Capítulo 4

4.4K 315 39
                                    

Sai pela rua sem destino, fazendo um caminho que nem ao menos conheço. Tão fora de si eu estava. Assim que me vi longe de casa o único sentimento de alegria que ainda restava guardado bem no fundo se foi. Não tinha noção de quase nada, exceto uma coisa: Se manter longe de tudo e todos, sem previsão de volta.

Apenas segui a estrada, sem me importar para onde iria.

Com esse vestido branco, e após minha volta da morte, as pessoas poderiam me titular como "a noiva cadáver".

Após um tempo de caminhada, parei em frente a uma casa abandonada, boatos que ela é assombrada, e se a mesma for assombrada, e existir espíritos nela, que mal me fariam? Já que eu voltei da morte? Talvez me atormentaria querendo dicas de como fazer o mesmo. Voltar à vida, provavelmente era o maior sonho deles, ou não — eu ri sozinha no meio da rua. — Ou talvez eles gostassem de assustar as pessoas.

A casa possuía uma pintura azul toda descascada, vidros quebrados.

Entrei sem fazer cerimônia. Eu só precisava de algum lugar para ficar. Dentro era mais obscuro. Dois andares, os únicos móveis que eu podia ver estavam sujos e úmidos. A escada que preenchia boa parte da pequena sala, parecia nada segura, pois estava meio quebrada e úmida. Como se quando eu fosse subir ela pudesse se quebrar.

Olhei para um outro cômodo, que parecia ser a cozinha, tinha uma mesa, e uma estante.

Um corredor me levou para uma porta que estava toda arranhada, provavelmente um gato tinha passado por ali. Abri a porta e ali ficava o banheiro. Que até agora era o único cômodo que possuía mais moveis. Uma pia, um espelho quebrado, o chuveiro e o vaso sanitário.

Uma sensação de exaustão dominou meu ser, pensei que voltar da morte faria com que eu não me sentisse cansada, mas era o oposto, me sentia ainda pior. Decidi-me que outra hora iria verificar o segundo andar, por agora precisava me deitar em algum canto desse lugar e descansar.

Deitei-me no sofá sujo. Acredito que essa seria minha nova morada, pelo menos por enquanto.

Acordei ouvindo uma risada infantil. Abri meus olhos e me assustei ao deparar-me com uma menina de cabelos curto e ruivo. Sua pele pálida, usava um vestido bege, seus olhos castanhos, os lábios finos.

Ela não ria mais como antes, agora me encarava com um olhar de curiosidade.

— Finalmente — disse a menina. — Estava esperando por você, já faz um tempo. Décadas provavelmente. Por que demorou tanto? Pensei que já tinham se esquecido de mim.

Levantei-me do sofá e perguntei a menina.

— Me esperando? Quem é você?

A menina franziu a testa e logo disse.

— Você não sabe quem sou eu? Então você não veio me buscar, mas por favor, você tem que me levar. Há muito tempo estou esperando por esse dia. Por favor, me leve com você.

— Levar? Levar para onde?

— Para o céu, ou para o inferno. Qualquer lugar, mas me tire daqui — suplicou. Fazia sentido, a voz daquela noite havia me dito que me tornaria uma ceifadora, e eu deveria ceifar a alma dessa garota. Porém como ceifa a alma de alguém? Não havia manual de instruções. A menina arregalou os olhos e disse. — Eu posso sentir um outro ceifador se aproximar, mas ele é diferente. A energia dele é bem mais forte que a sua.

Um homem alto, usava vestimenta social, se junto a nós na sala.

— Joanny Celti — chamou.

— Diga.

— Estou aqui para lhe ensinar a ser de fato uma ceifadora.

— Por favor, pode me ensinar tudo que puder. — Pedi.

— Venha comigo. Aprendera o que deve fazer — Convidou.

Antes de sair, a menina suplicou novamente.

— Ajude-me. Você tem que me ajudar!

Olhei para o ceifador que disse.

— Ela tem coisas a se fazer na terra. Enquanto não fizer. Não poderei levá-la.

— Coisas? — perguntei.

— Ela como ninguém, sabe o que deve fazer — Me respondeu.

Olhei para a menina e prometi a ela.

— Eu prometo que voltarei e te libertarei, prometo.

— Promessas devem ser compridas. Então volte — após essa frase, ela desapareceu.

Enquanto caminhávamos pela calçada eu perguntei.

— Para onde vamos?

Ele me passou um papel todo amassado de cor bege, eu o abri e com uma perfeita caligrafia estava o nome de "Renata Roberts" a idade dela "24" e um horário que seria ás "13h26min e 40 segundos."

— O que isso significa? — perguntei.

— A morte — respondeu. Ele segurou em minhas mãos e com um clarão estávamos agora em uma casa de madeira, bem simples. Uma garota da minha altura estava deitada em sua cama. Ela era bonita, embora estava pálida. Seus cabelos eram loiros e lisos, ela não parecia se sentir bem.

Ele entraria no quarto onde ela estava, mas antes que o fizesse falei.

— Ela pode me ver. Não estou literalmente morta — sussurrei.

Ele ainda segurava minhas mãos, olhou em meus olhos e disse.

— Perto de mim, você não está viva.

Entramos no quarto e aquela garota gemia de dor. O que ela tinha?

— O que devemos fazer? — perguntei.

— Apenas esperar.

— Mas ela está sofrendo, você não fará nada para que a dor dela pare? — perguntei apreensiva. Eu queria ajudar aquela garota que está sofrendo tanto, eu nem sabia o que ela tinha, mas eu não queria vê-la sofrer.

— A morte a fará — respondeu e continuou a fitar aquela garota.

Para ele parecia normal ver aquela pobre mulher sofrer, mas para mim não era normal. Até parecia que eu sentia a dor dela, sentia o sofrimento, a angustia de esperar a morte vir.

Ele olhou para mim e sussurrou.

— À hora chegou.

Em um piscar de olhos, aquela sensação que transmitia de sofrimento havia cessado, não se sentia mais vida vindo daquele corpo, e então pude vê-la se levantar da cama, mas era apenas sua alma, seu corpo jazia naquela cama.

Ela parecia desorientada, lembro-me que era assim que me sentia ao ver meu próprio corpo.

— Renata Roberts — o ceifador a chamou.

Ela o olhou assustada e logo seus olhos me fitaram.

— Quem são vocês? Isso é um sonho, não é? Diga-me que é.

— Eu queria poder dizer que isso é apenas... — O ceifador me interrompeu.

— Não diga nada Joanny Celti, apenas observe — assenti, mesmo querendo responde-la. — Nos acompanhe.

Mesmo duvidando de quem éramos ela nos acompanhou. Acompanhou-nos até um estacionamento de um shopping, paramos em frente a uma parede pichada de cor amarela, escritas desconhecida estavam ali. Como aquela que o ceifador me levara, após minha morte.

O ceifador encostou uma de suas mãos na parede, a outra ainda estava segurando minha mão. Quando ele encostou eu pude ver um imenso jardim, um campo cheio de diversas flores, arvores sombreavam... — minha visão foi interrompida quando ele desencostou sua mão da parede.

Logo soltou minha mão e segurou a da Renata Roberts, ele a fez encostar a mão na parede como ele, e logo ela desapareceu. Depois virou-se sua atenção para mim.

— Aquele lugar que você viu, é para onde ela foi.

O tão esperado paraíso.

Filha da MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora