não volte para casa

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É meio engraçado ou só triste eu estar tão ansioso para visitar a minha mãe? Finalmente o dia chegou e sem me tornar consciente, alimentei uma certa ansiedade sobre isso. Quero que ela pense que estou bem, não quero sentir que estamos distantes, e principalmente não quero que ela me olhe decepcionada de novo.
Paro em frente a casa e observo a fachada do lugar em que vivia, é tão estranho pensar em como tudo é familiar apesar do pouco tempo em que vivemos aqui, e mais estranho ainda querer me certificar de que nada mudou.
Minha mãe me recebe com um sorriso radiante e me abraça, afundo no seu calor e cheiro. Depois de um momento nos separamos e eu posso observar como ela parece bem, ela me olha com um certo olhar analítico antes de informar que fez cookies.
Fico feliz em informar que as coisas parecem iguais, tirando o Nut, um gatinho preto que ela adotou, ela diz que ele se parece comigo, não vejo como, mas me alegro por ela pensar em mim.
Ficamos conversando como nunca antes, ela me contou algumas coisas, como o fato de ter voltado a trabalhar, e eu também contei algumas, com uma certa pressão dela, mas me senti confortável, contei até sobre meu término, e sua reação foi de preocupação em como eu estava e não de alívio como eu tinha imaginado. Ela não ficou particularmente feliz quando contei sobre Perséfone, mas reagiu melhor do que imaginei. No geral, ela parece mais centrada e leve, fico feliz de ver como ela está bem, porém um pensamento de como eu atrapalhava a sua vida tenta se infiltrar na minha mente.
Estamos vendo um filme juntos quando meu celular apita com várias mensagens de Hazel me dizendo para não ir para casa. Fico confuso com isso, as coisas estavam razoavelmente bem em casa, o que pode ter acontecido? Me afasto e tento ligar para ela, no quinto toque finalmente sou atendido.
- Haz, o que está acontecendo?
- Não vem para casa hoje (escuto som de coisas quebrando)
- O que foi isso? Você está bem?
- Estou... Nico, eu fiz besteira.
- O que você fez?
- Ela voltou a usar...e ela estava indo tão bem. Eu sei que não devia, mas eu joguei as drogas fora.
- Que merda, Haz!
- Ela descobriu e simplesmente surtou. Eu me tranquei no seu quarto, e torci para alguém aparecer logo. Então Hades chegou e eles continuaram brigando. Ele abriu a porta e começou a perguntar onde você estava...e ela ainda queria me pegar. Eu estava com medo e...falei que foi você. Me desculpa, por favor.
Escuto seus soluços na outra linha e seus constantes pedidos de desculpa, fico desacreditado tentando imaginar aquela mulher com tanta raiva ao ponto de amedrontar Hazel e fazer ela me entregar.
- Hazel! (Chamo tentando fazer ela prestar atenção em mim) Você está bem?
- Sim,eu...eu estou bem.
- Como Hades abriu a porta?
- E..ele arrombou (ela choraminga)
- Filho da puta! Escuta...se você sentir que eles podem querer te machucar, saia de casa. Você tem algum lugar que pode ir hoje?
- Acho...acho que posso tentar.
- Faz isso! Você está machucada?
- Não, eu..eu estou bem. Me desculpa, Nico!
- Está tudo bem. Só...só sai daí, e me manda mensagem contando tudo que está acontecendo.
  Ela desliga e seguro o celular com as mãos trêmulas. No fundo eu sabia que isso podia acontecer, mas ainda assim estou surpreso. O que podia ter acontecido com ela se não tivesse me culpado? Como eu vou voltar para casa?
Levo alguns minutinhos para me acalmar e mais alguns minutos para ter coragem de pedir para ficar aqui essa noite.
Ela me pergunta o que está acontecendo, mas ao me olhar um pouco não insiste e diz que eu sempre posso ficar aqui. Agradeço e basicamente me tranco no meu antigo quarto, mando várias mensagens para Hazel e me seguro ao máximo para não ligar, porque se ela estiver saindo escondida eu posso estragar tudo e porque eu não quero que meu pai atenda. 
Sinto que não posso respirar, vários cenários horríveis passam pela minha cabeça e penso que não posso fazer nada para impedir. Até que ouço batidas e me apresso em tentar me recompor para abrir a porta. Minha mãe me entrega roupas de cama e pergunta se quero jantar, minha garganta parece se fechar com a simples menção, mas me esforço para dizer despreocupadamente que não estou com fome.
Deitado em meu antigo quarto e encarando um teto que não está descascando e parecendo que vai cair na minha cabeça, eu poderia me sentir bem, se não fosse pela preocupação com Hazel e o medo do que me espera. Abro as mensagens desesperado quando ele apita, com mensagens de Hazel dizendo que está com Frank, o namorado secreto dela, respiro aliviado e começa a tentar dormir.
Um bom tempo se passa até eu adormecer, acordo de tempos em tempos com sonhos proféticos ruins sobre meu possível futuro, mas me forço a voltar a dormir. Quando acordo lá pela décima vez, vejo que tenho uma nova mensagem.
- Estou com saudades.
Leio essa simples frase várias vezes e sorrio em todas elas, pelo menos essa madrugada inquieta me trouxe esperança em relação ao Will.

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