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Devia ser um dia feliz  para Juliette,  assim como era para tantas outras jovens.

Todas as jovens sonham com um casamento.  Planeiam durante meses, a cerimónia,  a decoração da igreja, os convidados,  os convites, os padrinhos, a música e principalmente o vestido.

Com ela não foi assim.  Cursava o segundo ano de enfermagem e sonhava apenas com o dia em que poderia exercer a sua profissão.

Juliette nasceu numa família normal.  Os pais eram apaixonados e quando ela nasceu foi um dia muito feliz.
Viveram os três uma vida de muito amor e dedicação até chegar a terrível doença que levou Catarina a mãe de Juliette.

Juliette sofreu muito assim como o seu pai.
Empresário bem sucedido no  ramo da aeronáutica, passou a viver exclusivamente para o trabalho deixando Juliette entregue a si própria.  A essa altura ela prestava provas para admissão à faculdade e os estudos ocupavam todo o seu dia.

Dois anos se passaram.

Orlando Soares, pai de Juliette,  conheceu Elisa Moreno.

No seu tempo de juventude,  Elisa era acompanhante de luxo o que lhe permitiu sempre viver com algum conforto.  Hoje, vive com a filha Sara de 22 anos que não faz nada da vida.  Gosta de luxo, vive enganando alguns trouxas que se encantam pela sua beleza artificial.

Orlando foi apresentado a Elisa e saíram por diversas vezes.

Hoje eles são casados e vivem na casa de família onde Juliette sempre viveu.

Apesar de ao principio ter sido contra o casamento,  depressa percebeu que o pai estava completamente iludido por Elisa.  Desistiu e deixou andar.

Por conta dos estudos,  Juliette vivia muito pouco em casa, mas o pouco tempo que estava, era notório o mau ambiente entre as mulheres.

A madrasta não gostava dela e fazia de tudo para que o pai também ficasse contra ela.

Sara era invejosa e queria ter tudo igual a Juliette.   Vivia invejando os seus vestidos, bolsas e acessórios.

Apesar de Juliette não querer,  o pai insistia para que ela partilhasse as suas coisas com Sara.
Na frente dele Sara era sempre uma vítima de Juliette.

Há já um bom tempo que Orlando lutava com problemas nos negócios.   As quantias avultadas que ele dava à esposa sempre que ela pedia, levaram a uma descapitalização da empresa.

Para Elisa, o dinheiro nunca era demais.  Vivia exigindo cada vez mais e Orlando sempre fazia a sua vontade e a vontade da enteada.

Juliette tinha as suas próprias economias, fruto da herança da mãe.  Felizmente o pai teve o bom senso de lhe dar a sua parte quando ela morreu.  Até isso Sara invejava, já que ela e a mãe não poupavam nada e não tinham nenhum bem a que pudessem chamar de seu.

A vida levou Orlando também para o mundo do jogo.  Era normal encontrá-lo numa mesa de poker em algumas salas de jogo clandestinas.

Uma coisa leva a outra e a falência veio.  Orlando havia perdido tudo em poucas horas de diversão.  Assinou várias promissórias as quais sabia nunca conseguir pagar.

Elisa durante o café da manhã exigia mais dinheiro ao que Orlando respondia não ser possível.

- Pai, eu preciso.  Tenho uma festa e estou sem roupa e sapatos, disse Sara.

- E eu preciso ir ao salão de beleza retocar as minhas rugas.

- Não tenho.  Acabou.  Estamos falidos!

- Como, falidos?

- Falidos, sem cheta, sem dindim.

- Não é possível, Orlando.   De que vamos viver.

- Procurando trabalho, os três.

- Trabalho?  Eu nunca trabalhei. Diz Sara.

- Mas estás na idade.  Vives uma vida  de luxo, Mas nunca soubeste o que é trabalhar.

- A minha menina nunca precisou.

- Pois agora é necessário.

- E a tua filha?  A Juliette também vai trabalhar?

- Ela está a estudar.

- Então tu é que és o homem da casa, resolve esse problema.  Nem eu nem a minha filha vamos trabalhar.

- O pouco dinheiro que sobrou dá para as despesas básicas de um mês.
Depois disso, não sei o que será daqui nós.

Um mês depois Orlando recebeu a visita da pessoa a quem assinou as promissórias.  O prazo terminava em uma semana.

Álvaro,  assim se chamava o homem detentor das promissórias,  tinha aproximadamente 60 anos e era solteiro.  De aspecto desleixado e um tanto sujo, encontrou a família na mesa do café da manhã.

De imediato ele notou as duas jovens.

Orlando retirou-se da mesa para falar com ele.

- Duas semanas, é o prazo máximo.

- Mas eu não tenho onde ir buscar dinheiro.  Até esta casa hipotequei.

- Não me interessa.  Duas semanas para a primeira promissória.  Se não for paga eu apresento a dívida toda ao tribunal.  Quer ir preso?

Álvaro foi embora e Orlando fechou-se no escritório para beber.

Nos dias seguintes ele bebeu tudo o que pode.

Juliette foi conversar com ele para entender o quão má era a situação.

Era pior do que poderia imaginar e mesmo que ela estivesse disposta a ajudar, as suas economias não pagavam uma promissória sequer.

- Eu vou morrer na prisão,  eu sei que vou, filha!

Quinze dias depois Álvaro regressou e trazia outra solução.  Fechados no escritório Orlando ouvia a proposta mais absurda.

- As promissórias todas em troca de uma das tuas filhas.  Qualquer uma. Troca por troca.

- Mas que descaramento!

- Porquê?  Na hora de assinarem não tiveste esses pudores?

- Nada a ver.  É a vida das minhas filhas.

- Então paga.  Hoje vence uma.  Se sair daqui sem solução vou directamente à policia.

Orlando caminhava de um lado para o outro dando um trago no copo de whisky.

- Dá-me mais uma semana.   Prometo ter uma resposta.

- Uma semana, nem mais um dia.

Meu lírio roxoOnde histórias criam vida. Descubra agora