- Quero todos na posição da prancha abdominal por trinta segundos. - A voz do professor ecoa por toda a quadra coberta da escola e eu faço a maior cara de choro do mundo ao ouvir o que ele disse.
Finalmente é sexta-feira, o que significa que amanhã já estou livre desse inferno de escola, mas o dia acabou de começar já com o tempo de educação física.
Hoje eu acordei com uma dor no ombro horrível porque acabei dormindo em cima dele durante a noite.
Aliás, eu dormi bem rápido noite passada, ouvindo a voz de Freen cantando ao longe. Mas é claro que não esqueci de nada do que conversamos ontem, principalmente o comentário bizarro sobre a mãe dela. E isso acabou me fazendo ter um sonho estranho que acabei considerando como um pesadelo depois. Era Freen andando por aí na rua com um sorriso enquanto lágrimas caíam do rosto dela. Eu tentava falar com ela, mas ela não me reconhecia e eu ficava apavorada. Depois o sonho mudou para nós na festa de aniversário de Nop. Freen estava usando uma camisa de força, e o pior era que parecia que ninguém além de mim via isso. Isso me assustou um pouco na época, mas agora me aterroriza.
Enfim, eu pretendo conversar com ela sobre isso depois, talvez em outra ligação ou coisa do tipo. Perguntas desse tópico intimo cara a cara não são bem o meu tipo.
Quando acordei, meu ombro estava doendo muito e minha mãe disse que talvez isso tenha sido a causa dos meus pesadelos. Ela tem essa coisa de acreditar que podemos ter pesadelos - claro que não contei que meus pesadelos foram com Freen, na verdade, minha mãe nem sabe que Freen existe na minha vida, ainda no caso. - Nossos pés estejam descobertos e pegando frio e se dormirmos por cima do braço.
- Rebecca, prancha! - O treinador grita e eu me assusto, me abaixando e me apoiando nos antebraços e com as pontas dos pés.
Noey, do meu lado direito, faz o movimento com um pouco de esforço, pois seus tênis escorregam um pouco no chão da quadra. Irin, que está ao lado dela, fecha os olhos e parece que está bem concentrada. Eu estou tremendo mais do que uma vara, fechando os olhos e tentando respirar fundo. Todos os alunos ao redor parecem estar tendo igual dificuldade, e olha que pela contagem do professor não se passaram nem dez segundos.
- Escondi as facas, as tesouras e cortei as pontas de objetos pontudos. - Ao meu lado, Freen repetia a frase como um mantra, baixinho como um ronronar. Balançava a cabeça ao término de cada palavra e encarava o chão polido da quadra. Não tinha dificuldade alguma em se segurar com todo o peso do corpo nos braços e nas pontas dos pés.
- O que você tá resmungando ai? - Eu tento falar, mas minha voz sai toda estranha graças a força que estou fazendo.
Freen dá uma risadinha antes de responder.
- Tentando lembrar se eu tinha feito essas coisas antes de sair de casa. - Ela explica na maior normalidade. Mas que coisa é essa? Tem algum bebê na casa dela por acaso?
Eu tento falar, mas meus braços começaram a tremer com o empenho físico além do meu limite. Meu Deus, eu vou morrer. Meu abdômen parece que está pegando fogo e vai explodir a qualquer momento.
- Olha só, ela consegue se sustentar tão bem assim só com os braços. Significa que ela pode ficar em cima de você na cama sem te esmagar. - Noey murmura no meu ouvido com um sorriso de safada no rosto, completamente alheia à nossa conversa anterior.
- Deu! - O professor apita e eu desabo no chão soltando o ar que estava me matando dentro de mim.
A área da minha barriga parece que vai queimar e eu fico com a bochecha encostada no chão respirando fundo e tentando não idealizar nada do que Noey disse. Felizmente, a dor no meu ombro vai embora.