Queimando

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Estava sendo muito difícil cumprir a promessa que fiz à minha mãe no início da manhã de não me estressar com nada no trabalho, pelo menos por hoje.

Eram 16:18 da tarde, Felicity ainda estava trabalhando e eu tinha que dispensá-la para que ela pudesse estar pronta para o jantar beneficente de hoje à noite. Eu tinha que admitir para mim mesmo que uma das poucas coisas que realmente me animavam era estar curioso para vê-la fora de sua área de conforto. Mesmo sabendo que já tinha visto-a naquela noite na Verdant, eu não podia contar, pois estava tão bêbado que não conseguia lembrar de nenhum fragmento da noite.
Por semanas eu a vi trabalhar na organização do evento. Até perguntei à ela se não era trabalho demais, mas ela se negou a desacelerar.

O toque do celular me desperta, olho o visor e sorrio.

– Você por acaso usou o número daquela Meghan do Starling Jornal? – Tommy pergunta, sem cerimônias.

– Ahn... eu não lembro. – falei.

– Que novidade. – ele bufou.

– Por quê quer saber?

– Estou sem acompanhante. – falou ele, e depois acrescentou: – Ei, você se importa se eu convidar a Felicity?

Senti um gosto metálico na boca.

– Ela vai estar lá à trabalho. – falei, tentando soar ainda animado com a conversa, mas falhando.

Tommy ri.

– Bem isso não impede nada. – respondeu ele.

– Ela já vai como minha acompanhante. – retruquei sem pensar.

Silêncio.

– Vocês estão saindo? – Tommy perguntou, apreensivo.

Suspirei.

– Não. É só trabalho.

– Mas você bem que queria.

– Cale a boca, Merlyn, ou eu desligo na sua cara. – falei.

Ele riu.

– Certo, certo... vou continuar procurando.

– Tudo bem.

– Ah, e vê se não esquece, hein. – falou ele.

Franzi a testa.

– Do quê?

– De tomar um banho. – riu ele.

– Idiota.– falei, mas ri também.

Assim que desliguei o celular, meus pensamentos se voltaram para a pergunta: por que eu não concordei com Tommy levar Felicity como acompanhante? Eu não planejava levá-la e ele parecia interessado nela há semanas.

A verdade é que eu o conhecia e sabia que apesar do jeito educado e gentil que ele tinha, e apesar de ele ser o meu melhor amigo, Tommy tinha a mesma natureza que eu. Ambos adorávamos festas, bebidas e mulheres, e apesar de eu não estar praticando nada disso nos últimos tempos, ainda era parte de mim, e Felicity simplesmente não se encaixava naquele mundo. Ela não era como as garotas que eu e ele estávamos acostumados à pegar por uma noite e não sentir nenhum remorso. Sem falar que ela era minha funcionária, eu a via todos os dias e depois do ocorrido com meu pai, via-a como uma pessoa confiável, alguém que eu precisava manter por perto, ainda mais depois de tudo o que eu vinha descobrindo nas últimas semanas...

TrapaçaOnde histórias criam vida. Descubra agora