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Carolina

— Tem certeza de que não vai ficar chateada comigo por estar de namorico com o amigo
do Barão?
— É claro que não, Tamiris. — Revirei os olhos, atenta para organizar a cesta com os
dedos. — Você pode namorar com quem quiser, inclusive com o amigo do homem que veio
disposto a comprar as terras do meu pai. — Dei de ombros.
— Por que não me disse que eles eram amigos?
Deixei a cesta de lado e ergui o olhar para Tamiris, que estava com os braços cruzados e
um bico nos lábios. Movimentei os ombros a fim de diminuir a tensão. Estava cansada por não
ter dormido muito bem a última noite, e precisei acordar cedo para fazer mais uma remessa de
docinhos, que iria vender na festa da padroeira.
Meu pai ainda ajudou, mesmo depois de me ouvir falar sem parar que estava tudo bem e
que conseguiria dar conta sozinha. Seu Antonio conseguia ser extremamente teimoso e cabeça-
dura quando queria ser. Dona Lurdes às vezes ajudava na confecção, mas essa manhã em
especial teve um contratempo e chegou tarde. E eu não podia explorá-la demais, já que a pagava
apenas para cuidar da nossa casa.
— Queria que você descobrisse sozinha e pelo visto o riquinho foi mais rápido que fogo de
palha — comentei.
— Pensou que eu poderia não querer nada com ele por causa do negócio da compra das
terras?
— Exatamente, Tami. Eu não queria que você se privasse de viver uma experiência
amorosa por causa de algo que só cabe a mim e ao meu pai resolver. — Suspirei fundo.— Além de primas, somos amigas. E é claro que eu faria isso. — Balançou a cabeça para
os lados. — No começo, é claro, porque agora acho que já é meio tarde para cortar o mal pela
raiz. Eu meio que estou…
Fiz careta.
— Apaixonadinha — completei.
— Sim, muito! — Soltou uma lufada de ar. — Mas basta eu saber alguma coisinha para
acabar com a raça dele. Espero que Augusto ande na linha ou irei jogá-lo em uma pocilga. Acima
de tudo… somos uma família, sim?
— Até o fim dos tempos.
— E uma família cuida da outra. Posso estar apaixonada, mas não cega a ponto de ignorar
este assunto de querer comprar as terras do seu pai.
— Isso é coisa mais de Sebastian do que do próprio Augusto. É evidente que ele não passa
de um cachorrinho atrás do dono.
— Não fale assim do meu bebê…
— Ai, não! — Franzi o cenho. — Acho que não estou pronta para lidar com essa sua
versão apaixonada.
— E eu não sei como vou lidar quando chegar a sua vez.
— Nunca, não é mesmo? Não há ninguém aqui nesta cidade que chame a minha atenção — menti.
Sebastian chamava, e muito.
Ele era um dos raros homens que despertara a minha atenção e me fez sentir borboletas no
estômago, como se fosse a droga de um ímã. É claro que isso não tinha nada a ver com paixão ou
algo do tipo. Deus me livre! Era só sobre atração física, e nada mais. Eu podia ser uma garota
sem muitas experiências sexuais, quase nulas para ser sincera, pois nunca avancei o sinal com
ninguém, mas…
Nem mesmo era uma beijoqueira.
Eu estava mais para uma santa.
Quem podia me culpar?
Desde que tive idade suficiente para entender as coisas, comecei a trabalhar para ajudar
meu pai, que ficou viúvo cedo, com uma garotinha para criar. Eu o ajudava nas atividades
domésticas e na hora de prover uma renda financeira para que nada faltasse à nossa mesa. Por
isso, não tive tempo para arrumar um namoradinho. Opções sempre havia, pois era uma mulher
bonita, sem sombra de dúvidas, atraente o bastante para ter quem quisesse, mas faltava
disposição da minha parte.Ninguém parecia ser atraente o suficiente.
E tudo bem!
Eu nunca senti falta ou necessidade de dividir a vida com ninguém. Ainda era muito
jovem, para ser sincera, e tinha muitos anos pela frente para mudar essa situação, então não tinha
por que colocar a carroça na frente dos burros.
Sonhava, sim, em ter uma família, um marido para amar e ser amada de volta, que me
respeitasse e pudéssemos somar um na vida do outro, assim como pensava em ter filhos, só que
esse era um sonho que estava na gaveta junto de tantos outros.
Não era o momento.
Não mesmo!
Minha vida se resumia a cuidar do meu pai, trabalhar no nosso pequeno cultivo de café e
vender doces na praça. Comprar minhas coisinhas e pedalar por aí na minha bicicleta, às vezes,
como se não houvesse amanhã. Só isso e nada mais, sem muitas aventuras ousadas. E, por
incrível que pareça, eu me sentia completa e feliz.
Completamente feliz.
— Nem aquele ali, ó — Tamiris sussurrou baixo e não entendi a quem se referia.
— Hum?
— Tenta disfarçar e olha quem veio mais uma noite para a festa da padroeira…
Revirei os olhos e aos poucos fui me virando para ver de quem se tratava.
Sebastian.
Em carne e osso!
Imaginei que fosse qualquer pessoa, exceto o barão. Logo me virei de volta para encarar
minha prima, tentando ignorar a presença do homem que foi o motivo pelo qual não consegui
dormir nada bem. Eu passei a noite toda fantasiando momentos com ele, inclusive beijando
aqueles lábios carnudos e um tanto suculentos.
Era culpa da minha abstinência amorosa.
— Deixe ele, Tami. A praça é pública, assim como o evento da igreja é aberto para todo
mundo. — Engoli em seco. — E outra, tenho mais o que fazer.
— Ainda não respondeu a minha pergunta.
Revirei os olhos.
— Quer ouvir que o acho bonito? Sim. Só que não o suficiente para me deixar suspirando
de amores igual a você, que está caidinha pelo homem que parece não sair do lado do Diabo…
— Bem lembrado… Nós nos vemos mais tarde? Vou dar umas voltas para ver se vendo
alguns docinhos. — Deu um sorrisinho de lado.
— É bom que venda mesmo. — Mordi a ponta do lábio. — Suas vendas caíram, e as
minhas aumentaram bastante. — Pisquei um olho.
— Prometo que vou me esforçar um pouco mais.
— Sei que sim. Nos vemos mais tarde então… — Sorri largo.
Tamiris sempre voltava para casa comigo, mas, desde que começara a se envolver com o
amigo de Sebastian, o tal Augusto, a garota me deixava voltar sozinha. Evidentemente, ficava
para trás trocando beijinhos e Deus sabe lá mais o que com o paquera. Eu não perguntava os
detalhes, pois não era algo que cabia a mim saber. Minha prima era só um ano mais nova que eu,
então sabia o que fazer da vida. Só esperava que essa aventura deles terminasse bem, visto que
tinha prazo para acabar. Era evidente que o barão não pretendia estender sua estada na cidade, e
o mesmo se aplicava ao amigo que o acompanhava.
Tinha começo e fim.
Tamiris que protegesse o seu coração.
— Então… Você sempre morou por aqui?
— Sim — falei, querendo encerrar a conversa com o rapaz que comprara cinco docinhos e
de quebra me mantinha ocupada respondendo a suas perguntas.
Parecia mais uma pesquisa para algum benefício social.
Até que era bonitinho, mas só isso mesmo.
— Tem pai? Mãe?
— Olha, se me der licença… Eu preciso continuar vendendo. — Forcei um sorriso e
mostrei a cesta, que continha outras unidades de doces disponíveis.
— Ah, é. Me desculpe por isso. Podemos marcar qualquer dia desses para tomar um
sorvete? Uma pizza? Estou aqui na cidade, passando as férias na casa da minha vó.
— Podemos, sim. Qual é seu nome mesmo?
— Mateus. — Exibiu um sorriso de orelha a orelha.
— Certo. Nos vemos por aí, Mateus. — Eu me despedi do rapaz com um leve aceno.A missa havia acabado poucos minutos atrás e o movimento na praça aumentou. As
pessoas não perdiam por nada o evento que era organizado todos os anos e reunia público de
todos os lugares, talvez pelas exposições e atrações culturais que tinha de uma ponta a outra,
tanto na parte do dia quanto pela noite. Eu, particularmente, amava fazer parte de tudo isso,
conhecer novos rostos e provar novas iguarias.
Amava mesmo!
Passei por algumas pessoas, cumprimentei com sorrisos e acenos. Lembrei que tinha que
encontrar o padre para entregar um docinho a mando do meu pai, então caminhei em passos
rápidos pela porta lateral, para onde ele estaria, na sacristia. Só que, antes mesmo de entrar, mãos
fortes puxaram-me, corpo indo de encontro à parede.
— Soc…
— Não precisa gritar, ou teremos que lidar com mais plateia, Carolina.
O sorriso de Sebastian iluminou meu campo de visão.
Babaca!
— Tinha que ser você. O que significa isso? Queria me assustar, ou o quê?
— Nenhuma das opções, apenas queria um minuto a sós com você.
Ele logo tirou as mãos, deixando-me livre para dar um passo para trás.
— Tem um minuto. Pode falar e em seguida vou embora.
— Porque nunca é fácil conversar com você, garota? Tem sempre que soltar as garras
afiadas, pronta para me atacar na primeira oportunidade?
Torci os lábios para o lado, formando um bico a contragosto.
— Uhum.
— Não faça isso ou irei cometer uma loucura.
Por que ele tinha que ser tão cheiroso?
Merda!
— Eu não estou fazendo nada, Sebastian. Só quero terminar de vender meus doces e ir para
casa. Então, para sua sorte, estou um pouco limitada para começar uma briga. — Pisquei um
olho, dando de ombros. — Se me der licença, é claro.
— Certo. Quantos doces ainda tem na cesta? — perguntou, encarando-me dos pés à
cabeça.
— Vinte.
— Ok. Eu quero todos.
Arregalei os olhos.
— Vai ficar diabético fácil… Sabe o quanto de açúcar tem em cada docinho?
— Foda-se! Quer vender, ou não?
— É claro que sim, mas é que…
— Ótimo. Então vamos embora.
— Como assim vamos embora? — repeti suas palavras, meio aérea.
— Vou levá-la para casa. Não quero mais que volte altas horas sozinha e de bicicleta, que
é zero seguro.
— E agora vai dar um de quê? Namorado? Marido?
— Pare de teimosia, garota petulante, sabe o quão perigoso é caminhar sozinha por essas
redondezas a esta hora da noite?
— E desde quando isso te interessa, velhote?
— Não me interessa, mas não terei paz se não garantir que você chegou segura em casa —
falou certeiro, seu olhar feroz queimando-me inteira. — Vamos logo!
— Não vou, não!
— E eu não vou sair daqui sem antes levá-la para casa.
— Para um homem que até ontem tinha se perdido no caminho… — Dei um risinho.
— Problema resolvido, garota. Estou com outro carro e um que tem GPS. — Colocou as
mãos nos bolsos da calça. — Então vamos logo, Carolina!
Sebastian estava vestido em um terno azul-marinho, pelo visto não gostava de usar roupas
menos formais e que o fariam parecer só mais um cara comum. Os cabelos sempre bem-
arrumados, barba bem-aparada, e o relógio que não saía do pulso.
— Eu não vou com você, fim de papo. Agora me deixe em paz por favor.
— Você vai comigo. É isso ou…
— Não vou.
— Vai, sim!
— Não vou! — Dessa vez, aumentei o tom da voz. — Acabou?
— É impossível ter uma conversa civilizada com você, Carolina. Mesmo que não a leve
em meu carro, saiba que irei acompanhá-la de longe. É pegar ou largar.
Merda!Eu estava muito ferrada!
O que significava aquilo tudo?
Sebastian queria comprar minhas terras e junto bancar um homem possessivo.

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