Uma tempestade se formava, um vento gelado já se fazia presente. Trazia consigo uma sensação diferente, como a morte.
O vento varria para longe as sujeiras que dominavam o chão, podia ver sacolas plásticas de diversas cores sobrevoando.
Pessoas corriam pela rua em busca de proteção. Muitos procuravam algum abrigo, outros ficavam embaixo das coberturas dos pontos de ônibus, na esperança que assim pudessem se proteger do que estava por vi.
Não muito diferente, acelerei meus passos para a minha nova casa.
Quando cheguei, antes mesmo que entrasse fui recebida pela menina de cabelos ruivos.
— Estava esperando por você — logo disse, seus olhos estavam arregalados, demonstravam medo. Ela correu para dentro de casa, entrei logo atrás.
— Está tudo bem?
— Por que demorou? Eu tenho medo do que está vindo.
— O que está vindo? — perguntei, mas não obtive respostas, então a questionei algo que já deveria ter perguntado desde nosso primeiro encontro. — Qual é o seu nome?
— Ofélia — respondeu. Ela se sentou ao chão e ficou sobre suas pernas.
— Prazer Ofélia, me chamo Joanny — apresentei-me.
— Eu sei — ela sorriu. — Todos sabem.
Ofélia se levantou e correndo subiu para o segundo andar.
— Venha — chamou.
Ofélia queria que eu subisse logo a escada que eu temia que quebrasse.
— É meio perigosa essa escada — falei, mas ela não me respondeu. Respirei fundo e me arrisquei.
Por sorte, apenas a aparência demonstrava que era frágil.
Cheguei ao segundo andar, e fiquei surpresa ao ver que esse era mais organizado, e havia mais mobílias.
— Ofélia, minha irmã. Por que trouxe essa jovem aqui? — ouvi uma voz fraca masculina.
Observei uma cama no canto dessa imensa sala. Nessa cama havia um homem, já idoso. Os cabelos eram grisalhos, vestia uma camisa de flanela, e uma calça preta.
Aproximei-me ainda mais e observei seu rosto que estava enrugado pela idade, havia olheiras, ele estava pálido. Pude notar que ele respirava com dificuldade.
— Ela é minha amiga — Ofélia disse sorrindo para mim, e me convidando para me aproximar ainda mais.
— Olá Joanny — o velho cumprimentou.
— Quem é você? — perguntei.
— Osmar, meu irmão — respondeu Ofélia. — Ele é mais velho que eu, morri quando ele possuía 10 anos.
— Como... Como você consegue vê-la? — perguntei
— Sou médium. Todos a perderam após sua morte, menos eu — ele sorriu para ela.
Logo começou a tossir, pude notar que ele cuspia sangue.
— Ele está doente — contou Ofélia.
— Precisa ir ao médico.
— Não posso, por ela precisei morrer para os outros.
Havia uma mesa repleta de alimentos, com isso me surgiu uma dúvida, Ofélia era um espírito e seu irmão mal tinha forças para falar. Como conseguiam esses alimentos? Ofélia seguiu meu olhar para a mesa e entendendo a minha dúvida me respondeu.
— Pelo menos uma vez por semana vêm humanos idiotas nessa casa com a intenção de conseguir passar a noite. Eles sempre trazem comida consigo, então só dou o que eles querem ver. Com medo de mim eles saem às presas deixando os alimentos.
Pela janela pude ver a iluminação que os raios faziam e me surgiu mais uma pergunta aquela à qual Ofélia não havia me respondido, ou não sabia me responder.
— O que está vindo com a tempestade? — perguntei.
— A morte — respondeu.
— Não é a morte que está a caminho, e sim alguém que aproveita o tempo para criar algo — explicou Osmar.
— Criar o que? — perguntei.
Ele sorriu.
— Você tem que descobrir, você tem que interferir.
É isso que a morte quer, que eu interfira.
Osmar teve mais um momento de tosse frenética, porem essa continuou ainda mais intensa.
— Irmão! — gritou Ofélia, ela olhava para mim como se pedisse uma ajuda, mas sabia que eu não poderia fazer nada.
Assustei-me quando um homem de terno preto surgiu logo à frente, ele tinha uma expressão monótona. Acariciou o rosto de Osmar e logo em seguida ouvi o grito de desespero vindo da Ofélia.
— Não pode levá-lo — disse ela. — Não pode! — suplicou.
O espírito de Osmar saiu de seu corpo e sorrindo falou.
— Está chegando finalmente sua vez irmã, nos vemos em breve.
Ele seguiu o ceifador que não disse sequer uma palavra.
Logo um corvo adentrou pela janela e sobrevoou em minha frente. Ele segurava uma carta, já sabia seu significado, peguei a carta sem hesitar dessa vez.
Ao ler o nome, não sabia se ficava feliz pelo fato de que a pessoa finalmente teria "paz" ou se choraria, pois novamente terei que ficar sozinha.
— Ofélia, me siga. Sua hora chegou.
Por um momento ela me olhou com dúvida, como se pensasse que eu estava brincando, mas depois ela abriu um largo sorriso e disse.
— Finalmente. Por que ainda estamos paradas? Vamos logo.
A chuva ainda não cessara, ficarei encharcada. Enquanto caminhávamos pude entender, Ofélia estava presa aqui por causa de seu irmão, os dois tinham uma ligação, ele morreu aos olhos dos outros para que pudesse ficar com ela, e agora finalmente, após anos, os dois estavam livres.
— Joanny, eu acredito em você. Acredito em sua força e sei que você conseguira interferir o mau.
Apenas sorri para ela. Feliz por alguém acreditar que eu era forte, pois até mesmo eu duvidava disso.
Logo chegamos ao local, uma pichação de cor azul.
Estendi minhas mãos para ela e antes que ela segurasse, Ofélia disse.
— Um dia ainda nos veremos.
Pude ver que ela iria para o "paraíso". Encostamos as mãos na pichação e então, ela desapareceu.
— Um dia — sussurrei para a noite.
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Filha da Morte
FantasyCertos destinos não devem ser mudados, e Joanny descobre da pior forma. Destinada a morte, Joanny se vê tentada a aceitar as novas condições para voltar a vida, sem pensar no que isso poderia influenciar para si e para as pessoas a sua volta. Joanny...