a estrada

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De dia a estrada deserta não é assustadora, é até bonita, com os raios de sol se infiltrando entre os galhos das árvores, consigo avistar casas ao longe e observo o vôo de um avião no céu, ao olhar novamente para a rua vejo Bianca a alguns metros a minha frente, com um lindo vestido branco e seu comprido cabelo escuro trançado nas costas, quando a chamo ela se vira sorridente e começa a correr em direção a cidade e por mais que eu tente a alcançar não consigo, ela está rindo  enquanto peço desesperado que espere por mim, pisco e estou sozinho na rua outra vez e a noite torna tudo hostil novamente. Escuto bips e minha mãe falando comigo em italiano, contando uma história que costumava me contar quando era pequeno, sua voz embarga e os soluços impedem que continue a história, me esforço para alcançar sua voz e a consolar, de repente não estou mais naquela rua e sim deitado, não consigo me mover mas sinto o calor de suas mãos segurando em meu braço, quero tanto me mover mas sinto minha consciência ir embora, como se estivesse caindo no sono.
Estou dormindo, quase acordando mas o sono é persistente, consigo ver minha irmã sentada ao meu lado, seu vestido amarelo se destaca nesse quarto branco, seu sorriso me conforta de um modo inexplicável, sinto um roçar em minha testa e sei que é um beijo de despedida, ela se levanta e passa pela porta, eu quero implorar para que fique ou me leve, preciso me mover e ir atrás dela, preciso ao menos conseguir gritar seu nome, começo a despertar, estou lutando contra a sonolência, abro os olhos e vejo minha mãe na poltrona ao lado, tento chamar por ela e minha voz soa fraca e rouca, minha garganta arranha de seca, quando consigo me mover sinto dor, choro aliviado quando ela abre os olhos e vem até mim, quando a enfermeira chega consigo perguntar sobre Bianca, fico agitado quando me dizem que ela não está ali e me apagam de novo.
A luz incomoda meus olhos quando os abro, dessa vez é como se estivesse acordando de uma longa noite de sono, sei que Bianca não está aqui e que tudo o que vi foi provavelmente um sonho, me lembro da festa, e me lembro vagamente do que aconteceu no carro. Minha mãe está feliz e aliviada por eu estar acordado e orientado, o médico disse que já posso ir para casa desde que mantenha repouso. Não quero ser ingrato ou algo do tipo, mas não estou feliz, se foi um sonho ou não eu queria ter ido com a Bianca, sinto como se ela tivesse me deixado de novo, mas no fundo eu sei que não poderia deixar minha mãe também.
É estranho cumprir o repouso recomendado pelo médico, apesar de bem dolorido e minha ferida não ter sarado, não vejo necessidade de passar todo meu tempo sentado ou deitado deixando que façam tudo por mim, até mesmo meu pai está me tratando assim, apesar de estar um pouco ferido e evitar ao máximo me dirigir alguma palavra. Me disseram que fiquei desacordado por algumas horas e depois os remédios fortes me deixaram sonolento demais por alguns dias, sinceramente não lembro de quase nada, tudo parece um longo sonho estranho entre estar naquela rua com Bianca e estar na maca. Hoje é meu segundo dia em casa e pelo visto vou ter mais alguns, e apesar de ser um pouco entediante, eu fico feliz por não precisar ver ninguém depois de toda aquela merda na festa. É claro que recebi várias mensagens, principalmente da Lou, mas disse para todos que estou bem e que logo os veria, e fui enfático ao dizer que não queria visitas por estar uma situação complicada aqui em casa.
- Querido? (Minha mãe chama ao abrir a porta do meu quarto) - Seus amigos vieram te ver.
- O que? (Digo pausando the plague tale) - Diz que estou sonolento demais para receber visitas.
- Por que você não quer nos ver? (Percy pergunta aparecendo ao lado da minha mãe)
- Não é isso. Só estou cansado ( digo forçando um sorriso fraco)
- Você já dormiu demais! Passe um tempo com seus amigos. (Ela diz escancarando a porta )
Percy entra de vez e se senta ao meu lado, Jason hesita mas logo se aproxima quando sorrio para ele, e o cachinhos escora na porta parecendo desconfortável.
- Entre e feche a porta, não quero meus pais nos escutando (digo com um tom meio mandão)
- Como você está? (O garoto ao meu lado pergunta abandonando seu ar despreocupado)
- Considerando tudo, acho que estou muito bem (digo dando de ombros)
- Nico, é sério (Jason me repreende)
- Estou falando sério, finalmente tenho algo interessante para dizer na carta para a faculdade. Eles não podem recusar um cara que teve uma experiência de quase morte.
- Você é impossível (diz o moreno sorrindo levemente e negando com a cabeça)
- Não brinca com isso! ( Will finalmente diz algo, mas seu tom sério me deixa um pouco nervoso)
Alguém bate a porta e ele desencosta dela a abrindo, meu pai entra de cabeça baixa e deixa um copo de água e uma cartela de comprimidos na mesa de cabeceira.
- Está na hora do seu remédio, e daqui a pouco temos que trocar os curativos ( informa e sai soturno assim como entrou)
Quando ele sai checo a hora e tomo um comprimido, faço uma careta e termino de beber a água.
- Sinceramente, sinto saudades da morfina.
- Para de falar besteira! Isso é sinal que você está melhorando ( Percy diz ao bagunçar meu cabelo)
- Tente você engolir um comprimido desse tamanho (digo emburrado ajeitando o cabelo)
- Pelo menos ele parece arrependido ( Jason resmunga)
- É, ele tem agido meio estranho (digo fazendo pouco caso)
Peço para eles escolheram algo para gente jogar, Jason e Percy estão discutindo sobre qual escolher, enquanto Will finalmente se aproxima de mim.
- Desculpa ter te deixado sozinho (ele diz baixinho quando se senta ao meu lado)
- Tudo bem (digo tentando transmitir conforto mas sem saber o que dizer)
- E desculpa não ter atendido sua ligação (ele diz olhando as próprias mãos)
- Você estava ocupado, eles também não viram que eu estava ligando (digo acenando com a cabeça para nossos amigos)
- Nico...eu vi, mas não quis atender (ele diz com a voz embargada e vejo ele fechar e apertar os punhos)
- Tá tudo bem (respondo engolindo em seco) eu tinha te deixado chateado e...
- Fui eu que te beijei (ele diz um pouco mais alto me interrompendo) e te deixei bêbado e sozinho, e não atendi quando me ligou, eu podia ter impedido.
Seguro seu rosto o levantando para me encarar, suas lágrimas descem silenciosas pela sua bochecha. Me inclino suavemente e lhe dou um selinho, é rápido e salgado por causa das lágrimas, mas é o bastante fazer meu coração falhar e que eu anseie por mais, ao me afastar vejo a surpresa em sua feição e fico feliz pelo cessar de seu choro.
- Não era você quem estava dirigindo (digo secando suas lágrimas) e agora fui eu quem te beijou.

 Solangelo Onde histórias criam vida. Descubra agora