01 | 𝚆𝚎𝚕𝚌𝚘𝚖𝚎 𝚝𝚘 𝙱𝚘𝚜𝚝𝚘𝚗

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Loiry Sartori
Dias atuais

— Tem certeza de que é isso que você quer? — Cassandra pergunta impaciente, observando-me puxar a grande mala rosa, ofegante.

Lá fora, apesar do sol brilhante pintar o céu de azul, uma brisa insistente varre pelas ruas, fazendo as árvores dançarem suavemente e as folhas sussurrarem ao vento. A luz dourada do sol cria contrastes vivos nas fachadas das casas e nas flores que adornam os jardins. Mas, apesar da beleza do dia, uma sensação de inquietação me envolve, como se a própria natureza estivesse refletindo a turbulência em meu coração.

— Cassandra... — Suspiro. — Mãe, você disse que iria me apoiar. — Paro em frente à porta de madeira levemente envelhecida, a mala se torna um banco. Passo a mão pela testa na intenção de limpar as pequenas gotas de suor que deslizam pelo meu rosto. — Essa matrícula era o sonho do papai, não posso voltar atrás. — Sorrio, tentando mostrar confiança a ela.

— Mas esse é o sonho de outra pessoa, não o seu.

Eu sei o que isso é. Ela está receosa, embora tente esconder isso em seu olhar falsamente confiante. Só que, por mais que esteja com medo, Cassandra sabe dos meus propósitos.

Eu não sou um simples pássaro que pode ser mantido preso. Na verdade, depois que Christopher se foi e após o coma alcoólico, percebi que a vida é apenas um fardo passageiro, e que basta um piscar de olhos para sumir. Pelo visto, esse era o sonho do meu pai, e agora é o meu.

— Eu devo mais que isso a ele. — Minhas palavras saem como um sussurro. — Eu prometi...

Desde muito pequena, amo ir a museus e exposições de obras de arte. Uma jovem que se expressa pelas telas, com sentimentos bons e ruins, mas tudo isso se intensificou após a perda do meu pai. E esse desejo de ir a Cosllet não se dá apenas à arte; a verdade é que eu quero fugir dos meus demônios. Culpo-me pela morte de Christopher... De certa forma, fui a causa. E como resultado, uma sombra começou a me perseguir, ou minha mente tem me pregado peças.

Breve pegarei o avião, estou ansiosa. Meu coração é uma bomba relógio que palpita em meu peito e logo explodirá.

...

Há algum tempo, me matriculei em Coslett, o maior internato de artes de Boston.

Todos os dias, voltava da cafeteria que Cassandra administra ansiosa para encontrar a carta de aceitação, até que certo dia, como de costume, fui até a caixa de correios. Meus olhos brilharam ao pegar uma pequena carta que parecia um tanto formal. O envelope com material rústico carregava sobre si um selo dourado, indicando de onde vinha. No verso, um remetente e um destinatário. Foi mais vez que senti, meu coração acelerado, minhas mãos trêmulas... O vazio enjoativo no estômago.

Eu fui aceita...

...

Jogo minha mala dentro do porta-malas do carro sem nenhum cuidado. Ajeito todos os itens dentro da pequena bolsa de ombro e olho para o relógio em meu pulso. Rapidamente, volto a atenção para minha mãe, que conversa com meu padrasto, encostada na cerca de nossa casa. É incrível como ela consegue sorrir tão facilmente, mesmo que o sorriso seja o mais falso que já vi.

Ela foi rápida para se casar, tecnicamente um ano depois da morte do meu pai ela já estava casada com ele. Entendo que ela fez isso pelo dinheiro, é tão interesseira quanto qualquer outra pessoa que já apareceu na vida dele. É assim que somos, não é? Fazemos tudo por dinheiro...

Embora não posso ao certo dizer que eu e meu padrasto temos uma relação boa, estamos longe disso. Ele me inferniza quase todo santo dia, e dois alcoólatras em uma casa não se cheiram. Estamos a um passo de nos matarmos, mas não podemos simplesmente fazer isso, ou o que sairia nas manchetes?

A ARTE DO DESEJOOnde histórias criam vida. Descubra agora