hm... Eu acho que depende para quem você perguntar. Como você está perguntando para mim, sim. Eu definitivamente sou confiável com facas.
[Você vai ter que encontrar; Aonde nasce a fonte do ser; E perceber meu coração; Bater mais forte só por você]
VOCÊ ESTÁ LENDO
Good Omens - Entre Tapas e Beijos (Ineffable Husbands)
RomanceAU (alternative universe) - Em que Crowley, segurança de uma boate, resolve caçar briga com seu vizinho de cima pelo barulho de música alta às seis da manhã - ou em que Aziraphale resolve revidar a implicância de seu vizinho do andar de baixo.