XII - Supressão

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A gente saiu do prédio e basicamente seguiu o barulho da música. A gente chegou num espaço fechado, mas a céu aberto, como se fosse um pequeno estádio. Os seguranças nos revistaram e deixaram passar. 

Queria muito entender como essa festa ficou pronta com umas horas de planejamento.

A primeira coisa que reparei foi que assim que adentrei o espaço, senti um estremecer do corpo. As colunas tinham um bass tão potente que fazia vibrar até meus pulmões, e para misturar a salada, música estava num volume ideal para perder a audição, sufocante de uma forma que nem conseguia ouvir a minha voz. 

Um monte de gente vestida igual à Viviane cruzavam com a gente, e muitos transportavam copos com algo que eu acho que era sangria, mas que não consegui ver direito. As luzes intermitentes e coloridas faziam o cenário desaparecer por alguns momentos, reaparecendo de outra forma, como se fosse um holograma falhando. 

O ambiente no geral estava com o ar meio pesado, abafado, também porque havia muita gente fumando beques bem compridos, como os porros andorranos. Vivi estava segurando minha mão esquerda, mas mesmo virando para onde achava que ela estava, não conseguia enxergar nem sinal dela. Apertei e puxei entre a multidão com mãos apalpantes para uma área mais calma, mas ainda assim bem barulhenta. Quando olhei para ela, disse que ia pegar qualquer coisa para a gente beber, ou algo parecido com isso.

Senti que tinha de me improvisar uma dancinha, mas comecei apenas dando alguns passos para os lados, para não ficar parado. Com passos cada vez mais largos, mais enérgicos, comecei a trombar com casais em cenas de beijo dignas de novela, então me afastei ainda mais de onde estava, procurando por tanta ou até mais paz — mesmo numa festa. 

Do nada, senti uma forte necessidade de ir ao banheiro, mas não podia até a Viviane chegar. Demorou uns dez minutos, mas apareceu com "o melhor que dava pra fazer com vodka e Sprite". Dei um gole, e o trago amargo desceu pela minha garganta como uma bola flamejante. Não ouvi, mas vi que ela estava rindo da minha tentativa de não fazer careta. Entreguei o meu copo a ela e disse que ia despejar o que estava ocupando espaço desnecessário.

Foi difícil para encontrar o bendito banheiro. A quantidade de casais se beijando foi aumentando, bem como a quantidade de sacos herméticos esbranquiçados no chão. Havia um holofote branco focando o caminho, provavelmente para que quem estivesse bêbado não caísse e conseguisse chegar ao banheiro. 

Depois de trocar aquele olhar meio de lado com gente que eu não conhecia, um em específico me prendeu. Primeiro, porque ficava no meu caminho e não parecia querer sair. Segundo, porque era o da Luana. 

Repetia a mim mesmo que era o da Luana até soar impactante. Senti as batidas cardíacas aumentando o ritmo e a secura na boca. Estava até pigarreando, pensando numa forma de abordar ela suavemente. 

Mas, contra todos os meus instintos, lembrei do que disse o Denilson: se conseguisse o equilíbrio certo entre o ignorar e o respeitar, despertaria a atenção dela. Mesmo não botando fé, lá estava eu experimentando a teoria. 

Minha barriga começou a andar às voltas, e o ar não entrava direito nos pulmões. Isso tinha tudo para dar muito errado. Ela podia simplesmente agradecer porque o garoto com vergonha tinha parado as investidas. Ou nem reparar. Então tem que ser agora que preciso de começar a aceitar que talvez minha mãe tenha razão em relação a ela, que talvez eu deva largar essa obsessão adolescente e seguir em frente. Seguir para a Aurora. 

Inspirei fundo. 

Tudo bem, Gabriel. É só ignorar alguém.

À medida que ia chegando perto, seus olhos iam passando e repassando meu corpo com alguma incredulidade bem mal disfarçada. Focou especificamente nos meus olhos, não escondendo a surpresa no rosto. Inspirei fundo, esbocei um sorriso de lábios juntos e passei por ela. Sem frases sem sentido, sem querer encher linguiça, nada.

Olho de ÂmbarOnde histórias criam vida. Descubra agora