Perdas e Danos

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Ser acordada por um celular tocando é como sentir que algo está sendo roubado de você, e na verdade está.

Foi o que eu senti quando ouvi o toque de chamada do meu celular romper o silêncio majestoso de meu apartamento em um horário muito incomum.

Procurei pelo aparelho com a mão, me recusando a erguer a cabeça ou acender a luz, mas como falhei na tentativa e o barulho do toque estava doendo em meus ouvidos, não tive outra escolha se não levantar a cabeça e acender o abajur. Olhei de relance para a tela do relógio, piscando freneticamente, tentando ajustar meu olhos à claridade enquanto eles ardiam e lutavam para permanecerem fechados. Não foi uma batalha fácil, e o motivo piscava em forma de números.

Eram 4:13 da manhã.

Pego o celular, olho o identificador, mas não reconheço o número, só percebo de relance que é residencial.

– Alô? – falei, totalmente grogue.

– Felicity? – ouço uma voz masculina e a reconheço quase que instantaneamente – Desculpe ligar à essa hora.

Sentei-me na cama.

– Oliver? Algum problema? – perguntei.

O silêncio que antecipou a resposta pareceu tão demorado que eu já estava me perguntando se ele ainda estava do outro lado da linha.

– Na verdade, sim.

***

Ir em um funeral nunca é uma coisa que você planeja fazer em um domingo a tarde. Ir em um funeral de uma pessoa que você nem ao menos conhecia pessoalmente é ainda menos planejado, e com certeza mais estranho.

Mas eu precisava estar lá.

Quando Oliver me ligou às 4:00 da manhã dizendo que seu pai estava morto, muita coisa passou pela minha cabeça, mas nada conseguiu sair. Eu sabia que ele iria precisar de ajuda, já que ele já estava assumindo o cargo de CEO das Indústrias Queen, eu como sua única assistente deveria dar suporte nesse momento.

Trabalhei durante todo o dia. Sara estava lá também e me ajudou com alguns detalhes. Providenciei o comunicado oficial à imprensa e cuidei para que ele fosse divulgado o mais rápido possível, para evitar especulações. Atendi à tantas ligações em meu celular que algumas vezes parecia que estava ouvindo ele tocar, quando na verdade não estava. Cuidei para que a imprensa não atrapalhasse a cerimônia, e com a ajuda milagrosa de Diggle, coloquei alguns fotógrafos – que conseguiram passar pelos seguranças –, para fora dos muros da Mansão Queen.

Também não foi dessa maneira que eu pensei que conheceria Moira e Thea Queen, mas dadas as circunstâncias, aconteceu.

Eu já tinha visto fotos e vídeos circulando pela mídia, da mãe de Oliver, mas ao vivo ela era muito mais bonita do que as câmeras captavam. Era loira e altiva, transbordava refinamento e elegância.

Thea parecia como uma adolescente normal, mas se você parasse por mais de dois segundos para reparar, conseguia ver traços da Senhora Queen na filha.

Após o funeral, houve uma recepção na Mansão. De longe pude ver Thea e Moira recebendo as condolências de incontáveis pessoas. Senti-me desconfortável só de imaginar como deveria ser permanecer ali, recebendo palavras de conforto e sabendo que nenhuma delas jamais chegaria a confortá-las de verdade.

Oliver não quis participar da recepção, aliás, eu mal o vi durante todo o dia, e quando o vi, durante o sepultamento, percebi que ele não olhou uma vez sequer para o caixão do pai, não derramou uma lágrima, não falou uma palavra. Passei o dia me perguntando o por quê, até que enfim me dei conta de que as pessoas lidam com o luto à sua maneira, e que muito provavelmente esta era a maneira de Oliver tentar superar aquilo.

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