Capítulo 14

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Quando meus olhos se abriram, não reconheci onde me encontrava.

Estava no meio de uma floresta e era noite. As folhas secas no chão ao serem pisadas estalavam, podia ouvir pássaros batendo suas asas se afastando. O silencio era de certa forma perturbador, ouvia-se até mesmo as cobras se rastejando no chão.

Eu estava sonhando, não havia dúvidas.

Uma leve brisa tocou minha pele, e com a mesma o cheiro de sangue tomou conta de minhas narinas.

Provavelmente esse cheiro, pertencia a algum animal, mas mesmo assim quis seguir de onde vinha o cheiro.

Pude enxergar alguém vestido com um sobretudo preto bem longe de mim, esse me olhou e então rapidamente desapareceu do meu campo de visão, mas pude ver outra pessoa deitada ao chão, corri em direção a essa pessoa. Antes mesmo de chegar próximo, meus olhos transbordaram lagrimas sem que eu conseguisse controlar. Meu corpo congelou assim que vi Ezequiel deitado no chão, olhos abertos, mas não enxergando nada. Havia sangue por tudo. Sua camisa branca estava rosada pelo sangue que cobria seu corpo. Ele estava morto. Meus joelhos cederam ao lado do seu corpo e mais lagrimas surgiam sem parar.

Por que esse sentimento de tristeza estava dominando meu ser, se nem ao menos eu o conhecia direito.

A escuridão dominou meus olhos e quando voltei a enxergar me deparei com Ezequiel me encarando, estávamos em minha casa. Ele estava sentado ao meu lado, com minhas pernas quase encostando no corpo dele. Acho que ele não entendia o perigo que ele corria, mas eu não me importava. Creio que ficaria feliz com a morte dele, era estranho estar pensando dessa forma, depois do desespero que passei em meu sonho. Eu não ficaria desesperada com a morte dele como fiquei em meu sonho. Não sei dizer se eu odiava a coragem dele, ou o jeito como ele se achava.

— Pensei que você havia ido embora — falei.

— Esqueceu que estou aqui para treina-la?

Levantei-me e falei.

— Acho que preferia ter esquecido.

Ele sorriu e disse.

— Não fale assim — logo soltou uma gargalhada, franzi a testa com sua estranheza.

— Ao invés de ficar rindo, por quê não me diga o que faremos hoje?

— É surpresa.

Ele bateu palma duas vezes, e de repente minha sala ficou repleta de criaturas desfiguradas. Dentes enormes, sedentas por sangue, pelo meu sangue.

— O que seria isso? — perguntei.

— Brinquedos, divirta-se — Ezequiel levantou-se e saiu de minha casa, deixando-me com essas criaturas que eu não tinha ideia do que fazer.

Dei um passo para frente, e todas deram também, com receio voltei o passo para trás, e ela seguiram o meu comando.

Encostei na palma de minha mão, e logo a foice apareceu.

Fui para cima de uma, e as outras pularam em minha direção, me derrubando, tentei lutar, mas eram muitas. Elas não morriam ao meu toque, e isso me irritada, não valia tão a pena ser uma ceifadora.

Senti meu próprio sangue escorrer por entre meus lábios, jamais pensei que pudesse morrer novamente.

Quando parei de lutar, uma desistência, todas as criaturas pararam também. Elas eram meu espelho, tudo que eu fizesse, elas imitavam.

Com uma coragem insana, e um gesto único finquei a foice em meu peito, e todas as criaturas fincaram suas próprias garras em si próprias, assim uma por uma desapareceu de minha sala. Eu não poderia matar a mim mesma, era o que eu esperava que existisse em uma regra geral de ceifadores, se é que existia uma.

Ezequiel voltou já reclamando.

— Você demorou para perceber que elas apenas te imitavam e fez a burrada de fincar sua foice em si própria. Não era mais fácil, apenas para de lutar, ficar imóvel, e esperar eu voltar?

Meu peito estava ardendo e doendo, acho que eu poderia morrer realmente, pelo fato de que não era uma arma normal. Era uma foice de ceifadores.

— Você não disse que voltaria.

— Eu disse que te treinaria, era obvio que voltaria. Agora você está com uma dor tremenda. O que posso fazer por você? Talvez nada. Deixar você morrer me parece uma proposta tentadora.

— Então deixe-me. Vá embora, nunca mais volte.

— Por que voltaria? Você estará morta mesmo — Eu sentia as veias de meu corpo enchendo, como se logo elas fossem explodir. O sangue não parava de escorrer. E algumas vezes tinha ataques de tosse e com isso cuspia sangue, novamente eu estava morrendo. – Pobre Joanny – Ezequiel se aproximou um pouco de mim e estalou seus dedos, logo uma brisa me envolveu e cada parte de meu corpo se renovou, como se a brisa fosse minha cura, o corte em meu peito se fechou, me sentia melhor novamente. — Não deixaria você morrer dessa forma, prefiro ver você sofrer de um jeito mais doloroso.

Respirei profundamente e ignorando tudo que ele disse sobre minha pessoa perguntei:

— O que você acha sobre sonhos?

— Sonhos são universos paralelos, onde as pessoas podem controlar, porém claro que poucas sabem disso. Algumas vezes os sonhos são recados, uma premonição. O que sonhou? Percebi que estava tensa.

— Não estava tensa, estava feliz. Sonhei com sua morte.

Seus lábios se repuxaram em um sorriso e ele disse.

— Então as lagrimas que escorreram de seus olhos eram de alegria? Mesmo? Não foi o que pareceu.

O ignorei e perguntei.

— Diga-me, o que esses monstros que você fez, vai me ajudar? Pois isso só me feriu.

— Sem ressentimento, mas você é fraca. Você deveria usar mais a mente, antes de usar a força, embora você não seja forte. Você apenas foi direto ao ataque. Quero que você perceba que nem sempre quem é mais forte vence.

— Qual o próximo treinamento?

— A resistência, mas antes... — Ezequiel olhou para a janela onde um corvo adentrou em minha casa carregando em seu garras uma carta.

— Tenho trabalho a fazer — falei.

— Exatamente — sussurrou.

Filha da MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora