capítulo 28

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- Então, franja e cabelo claro ou mecha loira e cabelo cortado no ombro? - Irin pergunta animadamente ao retirar um vidro com algum produto de dentro de sua enorme bolsa de cosméticos. Logo em seguida ela retira também uma tesoura, colocando em cima da minha escrivaninha.

- Eu já disse que essa mecha loira tá fora de cogitação, não sou doida. - Volto a dizer, repreendendo essa ideia que Irin ainda insiste em trazer à tona. Ela faz um bico.

- Mas você ficaria tão bonitinha.

- Ela ia ficar tipo a vampira do X-Men. - Noey comenta sem nem nos olhar, concentrada em seu celular. Ela está jogada de qualquer jeito em cima da minha cama enquanto eu e Irin estamos há quase dez minutos num dilema.

- Eu quero tentar algo diferente, não algo feio. - Reviro os olhos para depois encarar Irin com tédio.

Eu sei o que isso parece. Parece que estou tentando mudar o cabelo porque terminei um relacionamento e minha autoestima foi abalada, por isso quero alterar a forma como me vejo e os outros me veem, já que o cabelo está diretamente ligado à minha imagem.

Errado. Primeiro que eu não estou encarando minha última conversa com Freen como um término. Prefiro pensar nisso como o famoso "estamos dando um tempo". Soa bem mais esperançoso na minha cabeça.

Você aí que está lendo sabe muito bem que já faz um tempo que eu pretendia dar um corte no cabelo já que estava ficando longo demais, porém estava pensando em que níveis de beleza eu poderia atingir se clareasse o tom do meu castanho e fizesse um franjinha, deixando a extensão das madeixas restantes ainda no mesmo tamanho. É isso que vamos descobrir.

Bom, Freen disse que eu deveria usar esse nosso tempo separadas para fazer algo que eu goste e viver a minha vida cuidando mais de mim mesma. Acho que dar um tapa no visual pode simbolizar isso.

Ah, Freen... Agora você já sabe o que aconteceu. Agora não tem mais nada de Rebecca do futuro ou avisos tendenciosos sobre que fim tivemos. Nesse momento, eu conto o que está acontecendo no meu presente: um grande espiral de dramas pessoais meus e dramas amorosos protagonizados por minhas duas melhores amigas.

Já se passaram duas semanas desde a última vez que vi Freen, andando corredor adentro com a Dra. Ella ao seu lado, me lançando aquele olhar final antes de se virar para enfrentar seus próprios monstros dentro daquela clínica. Desde então nossa casa tem ficado imensamente vazia, as noites de jantar voltaram a ser compartilhadas apenas entre três pessoas e já não tem mais as conversas enérgicas de antes.

Quando a tarde acaba, ela não aparece mais na porta com o uniforme do trabalho anunciando que acabou de chegar e agora seu skate permanece intacto perto da escada, esperando quietamente pelo dia que será usado pela dona novamente.

Eu durmo sozinha na cama que parece ter duplicado de tamanho, também não tenho mais com quem conversar à noite então apenas assisto séries a esmo na televisão até dormir sem perceber. Às vezes opto por ir encher o saco da minha mãe para poder dormir com ela quando papai passa a noite no hospital. Tudo voltou a ser como era antes de Freen, mas agora que já tivemos ela em nossas vidas tão de perto, percebo quanta falta ela faz.

Não sabemos muita coisa sobre o que tem acontecido, as visitas ainda não são permitidas na fase tão inicial do tratamento, mas daqui uma semana se Freen apresentar melhoras, ela poderá começar a receber. Eu não tenho nem como ficar ansiosa, porque mesmo assim não irei vê-la, mas ter notícias dela pela boca dos outros já vai ser melhor do que nada.

Devo confessar que uma vez ou outra ainda sinto vontade de chorar quando escuto a playlist maldita que ela me fez, fora as vezes em que acabo sucumbindo a saudade e fico horas olhando nossas fotos juntas no meu celular. Estou me torturando, eu sei, mas é um sofrimento meio reconfortante, se é que isso faz sentido.

O encontro de um dólar Onde histórias criam vida. Descubra agora