XVI - Reinício

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Acordei num quarto diferente. A pintura era essencialmente semelhante, mas até o cheiro do quarto era diferente. O quarto estava meio escuro pela reduzida abertura da janela. Comecei a piscar mais frequentemente os olhos, para afastar a sonolência e me certificar de que não estava a sonhar.

Sentei na cama e procurei meus chinelos. Inutilmente, porque adormeci com os sapatos em cima da cama. Arregalei os olhos e estiquei os braços para poder descalçar.

- Não é grande problema, não te preocupes. Pelo que vi, a sola não estava suja com lama. E desde que não me lixes os lençóis, podes até vir de bicicleta. - Comentou a garota reparando na minha preocupação.

- Eu... dormi?

- Estiveste a dançar. - Brincou, arrancando um sorriso do meu rosto.

- Não queria dar trabalho. Eu vou já saindo. - Quase a levantar, ela pegou no meu pulso.

- Calma. Não via ninguém chorar como tu desde... sempre? Fiquei no início preocupada, mas não estavas em condição de me responder o que se passava contigo.

- Obrigada por tudo, mas eu nem sequer sei o seu nome.

- E já nos encontrámos um punhado de vezes. Prazer, Madalena. - Esticou a mão, e eu apertei.

- Luana.

- Podes me dizer se há algum perigo? Se é algum problema familiar? - Esperando uma resposta, permaneceu em silêncio. Não disse nada - Não preciso que me digas exatamente o que se passa. Quero é saber se vais ficar bem. - A longo prazo, vou. Em termos lógicos, é impossível uma situação se manter a mesma para sempre. Demorando mais ou menos, pra pior ou pra melhor, vai mudar. Acenei com a cabeça. Ouvimos duas batidas na porta.

- Já vai. - Madalena levantou e foi para a porta a abriu. Lá fora, Gabriel e Vitória estavam esperando.

- Madalena? Você tá ficando aqui?

- Gabriel! Pois, mudei-me recentemente. Um bocadinho antes do primeiro dia de aulas. - Madalena conhece o Gabriel?!

- Legal.

- Só que não foi para isso que fui convencida a deixar você entrar, rapaz.

- Sei. Por acaso você divide quarto com Sandra ou Luana? - Olhou para trás e apontou discretamente com a nuca para a porta. Abanei a cabeça.

- Não. Porquê?

- Faz três horas que tô esperando por uma delas, que disse que ia ter com a outra. Mas agora não dá sinal. Fiquei preocupado, tive que convencer a monitora a me deixar entrar para saber se tavam aqui.

- Como é que sabes que elas estavam aqui?

- Não sei. Uma vez, Sandra tinha dito que ficava no C4, e não lembro se tinha dito sete ou seis.

- Não vi, desculpa.

- Só a Sandra. - Completei. Me aproximei da porta, ficando do lado da Madalena.

- Luana, você... - O sorriso no rosto dele se desfez ao olhar para mim, e ficou assim durante segundos longos demais. Corrigiu a postura, e vi que tentou colocar a mão no meu rosto. - Certo. Valeu, Vitória. Vou procurar em outro lugar. Fiquem bem.

Fechei a porta e "escorreguei" nela. Inspirei fundo e tentei usar o meu semblante mais neutro possível.

- Ele é o seu problema?

- É. E a própria Sandra também. - Madalena ficou olhando para o teto, como se estivesse fazendo cálculos mentais.

- Eles não são o mesmo problema. Se ele veio atrás de vocês duas, ela é o problema maior. Não sei se o que eu disse faz sentido.

Olho de ÂmbarOnde histórias criam vida. Descubra agora