não preciso ser protegido

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Tento abrir os olhos e vejo Bianca sorrindo para mim, pisco com as pálpebras pesadas e então vejo minha mãe aonde antes estava ela.
- Mãe? (Chamo com a voz rouca)
Ela se levanta apressada e vem até mim, tocando meu rosto e perguntando se estou bem.
- O que aconteceu? (Pergunto confuso olhando em volta)
- Eu é que pergunto (ela rebate de forma séria, me lembrando de quando ela me repreendia na infância por quebrar alguma coisa)
- Eu...briguei com alguém. (Digo tentando me sentar e me arrependendo imediatamente por ter me mexido)
- Em que lugar você foi, para levar uma facada em uma briga? É bom me contar essa história direito, Nicholas!
- Eu não sei...fui em uma festa e fiquei um pouco bêbado. Desculpa.
- Eu sei que você está mentindo! (Ela passa a mão no rosto e respira fundo) Você nunca foi de ir em festas e arrumar brigas. Quem foi que te esfaqueou?
- Eu não sei. Eu não conheço o cara, foi tudo muito rápido..
- Você vai insistir nisso? Então porquê a história da Hazel é diferente? Você sabe o quão assustada eu fiquei quando recebi uma ligação do Sr. Solace de madrugada me dizendo que estava te levando para a emergência? Por que você saiu escondido e levou meu carro? Por que você se machucou e a Hazel estava com você?
- Mãe...desculpa, eu tô bem agora! ( Respondo impotente)
- Por que você só não me conta o que aconteceu? Eu quero te ajudar, querido! Desculpa ter deixado ele te machucar, eu sinto muito. Eu só quero que você pare de se machucar. Não posso te perder!
Ver minha mãe chorando e não poder contar a verdade para ela acabou comigo. Mas ao mesmo tempo senti uma espécie de alívio pelo seu pedido de desculpas, não sabia que desejava ouvir isso, precisava ver que ela se importava. Porém, eu não posso entregar a Hazel, não sei qual foi a história que ela contou, mas não vou deixar ela ir para um abrigo.

Conversar com a minha mãe assim que acordei foi difícil, mas ser obrigado a dizer a verdade para os policiais foi ainda pior, depois que minha mãe me contou que Hazel admitiu que foi a sua mãe em uma crise, ficou impossível manter a minha versão. Estou com medo das consequências, não sei o que vai acontecer com ela e nem como isso pode afetar meu pai, estou me sentindo tão culpado que não tive tempo de sentir vergonha até o pai de Will entrar de jaleco no quarto.
- Você nos deu um susto e tanto, garoto! (Ele diz enquanto lê algo em uma prancheta)
- Me desculpa! (Digo baixo com vontade de conseguir sumir me misturando com as sombras do quarto)
- Não precisa se desculpar! Quer dizer, teria sido ótimo se você avisasse que estava ferido e que tivesse se apresentado como namorado do meu filho. Mas o importante é que você está fora de perigo.
- O..o que? (Minha voz soa estrangulada)
- Pois é! Eu fiquei com essa mesma cara quando você desmaiou na nossa frente, e meu filho entrou em desespero quando viu o sangue me pedindo para salvar o namorado dele.
- Ah ( é o único som que consigo exprimir nesse momento)
- Você teve muita sorte. Se tivesse sido mais fundo e um pouco mais para a direita você teria sérios problemas. Foi em um lugar complicado e você perdeu muito sangue, ainda bem que consegui estancar até chegarmos ao hospital em que trabalho.
- Ah.. obrigado (digo desconfortável sem saber o que dizer)
- Entendo você ter mentido, sua irmã nos contou tudo quando chegamos aqui. Só não entendo o que você pensou que iria acontecer, talvez não percebeu a gravidade ou estivesse em choque, mas se não tivesse ido até nós e perdido a consciência, bem...teria sido difícil ajudar meu filho a passar pelo luto.
- O Will...como ele está?
- Estou te falando que você podia ter morrido, e é isso que me pergunta? Jesus! A Rachel vai ter que aceitar a relação de vocês. Ele está de castigo e só vai poder te visitar amanhã. Não faça essa cara! Eu estou muito desapontado por ele ter encoberto o que estava acontecendo com você.
- Encoberto?
- Sim, Nicholas! Eu sei que ele não queria trair sua confiança, mas devia ter me contado que um amigo estava sofrendo abuso. Ainda bem que tudo já está sendo resolvido, ninguém mais vai te machucar!
- Como assim resolvido? ( Tento me sentar direito por estar nervoso com o rumo da conversa e preciso morder o interior da bochecha para não reclamar de dor)
- Não se mexa! Ainda vamos imobilizar seu braço. (Assinto e me deito com cuidado) Hazel nos contou sobre sua mãe, e ela já foi encaminhada para uma instituição. Mas houveram muitas perguntas quando a equipe médica viu seus hematomas, e eu fiz o Will falar. Por favor, não fique chateado com ele, eu posso ser muito convincente. Seu pai já foi intimado.
- O que vai acontecer com ele? Onde está a Hazel?
- Ela está sob os cuidados da assistência social, provavelmente amanhã poderá te visitar. E o seu pai vai ter que responder algumas perguntas, e você precisa fazer um exame chamado corpo de delito.
- Eu não vou fazer!
- Nico, não somos seus inimigos, só queremos te ajudar.
- Eu não quero. E nem dá para ver, já faz dias então já estão sumindo, não vai dar em nada.
- Se realmente não vai dar para comprovar nada, então não faz mal realizar o exame.
- Vocês não podem me obrigar!
Vejo ele passar a mão na cabeça e fechar os olhos respirando fundo, acho que sou realmente bom em tirar as pessoas do sério.
- William me contou sobre o acidente de carro, sobre você escondendo os hematomas com roupas longas, sobre você mandando ele ir embora quando ele disse que não podia deixar você continuar se machucando. Eu vi o sentimento de desespero e impotência nos olhos dele enquanto me contava. Meu filho te ama, e eu quero muito proteger quem ele ama. Por favor, me deixa te ajudar!
- Eu não preciso ser protegido!
- Não sei se você já olhou em volta, mas esse é um quarto de hospital. E você já esteve duas vezes em um desses nos últimos meses.
- Eu...eu não preciso de ajuda. Eu já voltei a morar com a minha mãe, e... Perséfone foi internada. Está tudo bem!
- Seu pai tem a guarda compartilhada!
- Daqui a alguns anos eu vou ter maioridade, ok? Ele não precisa ir para cadeia, ele só precisa de ajuda!
- Nico... (Ele me olha com um olhar cansado e de compaixão) Eu sei que você acredita nisso, mas o álcool não muda totalmente a personalidade da pessoa, ela só faz o que já pensava em fazer. Ele te machucou e te fez acreditar que você podia ajudar ele. Seu pai é um homem adulto que deve tentar melhorar e se tratar sem agredir o filho para isso.
Desvio o olhar e me concentro para não chorar na frente dele, eu não entendo porquê preciso continuar deixando a vida de todo mundo difícil.
- Ele me ama ( respondo depois de um momento e não consigo impedir uma lágrima de escapar)
- Só...pensa na nossa conversa e tenta descansar um pouco.
Ele diz da forma mais gentil do que já falou comigo até o momento e sai do quarto me deixando sozinho para lidar com a confusão que estou sentindo.

 Solangelo Onde histórias criam vida. Descubra agora