Capítulo 1: Perséfone

137 48 327
                                    

Era meio do ano, época em que ocorrem as colheitas e maiores festividades do Reino de Iberion, quando até mesmo o ar parece estar impregnado com um aroma doce de hidromel. A plebe, que constituía a maior parte da população, após longos meses de trabalho, tinha sua colheita como recompensa. Os festivais giravam em torno das colheitas, e tinham como ímpeto acalmar os ânimos daqueles que tinham ideias contrárias ao Rei.

Justamente por isso, esta era a época em que as Quatro Casas mais trabalhavam.

O ressoar das músicas folclóricas cantas e tocadas em alaúde não cessava nunca nestes dias. Havia sempre uma voz impaciente, acompanhando os teatros ao ar livre que, quase sempre, possuíam cunho político e serviam para disseminar ideias. A Casa Roxa, Família de Dionísios encarregada pelo divertimento do povo, planejava diversos espetáculos, e era quando Dione, a mais prestigiada filha, se apresentava.

Até mesmo algumas pessoas da Casa Vermelha, a Família Hadesius, a mais temida entre todas, compareciam ao teatro quando Dione estava presente na peça, mesmo que esta época também fosse a mais tribulada para esta família.

Por isso, quando a jovem usando um longo vestido vermelho entrou no teatro naquela tarde, todos olharam para ela. Era raro vê-la. Tudo e todos pararam. O tempo ficou congelado enquanto somente ela analisava o local.

Era diabolicamente linda. Ela tinha cabelos de fogo que desciam em longas cascatas em suas costas. Seus olhos castanhos, de expressão sólida e traiçoeira, eram adornados por longos cílios. Andava lentamente, como se soubesse que todos ali a esperariam sentar antes de começarem a peça. E esperariam. Essa era a ordem, não há palavra acima daqueles pertencentes à Casa Vermelha, a não ser a do Rei.

Olhou o lugar escolhendo onde iria sentar-se, pois mesmo não tendo feito reserva, abririam espaço. Encontrou algo que lhe agradou nas primeiras filas, e com um simples sinal de mão, as pessoas que ali se sentavam forma retiradas. Olhou para trás procurando seus acompanhantes.

Um alto homem de meia idade de cabelos negros meio grisalhos e olhos castanhos logo veio, junto de um outro semelhante um pouco mais jovem. O jovem, que tinha os traços elegantes e sombrios, estava com um terno completamente negro, e fumava algo em um cachimbo. O cheiro do fumo era doce e viciante, assim como seu olhar.

Os dois foram juntos da jovem até os assentos. Sentaram-se, e somente assim, a vida prosseguiu. Um murmurinho comum a lugares públicos, instalou-se.

A jovem ficou olhando para o teto analisando o afresco com imagem de diversas pessoas nuas. Decerto eram deuses gregos, mas ela não sabia quais, apenas chegou a conclusão que o membro dos homens era menor do que a proporção normal e quase riu daquilo.

O homem mais velho olhava o relógio de bolso de 5 em 5 minutos. Sua mente estava em um lugar completamente diferente dali, e por isso, se o perguntassem no dia seguinte qual era a cor do vestido da jovem, ele não saberia dizer. Só pensava em seus "negócios".

O jovem também estava distraído, mas seus olhos não se focavam no afresco obsceno sob suas cabeças, pois aquela obscenidade era fraca demais para ele, e em nada o agradava. Por isso, as pupilas negras adentravam o decote da jovem ao lado sem timidez alguma. Ali em público, apenas seus olhos a devoravam, mas sua mente, já estava se deliciando com outras partes.

— Dion, será que, pelo menos, hoje pode parar de me olhar assim? — Falou a jovem encarando-o.

— Porque diz isso? Você nunca reclama.  — Protestou sem tirar a visão dos seios dela.

— Mas hoje é meu aniversário, você poderia pelo menos ser mais legal comigo hoje?

— Perséfone, você só tem 15 anos. Não tem idade para me pedir nada.

As Quatro FamíliasOnde histórias criam vida. Descubra agora