CAPÍTULO DEZENOVE

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"O show deve continuar, apesar de por dentro meu coração está quebrado."
- The show must go on, Queen. -

°°°°°°

Alina se arrastava pela cidade de volta para casa, a cabeça abaixada e os ombros caídos, como se ela estivesse carregando um peso invisível nas costas.

E a sensação era exatamente essa, um peso escrociante sobre a coluna e um cansaço que empurrava seus ombros. Cada passo doía tanto que Alina nem percebia os olhares nada discretos dirigidos a ela, olhares que se alternavam entre repulsa e pena.

Só percebeu que alguém a encarava fixamente quando uma mão segurou  seu braço e a acordou da mente frenética, em que tentava pensar desesperadamente em uma saída.

- Oi. - uma voz hesitante, tímida e familiar que a fez se virar, encontrando os olhos castanhos de Reina com uma surpresa que lembrava muito irritação, e a garota retirou a mão.

- Oi. - Alina respondeu, mudando rapidamente a expressão surpresa e esperou que Reina dissesse mais alguma coisa, porém a garota ou era retraída demais ou só estava deixando que as pessoas passassem por elas e as deixassem a sós.

Então o beco ficou vazio e Alina ergueu as sobrancelhas, observando  Reina com um toque de impaciência enquanto a garota enrolava uma mecha do cabelo escuro, encarando os próprios sapatos que raspavam no chão e pigarreando antes de falar:

- Então, é que eu... HM... - Alina suspirou e conteve a vontade de revirar os olhos, a adolescente corando quando o silêncio ficou longo demais entre elas a medida que ela tentava encontrar as palavras.

- Você?... - Alina encorajou, ansiosa para voltar para casa e se enfiar debaixo da água quente, até se lembrar de que Olivi não estaria lá quando ela chegasse.

- Eu ouvi o que você disse quando saiu da sala. - Reina finalmente falou, as palavras saindo atropeladas  e Alina  franziu a testa para tentar compreender o que Reina queria dizer.

- Acho que você e metade da cidade me ouviram. - Alina soou brincalhona e Reina corou com mais força, dando uma espiada rápida no rosto de Alina para conferir se ela falava sério.

- Sim, bem, é que... Eu... Nós... Percebemos que você estava certa quando disse aquelas coisas, e... HM... Todos saímos de lá assim que os oficiais nos liberaram, mas não pretendemos voltar amanhã. - ela parou de raspar a sola do sapato no chão e fitou Alina nos olhos, ainda meio hesitante, mas Alina conseguiu enxergar ali o que ela própria sentia, o que não parava de ferver dentro de si desde que saíra da mansão Fox.

Indignação, raiva, determinação.

- Nós quem? - Reina torceu outra mecha do cabelo e a atenção de Alina se voltou para seus dedos que brincavam com um pingente exótico  antes escondido por dentro da blusa.

- eu e todas as outras pessoas que tem alguma conexão com as crianças desaparecidas. Nós... Nós achamos que você tem razão sobre os Fox estarem só... Só nos fazendo de idiotas, e queremos fazer nossas próprias buscas. E HM... Eu queria saber... Me pediram para te perguntar... Se você quer se juntar a nós. - Alina quase sentia vontade de rir com o nervosismo óbvio da garota, mas que também a deixava desconfiada.

Entendera mais ou menos o que Reina estava lhe propondo, e depois da recusa de Thomas aquela proposta era ainda mais tentadora. Mas o fato de Reina custar tanto em lhe dizer apenas aquilo a intrigava, apesar da adolescente não ter motivos  para montar uma enrascada para Alina, e sobretudo Reina parecia ser mais extremamente tímida do que uma impostora seria, apesar dela não ser tão tola ao ponto de se enganar pelas aparências.

Contudo a ideia de Reina, retraída e inteligente estar lhe  enviando para uma emboscada não era sólida o suficiente, e  se fosse, Reina era uma péssima mentirosa.

E de qualquer jeito Alina estava desesperada demais para rejeitar algo daquele tipo, e mesmo refletindo por longos minutos naquela ideia ela se surpreendeu consigo mesma ao concordar:

- E Por que vocês acham que teremos mais sucesso do que os Fox e seus oficiais? - o rosto de Reina se iluminou e seus olhos brilharam,  pegando Alina de surpresa.

A garota agarrou com mais força o colar exótico em seu pescoço, como se o colar dependesse da resposta que daria a seguir:

- Eu tenho uma coisa... Algo que eu acredito que realmente possa nos dar uma vantagem. - a frase pareceu esperançosa demais aos ouvidos de Alina, algo muito incerto, quase um provavelmente, e mesmo assim ela já sabia que estava dentro mesmo que reina não tivesse resposta para sua pergunta.

- Se é assim, pode contar comigo. - Reina levantou o olhar, parecendo tão chocada quanto a própria Alina e a garota quase abriu um sorriso, mas Alina supôs que os músculos faciais de Reina estivessem tão doloridos pelo desuso quanto os dela.

- Então você... Vai? - Alina a sentiu e jurou ver reina suspirar de alívio, apertando os dedos contra o pingente do colar e fechando as pálpebras por um instante, as abrindo novamente com um brilho revigorado, analisando Alina como se ela tivesse feito um grande favor.

- Obrigada... De verdade. - Reina se aproximou e por um momento atordoante Alina pensou que a garota fosse abraçá-la, mas reina apenas inclinou o queixo para cima para igualar o olhar das duas.

- Nós combinamos de nos encontrar amanhã cedo no bairro cultural, Roberta Young tem uma barraquinha lá de artesanatos e vai nos receber para... HM, resolvemos o que fazer primeiro. - ela se atrapalhou enquanto se afastava, parando a alguns passos e mordendo o lábio Como se quisesse dizer mais.

- Vou estar lá. - Alina também se afastou e dobrou a esquina do beco escuro, parando quando a voz tímida a chamou de novo:

- E... Alina. - ela mordeu o lábio com mais força antes de soltar. - Obrigada... De novo. Nós vamos precisar de alguém com coragem como você para que isso tenha uma chance de dar certo. -  após concluir aquilo Reina se distanciou com mais pressa, como se não quisesse ver a reação de Alina após o  que acabara de falar.

Mas tudo o que Alina fez foi ficar parada onde estava, se perguntando porque aquela garota que devia ser três anos mais nova que ela a achava corajosa, e se as pessoas que Reina mencionara também tinham essa impressão dela.

Se tivessem, não poderiam estar mais erradas a seu respeito. Pois, se haviam pessoas encarando o que ela fizera na casa Fox como um ato de coragem, não tinham percebido que Alina só fizera aquilo porque estava morrendo de medo, porque estava afundada no desespero até o pescoço.

A cidade das Lendas. (Darkfalls Número 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora