Cap. 8 - Uma Audição Infernal

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Esfrego meus olhos.
Hoje é um daqueles dias longos, intermináveis. Se eu nunca mais ouvir outro verso em pentâmetro iâmbico, ainda assim será cedo demais.

Assistimos aos testes de trinta e dois Romeus hoje e a maioria não tinha ideia do que estava fazendo. Se audições fossem pessoas, essa seria Charlie Sheen. Um completo desastre.

Ao meu lado, nossa diretora, Déborah, esfrega as têmporas.

— Como é possível? — pergunta, em tom de lamento. — Nesta cidade enorme onde metade dos garçons é uma porra de um ator, como podemos ter zero atores bons de verdade para viver nosso Romeu? Eu não entendo.

— Talvez tenhamos que ampliar um pouco mais a nossa busca. Tente alguns dos alunos da Grove, quem sabe?

— E o seu irmão? — pergunta Déborah. — Sei que ele fez o teste para Mercúcio, mas se eu não conseguir encontrar alguém para fazer Romeu, talvez tenha que escalar Otto para esse papel.

— Ah, não — digo, balançando a cabeça. — Otto não é romântico nem um pouco. — O histórico de relacionamentos dele é ainda pior do que o meu. — Além disso, ele despreza Romeu. Acho que seria bem complicado transformá-lo em um Romeu.

Déborah faz um som em discordância.

— Bem, a menos que este último candidato me arrebate, talvez eu não tenha outra alternativa a não ser encarar seu irmão. — Ela consulta sua prancheta. — Ai, meu Deus. O próximo candidato não tem agente. Nem experiência. Ele nem mesmo tem uma foto para publicidade, minha santa mãe de Deus. — Ela baixa a prancheta e suspira. — Vá buscá-lo, certo? Vamos acabar logo com isso, assim eu posso abrir uma garrafa de vinho e afogar minhas mágoas.

Dou um tapinha de consolo em suas costas e vou até a sala de espera. Só há uma pessoa lá, e não é um ator.

— Sarah?

Como ela soube onde me encontrar?

Sarah tira os fones de ouvido e olha para mim. Parece mais sexy à luz do dia do que estava na noite passada. Como isso é possível?

— Oii, Ju. — Ela se levanta e caminha em minha direção e eu não posso deixar de perceber como o seu olhar percorre todo o meu corpo, de cima a baixo. — Eu meio que esperava não encontrar você hoje. A noite passada foi tão incrível que comecei a acreditar que não passou de um sonho. — Ela estuda meu rosto. — Estou contente de ver que você realmente existe. E é ainda mais bonita do que eu me lembrava.

Estou pensando no que responder quando Déborah chama:

— Juliette? Algum problema?

— Não. Espere um pouco, por favor! — Encosto a porta e baixo o tom de voz quando volto minha atenção para Sarah. — Olha, estou feliz em ver que você também existe, mas você não pode vir aqui. Estou trabalhando.

— Eu sei. Estou na lista.

— Você está brincando.

— Não, não estou. Confira.

Olho para a prancheta na minha mão e, com certeza, o último nome da lista é "Andrade".

Eu a encaro. Ela me dá um sorriso que deixaria qualquer calcinha molhada.

— Juliette, posso não ter sido inteiramente honesta com você na noite passada, mas juro que foi pelas razões certas.

Ela passa por mim, abre a porta e entra na sala.

— Oi, Déborah. Sou Sarah Andrade e vou fazer o teste para o papel de Romeu.

Assim que Déborah põe os olhos nela, fica boquiaberta. Leva alguns segundo até que consiga articular alguma palavra novamente. Sei como ela se sente.

Impiedoso Coração (Sariette G!P)Onde histórias criam vida. Descubra agora