Cap 25 - O Envelope Azul

20 2 29
                                    

Ella caminhava pelo pátio norte da Sociedade de Gala. O ar fresco da manhã preenchia os pulmões, empenhando-se em oferecer uma sensação de paz. Repleto de flores variadas, o jardim festejava ao lado, alheio às intemperanças da vida.

Sem rumo certo, a galaceana vagueava com os pensamentos focados em Jalef e o Conselho de Glacídeo. Os rostos de Marguel e Zincon também insistiam em aparecer, em relances nada agradáveis.

Uma lista de situações e cenários pinicava a mente feito abelhas agressivas em ataque. A Cerimônia dos Doze, a condecoração dos guardiões, a reunião com os conselheiros, a entrega dos envelopes azuis... O coração guerreiro palpitou com a lembrança desse último. Os eventos se atropelavam, num ritmo difícil de ser diluído.

Ella sacudiu a cabeça, como se bastasse para se desvencilhar da tontura que debilitava o corpo. Uma náusea intensa assumia as entranhas, com o território inimigo se avolumando à frente. Dentro dele, um homem de sorriso corrosivo, dava-lhe calafrios ao acenar com a mão.

_Isso não pode acontecer em hipótese alguma! – Resmungou, ao imaginar Traium vitorioso, caso falhassem na investida. Os punhos preservavam-se numa bola firme, prontos para soqueá-lo. – Nós vamos seguir o plano à risca. É só manter a calma.

Ao notar as flores estacionadas no jardim, agitarem-se sem uma explicação razoável, sentiu uma inquietação brotar no peito. O vento, os pássaros, as conversas, ausentavam-se no passeio solitário. Tudo estava calmo. Calmo até demais. Foi quando, sem pedir licença, uma sombra engoliu o colorido da paisagem. A guardiã encarou a nuvem, numa mescla de curiosidade e medo infantil. Aquilo era um mau presságio, diziam as escrituras.

Mantendo-se em alerta, inclusive com os olhos, dilatou os ouvidos sensíveis. Logo, um vaivém de risadas sarcásticas, misturadas a gritos melancólicos a atingiu como um choque. Seus pelos ouriçaram e a respiração estremeceu.

Buscou controlar os sentidos ao analisar o ambiente, já que a imaginação fértil a assolava por dentro. De fato, descobriu-se só. A exceção era uma massa intrusa e cinzenta, a espreitando de cima, feito um gigante disposto a engoli-la, caso merecesse.

Onde estão todos, afinal? – Questionou, assim que retirou a adaga da cinta. A vista apertada varrendo o lugar após se posicionar atrás de uma pilastra favorecida.

A caminhada salutar lapidava-se a uma excursão arredia e delicada. Dessas interessantes de início, porém com um desfecho desgastante. Para acrescentar, um barulho rítmico e insistente juntou-se ao cenário, alimentado o nervosismo da guardiã. Não havia nada de ameaçador no jardim, entretanto, além dos pensamentos femininos. Jalef e os conselheiros, as fugas, os banimentos, o roubo das chaves-peça, o espertalhão do Tolk...

Esforçando-se em desocupar a mente que rodopiava em um espiral eterno, Ella massageou uma das têmporas. O ruído merecia concentração total, pois a cada par de segundo, se intensificava. A sensação era de tê-lo nas mãos.

Num breve momento, pôde senti-lo esfriar a espinha e vibrar todos os grupos musculares. Quem ou o que era responsável, não conseguiu decifrar. O dia escurecera sobremaneira com a nuvem colada acima da cabeça.

Percebeu o corpo suar frio, ao se distrair passando o dorso da mão na testa. Foi então que algo ou alguém chacoalhou a ombreira de metal.

_Quem está aí? – revidou a mulher no grito, girando em torno da pilastra num único pulo. – Apareça!

As pupilas dilatadas lutavam em desvendar a charada, enquanto a faca alfinetava o ar. Não soube definir o tempo gasto naquela posição de ataque. Logo baixou a guarda, contudo, ao constatar a coerência na solidão.

Galácena E Os EscolhidosOnde histórias criam vida. Descubra agora