37 - Part of us

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(Larissa)

A dor me consumiu, e era grande demais para eu resistir. Quando percebi, já estava esticando as carreiras brancas e aspirando a sensação fabricada de prazer. Sentia a cocaína adormecer minhas dores enquanto eu me entregava à euforia.

Ela me fazia sentir invencível, mas era por pouco tempo, logo eu sentia a vergonha. Vergonha por não ter sido forte. De me perder cada vez mais. E de destruir o pouco que restara de mim. Também sentia medo, medo de nunca conseguir recuperar os pedaços que me faltavam de perder os meus cacos restantes para sempre. E de afastar de vez as pessoas que eu amava. Mas o pior era a dor que voltava em dobro depois que o efeito passava, arrastando-me para o abismo e me desafiando a pular cada vez mais alto. Até que um dia, eu receava, a queda não teria fim.

Deixei a água quente do chuveiro cair sobre mim e esfreguei o rosto com tanta força que eu me arranhava. Eu tentava me limpar de todas as formas, arrancando da pele a minha humilhação.

Mesmo de olhos fechados eu podia ver a expressão de desgosto que eu pusera no rosto de Ohana. Eu estava arrependida. Não queria que ela me visse daquele jeito. Eu nunca mais a sujeitaria àquilo, esconderia bem o uso a partir de agora.

— Ohana— chamei por seu nome ao ouvir um barulho baixinho vindo de fora.

Aguardei um pouco e, quando não obtive nenhuma resposta eu tentei novamente. Berrando alto o suficiente para ser ouvido lá debaixo, chamei por seu nome outra vez.

Ela disse que se juntaria a mim no banho, não foi? Mas já havia se passado muito tempo e ela ainda não tinha aparecido. Abri a porta do box e busquei por uma toalha, enrolando-a em volta do meu corpo ao sair para o quarto.

— Ohana? — Percorri os olhos rapidamente pelo cômodo, confirmando a sua ausência

— Amor, onde você está? — perguntei, atravessando a porta e caminhando até o início das escadas.

Então eu ouvi ao longe o som do motor de um carro e eu soube. Ohana tinha ido embora.

Mas aquilo não era possível, ela prometeu ficar! Ela prometeu! Corri escada abaixo, gritando por ela feito uma louca. Vasculhei todos os cômodos da mansão, e por último fui para fora, esquadrinhando cada canto.

A procurei como se por um milagre ela estaria à minha espera e tudo não passasse de uma brincadeira. No entanto, a verdade era simples. Ela se foi. Caí ao chão de quatro e, como um animal ferido, soltei um grito agonizante.

A culpa era minha, eu quebrei minha promessa antes, eu desisti de tentar. Mas eu precisava dela para seguir adiante! Ela tinha de voltar. Tinha! Não suportaria outra perda. Não quando finalmente os pedacinhos do meu coração estavam sendo remendados. Não quando eu descobri que era capaz de amar novamente. E droga, como eu a amava.

Corri de volta para dentro de casa. O movimento esticava a pele da perna que eu machucara ao cair no caminho, mas eu gostava daquela dor. Ela me distraia da outra que se instalara no peito. Busquei por meu celular e liguei para Ohana, seu número caía na caixa postal. Enviei mensagens dizendo que iria atrás dela, mas nunca foram visualizados.

Então, como última alternativa, liguei para o meu amigo. Eu precisava de sua ajuda para tê-la de volta, eu precisava de seus conselhos. Entretanto, as coisas que ele me disse não foram as que eu esperava.

"A deixe ir, Larissa". foi o seu conselho de merda. E emendou com alguma outra besteira de que ela voltaria se eu fizesse por merecer, porque não existia dúvidas de que Ohana me amava.

Se ela me amava, então por que foi embora?Soquei a parede do meu quarto e gritei em revolta, sentindo a porra da dor se alastrando dos nós dos dedos até o braço. Chorando, fui cambaleante até o outro cômodo e, sem ter razão para lutar, inalei fundo a única que permanecerá comigo.

A única que não me largava, nem quando eu queria. Minha odiada e amada Droga. A partir daquele momento eu me rendi completamente, já não existia mais nada a perder. Eu já havia perdido tudo e então, para completar, decidi perder a mim mesma.

Cheirei tanto que também perdi a noção do tempo e espaço. Uma hora eu estava deitada na cama, sentindo como se meu peito fosse explodir e eu estivesse finalmente morrendo. Outra eu estava na rua, esmurrando a porta de Ohana e pedindo para ela voltar. Mas, na maioria das vezes, eu estava na companhia da cocaína.

Tudo se passava em lapsos de lucidez. Minha consciência ia e vinha, mas de uma coisa eu tinha absoluta certeza. Por mais que tentassem, eu não ficaria com outra mulher. Não poderia nem se eu quisesse.

Eu ainda amava a Ohana, de corpo e alma. Até ousava dizer que ela possuía o meu coração, mas então eu me lembrava de que eu não o tinha mais. Ele havia sido completamente destruído, enfim. Afundei o nariz em mais uma carreira e abracei o esquecimento.

Era melhor não lembrar.

Era melhor não sentir.

Era melhor simplesmente me deixar levar.

Simplesmente deixar de existir.

THE BEAST  -  OHANITTAOnde histórias criam vida. Descubra agora