Nunca pensei nisso, mas quando durmo de pernas cruzadas, tenho sonhos horríveis. Os pesadelos com a minha avó têm sido cada vez mais constantes, mas não sei o que podem significar. O psicólogo dizia que de vez em quando podia ter um ou outro com mais frequência, então não era nada com que eu precisava me preocupar.
Cinco. Da. Manhã.
Tentei adormecer outra vez, mas não consegui. Merda, merda, merda, merda...
Por fim, bufei, levantei e arrumei minha cama. Peguei uma toalha da mochila e sabonete e tomei um banho de água quente, para ver se ajudava no humor. Olhei para a cama do Denilson, e estava vazia. Duvido que tenha dormido aqui.
Botei um desodorante, que estava dando seus últimos suspiros, e saí do quarto. Encontrei Dante esmurrando o ar e fazendo expressões estranhas com a cara. Parecia um completo lunático. Assim que me viu, corrigiu a postura e pigarreou.
— O que você viu? — Perguntou de imediato. Sua voz estava menos grave que ontem.
— Nada de mais.
— Sua resposta é a ideal. — E piscou o olho para mim — Tão cedo acordado?
— Não consigo dormir mais.
— Como é seu nome mesmo?
— Gabriel.
— Gabriel... vou anotar agora, senão esqueço.
— De boas.
— Quer dar uma volta pra conhecer tudo?
— Preciso não. Vou ao refeitório.
— Pô, cara, você acordou cedo pra caramba. O refeitório só abre daqui a trinta minutos.
— Então...
— Cinco e quarenta e cinco, cara. Cedo demais mesmo. Aproveita para passear, sabe? Ou conhecer o bloco onde você vai ter aulas.
Saí andando devagar. Não estava tão frio como há dois dias, mas o suficiente para que eu não me sentisse confortável com a roupa que estava usando. O céu estava lindo, com um tom de azul-marinho com um gradiente de um branco-amarelado no horizonte, interrompido pelas árvores em volta do bloco, provavelmente o bloco mais verde do espaço; não vi blocos tão rodeados por plantas como esse.
Tentando evitar mais perdas de tempo, fui logo andando para o refeitório, com as portas sendo escancaradas à minha frente. Seria o primeiro cliente. Fui e pedi pão com omelete e suco de laranja. O básico mais barato que havia. Sentei numa mesinha bem afastada, bem discreta, justamente para evitar ter que falar com as pessoas.
Porém, um perfume que eu reconhecia passou voando pelo meu nariz. Estava numa luta interna tão intensa para tentar lembrar de onde tinha sentido que não reparei que já tinha companhia.
— Você não precisa falar comigo. Só não gosto de comer sozinha. — Comentou. Eu sei que já tinha ouvido essa voz também.
— Veio bem cedo para quem não gosta de comer sozinha. — Respondi concentrando o olhar no pescoço dela. Mesmo quando ela mexesse a cabeça, não havia linhas. O olhar desceu uns andares para os protuberantes seios. Ergui o olhar logo em seguida para não lidar com presenças indesejadas.
— Isso não altera o facto de não gostar de comer sozinha.
— Mas...
— Eu sei, é estranho. A gente não pode fazer sempre sentido. Deve estar pensando "é cada cracudo". — Forçou uma risadinha, e simplesmente correspondi. Havia qualquer coisa nela que me deixava pouco tranquilo.

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Olho de Âmbar
RomanceQual o efeito de uma promessa quebrada numa pessoa? Para Gabriel, uma promessa quebrada significou a perda de uma estrela. Significou a modificação dos seus laços com todos que o rodeavam, tanto através do afastamento como da aproximação. Para Luan...